Mário Moreno/ março 9, 2018/ Artigos

A Profecia Oculta: O Messias Oculto No Tanach

A última vez, falamos sobre um dos maiores dilemas do Novo Testamento: o Segredo Messiânico —o fato de que Ieshua continuamente desencorajava e evitava o uso do título “Messias” ao longo do tempo de seu ministério público. Antes de prosseguir, preciso garantir que distinguimos entre dois públicos diferentes: o público dos leitores dos Evangelhos e o público de Ieshua dentro dos Evangelhos. Todos os textos do NT foram escritos décadas após Sua morte e ressurreição, e os autores dos Evangelhos, ao se voltarem para seus leitores contemporâneos, repetiram incansavelmente que Ieshua era o Messias prometido: “Estes, porém, foram registrados para que creiais que Ieshua é o Ungido, o Filho de Elohim” Jo 20:31 — mas não é sobre isso que estamos falando aqui—. Não estamos estudando o que os evangelistas nos falam sobre Ieshua; o que nos interessa é o que Ieshua dos Evangelhos diz sobre si mesmo, ou permite/não permite que os outros digam sobre ele para seus próprios contemporâneos. Os Evangelhos retratam consciente e propositalmente Ieshua ocultando e escondendo sua messianidade de Seu público. Em outras palavras, a messianidade de Ieshua é algo que o autor e os leitores conhecem, mas os participantes originais não conheciam.

Estamos agora diante da necessidade de explicar esse fato enigmático: em todos os quatro Evangelhos, nenhuma vez Ieshua se revela como Messias aos Seus compatriotas. Nos quatro Evangelhos, as pessoas Judias que Ele cura são proibidas de contar sobre os milagres feitos para elas. Por quê? Não é lógico concluir que Ele não pretendia revelar o fato de Sua identidade Messiânica para Seu povo? Caso contrário, por que Ele mesmo não falaria disso diretamente, em vez de proibir as pessoas de contar aos outros? Se decidirmos que Ieshua queria que o povo de Israel o aceitasse e o reconhecesse como Messias, devemos admitir que ele estava agindo de forma bastante estranha, fazendo tudo o que pôde para levar Israel a um equívoco e esconder esse segredo deles. Vocês devem concordar que tal conclusão dificilmente é aceitável e, consequentemente, temos apenas uma possibilidade: Ieshua não tinha intenção que o povo de Israel soubesse sobre sua condição messiânica.

Por quê? Por que Ieshua ficou em silêncio sobre Sua messianidade? Para entender isso, voltemos para o Tanach (Antigo Testamento) e tentemos encontrar lá a explicação do segredo messiânico. Nós todos sabemos que o capítulo 53 de Isaías, dedicado inteiramente ao Servo Sofredor, tem sido um obstáculo entre os Cristãos e os Judeus durante séculos: enquanto os últimos afirmam que Isaías está profeticamente descrevendo o sofrimento do povo de Israel, os primeiros o interpretam como uma profecia da morte expiatória de Ieshua o Ungido.

A interpretação deste capítulo no Judaísmo tem sido muito discutida. Embora não tenha sido necessariamente uma linha consistente de interpretação, ao longo dos séculos, muitos rabinos também entenderam Isaías 53 como se referindo ao Messias. Aqui, por exemplo, estão citações de fontes rabínicas: “O Messias —qual é o nome dele?—… Os Rabinos dizem, The Leper Scholar, como se diz: “certamente ele suportou nossas ofensas e levou nossas dores:  ainda assim nós o estimamos um leproso,  ferido de Elohim e aflito…” – Sanhedrin 98b; “Ele foi ferido por nossas transgressões“,etc… Há no Jardim do Éden um palácio chamado Palácio dos Filhos da Doença; neste palácio, o Messias então entra e convoca todas as enfermidades, todas as dores e todos os castigos de Israel; todos eles vêm e descansam sobre ele. E se não fosse isso que ele assim os tivesse atenuado de Israel e os tomasse sobre si mesmo, não havia ninguém capaz de suportar os castigos de Israel pela transgressão da lei; e isso é o que está escrito: “Certamente ele tem levado nossas doenças” – Zohar, Volume II, 212a.

Isaías 53 foi entendido como o programa messiânico nos tempos de Ieshua —no primeiro século D.C.?— Para responder a esta pergunta, voltemos para os Targums (Targums são interpretações Aramaicas livres do Antigo Testamento para uso em sinagogas). Vocês podem lembrar das minhas postagens anteriores que, apesar das datas tardias da redação final desses textos (a redação básica dos primeiros Targums pode ser do final do segundo ou terceiro século D.C. e muitos dos textos disponíveis são datados ainda mais tarde), a tradição interpretativa que representam, pertence ao período do Segundo Templo. O que os Targums nos dizem sobre esse assunto?

Existem vários capítulos do livro de Isaías que falam sobre um Servo Sofredor e, no Targum de Jonathan sobre Isaías, todos esses locais foram entendidos como referentes ao Messias. Aqui estão alguns exemplos:

Isaias 43.10: “Vocês são minhas testemunhas, diz o IHVH, o meu servo a quem escolhi”

Targum de Jonathan sobre Isaías 43:10:  Vocês são testemunhas diante de mim, diz o IHVH, e meu servo, o Messias (עבד משיחא).

Isaías 52:13: Eis que meu servo procederá com prudência

Targum de Jonathan sobre Isaías 52:13: Eis que meu servo, o Messias, prosperará (עבדי משיחא).

Todos sabemos que traduzir significa interpretar. Assim, esses desvios do texto original nos mostram que, mesmo dentro da tradição Judaica nos primeiros séculos da Era Comum, algumas pessoas viram claramente o Messias no Servo Sofredor de Isaías.

No Novo Testamento, temos evidências surpreendentes do livro de Atos: a história de Filipe e do servo do Eterno (Atos 8: 26-35). Quando Filipe pergunta ao servo do Eterno: “Compreendes os que vens lendo?” e o eunuco responde: “Como poderei entender, se alguém não me explicar?” At 8:30,31 —mostra-nos, não apenas a situação pessoal do servo do Eterno, mas a ausência de uma linha consistente de interpretação no Judaísmo da época do Segundo Templo—. Com esta luz, a clareza e a confiança de Filipe são impressionantes. Quando o servo do Eterno pergunta: “de quem o profeta diz isso, de si mesmo ou de algum outro homem?” —para Filipe, a resposta é óbvia: Ieshua—.

“Isso implica que, mesmo neste momento inicial, o reconhecimento de que a descrição da obra em Isaías 53 se encaixava em Ieshua e somente em Ieshua, era corrente entre os judeus messiânicos” (G.K. Beale and D.A. Carson. Commentary on the New Testament Use of the Old Testament (p. 574). Baker Publishing Group. Kindle Edition). Desde então, Isaías 53 foi amplamente compreendido pelos crentes em Ieshua como um programa Messiânico: um programa que o Messias tinha que cumprir —o programa que Ieshua realmente cumpriu a cada passo— . E é neste programa —neste capítulo— que vamos descobrir a “profecia escondida” que foi completamente perdida na tradução e que explica claramente por que Ieshua, se ele tinha que cumprir este programa, tinha que ficar em silêncio sobre Sua condição messiânica.

Tradução: Mário Moreno.