Mário Moreno/ maio 3, 2018/ Artigos

A rocha no deserto

Durante a caminhada do povo de Israel através do deserto muitos milagres aconteceram, mas um deles salta aos nossos olhos: a rocha que dava águas por onde quer que o povo judeu fosse. Mas, como isso veio a acontecer? Vejamos:

Depois de todos estes acontecimentos – o maná e a água que tornou-se doce – os filhos de Israel continuam suas jornadas pelo deserto. Há algo explícito aqui: eles seguiam (ou não) viagem “segundo o mandamento do Eterno”! A viagem teve realmente um ritmo de desenvolvimento de acordo com os desejos do coração do Eterno. Mas mesmo assim, o povo continuava a se manifestar contra Moshe e o Senhor! “Então contendeu o povo com Moshe, e disse: Dá-nos água para beber. E Moshe lhes disse: Por que contendeis comigo? Por que tentais ao IHVH? Tendo pois ali o povo sede de água, o povo murmurou contra Moshe, e disse: Por que nos fizeste subir do Egito, para nos matares de sede, a nós e aos nossos filhos, e ao nosso gado?” (Êx 17:2-3). Novamente duas palavras aparecem aqui durante a caminhada: contender e murmurar! Creio que a maior razão pela qual o povo passou quarenta anos vagando foi o uso e abuso destas atitudes. Eles demonstravam ser bastante carnais. Suas atitudes eram previsíveis e seus clamores centralizavam-se sempre no mesmo aspecto: a satisfação de seus corpos! Essa era uma herança que tinham trazido do Egito. Eles foram ensinados a terem suas paixões satisfeitas assim que o desejassem. Esta é também a razão por que caminharam os quarenta anos: tiveram de reaprender tudo novamente. Agora, não segundo os padrões egípcios, mas sim os padrões de D-us!

Como lidar com essas situações? É necessário mostrar de forma incontestável o poder do Eterno (de novo!). Então vem as seguintes instruções: “Então disse o IHVH a Moshe: Passa diante do povo, e toma contigo alguns dos anciãos de Israel; e toma na tua mão a tua vara, com que feriste o rio, e vai. Eis que eu estarei ali diante de ti sobre a rocha, em Horebe, e tu ferirás a rocha, e dela sairão águas e o povo beberá. E Moshe assim o fez, diante dos olhos dos anciãos de Israel. E chamou aquele lugar Massá e Meribá, por causa da contenda dos filhos de Israel, e porque tentaram ao IHVH, dizendo: Está o IHVH no meio de nós, ou não?” (Êx 17:5-7). A cena se repete: o povo é reunido e Moshe fere a rocha. A palavra “ferir” em hebraico é nakâ, que significa “pancada, ferida. O verbo é usado com o sentido de atingir ou ferir um objeto com um golpe não fatal”. Isso demonstra que a rocha deveria ser ferida a fim de trazer aos israelitas aquilo que precisavam: a água que preserva a vida! Isso foi feito no deserto e depois novamente aconteceu com o Mashiach, que foi ferido a fim de que brotasse dele a água da vida! Paulo nos informa o seguinte: “E beberam todos de uma mesma bebida espiritual, porque bebiam da rocha espiritual que os seguia; e a rocha era o Ungido” (I Co 10:4).

Quando então conectamos duas realidades – o que aconteceu no deserto com as palavras de Sha´ul então certamente entendemos o que aconteceu de fato ali. Vamos falar sobre os milagres que D-us realizou aos nossos pais durante o Êxodo do Egito. Um desses milagres é refletido na Brit Hadasha, pois bebiam da rocha espiritual que os acompanhava, e essa rocha era o Ungido” (I Co 10:4).  É claro que Sha´ul compreende a rocha de um modo espiritual, e não físico; mas por que Sha´ul fala sobre essa rocha itinerante? Ele está falando sobre uma realidade espiritual que está expressa no Midrash dizendo: “O povo de Israel se encontrava agora num lugar no deserto onde não havia fontes de água. E os judeus tinham muita sede.

Os judeus que não eram grandes tsadikim (justos) começaram a protestar: “D’us não está ao nosso lado. Por que não nos dá água?”

D’us havia dito a Moshê: “Agora Vou fazer um milagre. Toma teu cajado. Escolha uma rocha e bata nela com o cajado até que se parta. Um milagre acontecerá e a água brotará da rocha.”

Moshê golpeou a rocha perante os zekeinim (anciãos) do povo. Brotou tal quantidade de água da rocha que puderam beber à vontade. Os judeus chamaram a rocha de “Manancial de Miriam”, pois sabiam que D’us lhes havia dado água no deserto por mérito da irmã de Moshê, Miriam, que era uma grande tsadeket (justa). Desde então, durante toda a travessia do deserto, tiveram água em abundância, pois o Manancial de Miriam os acompanhou onde quer que fossem”.

A interpretação do Midrash

Sha´ul recorre aqui a uma rica tradição interpretativa judaica. Na descrição da Torah sobre a peregrinação de Israel no deserto, encontramos apenas dois episódios descrevendo a provisão milagrosa de água – no início do período de peregrinação no deserto (Êxodo 17) e no final do período de peregrinação (Números 20; 21). Naturalmente, surge a pergunta: como os israelitas conseguiam água no período entre esses episódios – na verdade, durante todos esses anos? Sabe o que aconteceu? O milagre das águas dessedentando os judeus no deserto parece um “faz de conta”, pois – segundo a tradição – uma rocha os seguia e dava a eles toda a água necessária para que ficassem saciados.

Quem era A rocha que deve tê-los acompanhado

A tradição interpretativa foi desenvolvida para explicar essa lacuna e dar uma resposta sobrenatural a essa questão natural. De acordo com essa tradição, a rocha de Números 20 é a mesma rocha que vimos em Êxodo 17, no começo da jornada; portanto, essa rocha deve ter acompanhado os israelitas durante toda a jornada. Segundo a tradição isso aconteceu da seguinte forma:

A geração do deserto recebeu três presentes pelo mérito de seus três grandes líderes:

  • O Poço, pelo mérito de Miriam
  • As Nuvens de Glória, pelo mérito de Aharon
  • A maná, pelo mérito de Moshê.

Por quê os três líderes são associados a esses presentes específicos?

Eles personificavam os três pilares que sustentam o mundo – Torah, serviço Divino e realização de atos de bondade.

  • Moshê deu a Torah e era o mestre e líder do povo judeu por excelência. Por isso, em seu mérito os judeus recebiam a maná, cujo presente diário aliviava a necessidade de se obter um ganha-pão, e cuja ingestão ajudava-os no entendimento do estudo da Torah.
  • Aharon personificava o serviço Divino. Sua devoção ao Serviço dos sacrifícios trouxe a Shechiná ao povo judeu. As Nuvens de Glória eram, assim, dadas em seu mérito, pois representavam a Shechiná que residia com o povo judeu.
  • Miriam era excelsa no terceiro dos três fundamentos: a bondade. Desde sua juventude devotou-se ao bem-estar de seu povo. Mesmo quando criança, ajudava sua mãe como parteira, e levava comida aos pobres.

Mais ainda, foi Miriam que esperou por Moshê às margens do Nilo, e por isso foi recompensada justamente através da água.

Por causa de seu atributo de chessed, bondade, D’us proveu os judeus com água, uma necessidade vital.

Como os judeus recebiam água do Poço de Miriam?

Esta miraculosa rocha da qual brotava água estava sempre presente no deserto com o povo. Quando o povo acampava, essa ficava num local alto, em frente à entrada do Tabernáculo.

Cada um dos doze líderes aproximavam-se do poço com seus cajados e traçaram uma linha ligando o poço à sua tribo. A água fluía através dessas doze linhas para todas as Tribos, formando rios entre uma tribo e outra. Cada rio era tão largo que uma mulher que desejasse visitar uma amiga de tribo diferente precisaria de um barco, senão desejasse molhar os pés.

A água também rodeava a maior parte do Acampamento. Onde quer que os judeus acampassem, grama, árvores, vinhedos, figos e romãs brotavam à sua volta. Os vinhedos produziam uvas de sete sabores diferentes. O povo judeu experimentava o bem e a excelência do Mundo Vindouro na água e nas plantas produzidas pelo Poço de Miriam. Por isso, mais tarde (nesta parashá), cantaram um cântico louvando esse maravilhoso poço.

A Brit Hadasha e a Tradição Judaica

É provável que a concepção de rocha que acompanha os israelitas já tivesse sido estabelecida pelo judaísmo na época de Sha´ul, então as palavras de Sha´ul são baseadas nessa interpretação. No entanto, Sha´ul também desenvolveu e reinterpretou essa tradição de uma maneira singular na Brit Hadasha. Agora quando associamos todos estes escritos podemos entender que aquela Rocha era Ieshua! Então o entendimento é que Ieshua sempre esteve com os judeus durante toda a sua caminhada pelo deserto, e Ele está ali na forma de uma “Rocha” que não permitia que seu povo perecesse.

É algo fantástico quando entendemos quem era esta Rocha! As palavras de Sha´ul nos remetem à libertação do povo de Israel do Egito e a sua caminhada para a terra prometida! Podemos então dizer que o que Sha´ul disse era justamente que nós entendamos que há um cuidado dos céus com o povo do Eterno e que existe uma “rocha” que nos acompanha em nossa caminhada pelo deserto e ali, mesmo que não existam águas, o Eterno fará com que Sua Rocha nos dê de beber e nos faça ser dessedentados até o momento em que pisaremos na terra que Ele mesmo nos prometeu!

Baruch há Shem!

Mário Moreno.