Mário Moreno/ fevereiro 15, 2018/ Artigos

O mês de Adar

Segundo o Sêfer Yetzirá, cada mês do ano judaico tem uma letra do alfabeto hebraico, um signo do Zodíaco, uma das doze tribos de Israel, um sentido e um membro controlador do corpo que correspondem a ele.

Adar é o décimo segundo mês do Calendário Judaico.

A palavra Adar é cognata ao hebraico Adir, que significa “força”. Adar é o mês da boa sorte para o povo judeu. Nossos Sábios dizem a respeito de Adar: “Sua mazal [sorte] é forte.”

Purim, o dia festivo de Adar, comemora a “metamorfose” da aparente má sorte dos judeus (como pensava Haman) para boa. “Quando chega Adar, nós intensificamos em júbilo.” A Festa de Purim assinala o ponto alto na alegria do ano inteiro. O ano judaico começa com o júbilo da redenção de Pêssach e termina com a alegria da redenção de Purim. “O júbilo quebra todas as barreiras”.

O júbilo de Adar é o que faz deste mês o mês “grávido” do ano (i.e., sete dos dezenove anos no ciclo do calendário judaico são “anos embolísmicos” – “grávidos” com um mês de Adar adicional). Quando há dois Adars, Purim é celebrado no segundo Adar, para conectar a redenção de Purim com a redenção de Pêssach. Assim, vemos que o segredo de Adar e Purim é “o fim está cunhado no início”.

Letra: Kuf

A letra kuf significa “macaco” (kof), o símbolo do riso no mês de Adar. Segundo a expressão “como um macaco no rosto do homem”, o kuf também simboliza a fantasia, um costume aceito em Purim. Antes do milagre de Purim, o próprio D’us “ocultava Sua face” de seus filhos Israel (em toda a história de Purim, como está relatada no Livro de Ester, Seu nome não aparece uma vez sequer). Ao esconder inicialmente a própria identidade, fingindo ser outra pessoa, a essência interior do verdadeiro “eu” da pessoa torna-se revelado. Em Purim, atingimos o nível da “cabeça desconhecida” (“a cabeça que não se conhece nem é conhecida dos outros”), o estado de total ocultação existencial do ser pelo ser, pelo mérito de “dar à luz” um supremo novo ser.

A palavra kuf também significa “buraco da agulha”. Nossos Sábios ensinam que nem mesmo no sonho mais irracional pode-se ver um elefante passando pelo buraco de uma agulha. Mesmo assim, em Purim vive-se esta grande maravilha que, na Cabalá e Chassidut, simboliza a verdadeira essência infinita da luz transcendente de D’us entrando no contexto finito da realidade física e revelando-se por completo à alma judaica.

Mazal: Dagim (Peixes)

Peixes são criaturas do “mundo oculto” (o mar). Assim também são as almas de Israel, “peixes” que nadam nas águas da Torá. A verdadeira identidade e sorte de Israel é invisível neste mundo. A revelação de Purim, a revelação da verdadeira identidade de Israel, reflete a revelação do Mundo Vindouro (o milagre de Purim é entendido para refletir neste mundo o supremo milagre: a ressurreição no Mundo Vindouro).

A palavra “dag” (singular de “dagim”) é interpretada para representar o “tikun” (retificação) de da’ag – “preocupar-se”. Na Torá, a palavra para peixe – dag – na verdade aparece escrita uma vez como da’ag: na época de Nechemiá, alguns judeus não observantes profanaram a santidade do Shabat vendendo peixe no mercado de Jerusalém. Seu “peixe” tinha se transformado em excessiva “preocupação” pelo ganho do próprio sustento. Na direção oposta, o peixe do júbilo de Purim, a forte (embora inicialmente oculta, como peixe) mazal de Adar, converte toda a preocupação na alma do homem na suprema alegria da redenção com o novo nascimento do ser, da “cabeça desconhecida”.

Tribo: Naftali

Na Cabalá, o nome Naftali é lido como duas palavras: nofet li, “doçura é para mim”. A mitsvá em Purim, de atingir o nível da “cabeça desconhecida” ao beber vinho, etc., é expresso, nas palavras de Nossos Sábios, como: “A pessoa em Purim é obrigada a tornar-se doce, até que seja incapaz de diferenciar entre ‘maldito seja Haman’ e ‘abençoado seja Mordechai'”.

Esta é a expressão de júbilo e riso ao nível de Naftali – nofet li. Nosso Patriarca Yaacov abençoou seu filho Naftali: “Naftali é um cervo enviado [mensageiro], que dá [expressa] palavras eloqüentes.” As “palavras eloqüentes” de Naftali provocam júbilo e riso aos ouvidos de todos que escutam. Ao final da Torá, Moshê abençoou Naftali: “A vontade de Naftali está satisfeita…” Na Chassidut é explicado que “vontade satisfeita” (seva ratzon) refere-se ao nível da vontade na dimensão interior de keter, onde toda experiência é puro deleite, o estado de ser no qual a pessoa não deseja nada além de si mesma.

As três letras que compõem o nome Haman possui seis permutações. Haman = 95; 6 x 95 = 570 = rasha (perverso), razão pela qual Haman é chamado “Haman, o perverso”. 570 (também) Naftali, que leva alegria e risos ao jogar o jogo de seis permutações de Haman. Na Cabalá, está explicado que a “eloqüência” de Naftali reflete sua sabedoria para permutar palavras em geral (bem como examinar gematriot, tais como arur Haman [“maldito seja Haman”] = 502 = baruch Mordechai [“bendito seja Mordechai”], o “jogo mais prazeroso” (sha’ashu’a) do estudo de Torá.

Como foi explicado previamente, os meses de Tishrei e Cheshvan correspondem (segundo o Arizal) às duas tribos de Ephraim e Menashe, os dois filhos de Yossef. Yaacov abençoou seus dois netos Ephraim e Menashe para serem como peixes: “E eles serão como peixes no meio da terra.” Estas duas tribos (o início do ano a partir de Tishrei) refletem-se em Adar e Naftali (o final do ano a partir de Nissan), pois Adar divide-se em dois (assim como Yossef se divide em dois) peixes (Ephraim e Menashe). O apoio numérico para isso é que quando Ephraim (331) e Menashe (395) se combinam com Naftali (570): 331 mais 395 mais 570 = 1296 = 36 ao quadrado = 6 para o quarto poder.

Sentido: Riso (Tzchoc)

O riso é a expressão da alegria desenfreada, que resulta de testemunhar a luz saindo da escuridão – “a vantagem da luz sobre as trevas” – como é o caso do milagre de Purim. O epítome do riso na Torá é o caso de Sara no nascimento de Yitschac (cujo nome deriva da palavra tzchok): “D’us fez-me rir, quem quer que me escute rirá comigo.” Dar à luz aos 90 anos (e Avraham aos 100), após ser estéril e fisicamente incapaz de ter filhos, é testemunhar a Divina Luz e o milagre emergindo da total escuridão.

A palavra em hebraico para “estéril” é composta das mesmas letras (na mesma ordem) que a palavra para “trevas”. Purim vem da palavra pru, “crescei e multiplicai-vos”. Sobre Yitschac, a personificação do riso na Torá, diz-se que “o temor [fonte de reverência, i.e., D’us] de Yitschac.” Esta expressão também pode ser lida como “o temor rirá” – a essência do medo se metamorfoseará na essência do riso. Quanto a Purim, o temor de (o decreto de) Haman se transforma no riso exuberante da Festa de Purim.

Controlador: O Baço

Nossos Sábios declaram explicitamente que “o baço ri”. À primeira vista, isso parece paradoxal, pois o baço é considerado o local do “humor negro”, a fonte de todos os estados de depressão e desespero. Assim como descrevemos acima, todos os fenômenos de Adar e Purim são essencialmente paradoxais, pois todos eles derivam da “cabeça desconhecida”, e todos eles representam estados de transformação existencial e metamorfose. A “metodologia” na Torá que “modela” estes fenômenos é a sabedoria da permutação, como foi descrito acima. No que diz respeito ao “humor negro” – “mará shechorá” – suas próprias letras permutam-se para grafar “hirhur sameach” – “um pensamento feliz!”