Mário Moreno/ fevereiro 20, 2018/ Artigos

Por que comer casher?

Nosso raciocínio mudou até o ponto em que não mais sabemos por que o Judaísmo coloca tanta ênfase em comer e beber, necessidades básicas compartilhadas não apenas pelo restante da humanidade como também pelos animais.

Sem uma explicação satisfatória para a cashrut e sem a fé simples baseada nos valores da Torah que caracterizaram as gerações anteriores, muitos judeus concluem que manter-se casher está simplesmente obsoleto – está baseado em antigas precauções sanitárias que não mais se aplicam à vida moderna.

Vamos entender o que significa “cashrut” e “casher”:

Cashrut ou kashrut (em hebraico: כַּשְרוּת), também conhecido como kashruth ou kashrus na tradição asquenazita, é o termo que se refere às leis alimentares do judaísmo. A comida, de acordo com a halachá (lei judaica), é chamada de kasher (kosher em Yidishe), do termo hebraico כשר (kashér), que significa “próprio” (neste caso, próprio para consumo pelos judeus, de acordo com a lei bíblica). Os judeus que seguem a kashrut não podem consumir comida não kasher, porém existem exceções quanto à utilização não alimentícia de produtos não kasher, como, por exemplo, numa injeção de insulina de origem porcina ministrada a um diabético.

A comida que não estiver de acordo com a lei judaica é chamada de treif ou treyf (em iídiche: טרייף, do hebraico |טְרֵפָה, transl. trēfáh). Num sentido mais técnico, treif significa “proibido”, “dilacerado” e se refere à carne que veio de qualquer animal que contenha algum defeito que o torne impróprio para o abatimento. Um animal que tenha morrido por qualquer meio que não o sacrifício ritual é chamado de neveila, que significa literalmente “coisa suja”.

Portanto, oferecemos alguns dos pontos de vista sobre a mitsvá da cashrut fornecidos pela tradição judaica. Estas introvisões satisfazem nossa necessidade de compreensão e nos motivam a cumprir as mitsvot da Torah face aos valores opostos da cultura contemporânea. Apesar disso, deve-se entender que os mandamentos são de origem Divina e jamais poderão ser totalmente compreendidos pelo intelecto humano. Mantemos as mitsvot porque são um legado de D’us ao povo judeu.

“Religião,” como todos sabem, trata de prece, meditação, caridade, ética e às vezes, formas variadas de auto-negação. O Judaísmo, entretanto, envolve todos os aspectos da vida. Nossas atividades cotidianas mais comuns tornam-se imbuídas de santidade quando seguimos a diretiva da Torah: “Conheça-O em todos teus caminhos” (Mishlê 3:6).

A Cashrut representa o encontro do corpo e da alma. A Torah nos diz para não rejeitarmos o físico, e sim santificá-lo. Comida casher é a dieta da nutrição espiritual para a neshamá, a alma judaica. Isso é designado para trazer refinamento e purificação ao povo judeu. Então, quanto mais obedecemos a Palavra do Eterno mais fortes nos tornamos física, moral e espiritualmente! Tudo isso está interligado dentro do receptáculo que é o corpo e este deve ser tratado de tal forma que possa ser um instrumento dos céus para ensinar os preceitos do Eterno na terra através de seu exemplo e de sua obediência!

O que isso significa?

A moderna ciência nutricional reconhece que o Judaísmo sempre ensinou que de forma geral somos aquilo que comemos. Sabemos que os alimentos que ingerimos são absorvidos por nossa carne e sangue. Alimentos proibidos são mencionados na Torah como abominações à alma Divina, elementos que aviltam nossa sensibilidade espiritual. Abutres e animais carnívoros, tendo o poder de influenciar quem deles se alimenta com atributos agressivos, estão entre os alimentos proibidos.

Para um judeu, toda comida não-casher diminui a sensibilidade espiritual, reduzindo a habilidade de absorver conceitos da Torah e mitsvot. Tanto a mente quanto o coração são afetados.

É fácil entender por que a cashrut é frequentemente considerada a mitsvá de mais longo alcance. A história demonstra que quando a observância de cashrut é forte, a identidade judaica permanece forte.

Para explicar o poder dos alimentos casher, devemo-nos voltar aos ensinamentos chassídicos baseados no misticismo do grande cabalista Ari Zal (Rabi Yitschac Luria). O Ari Zal deu uma interpretação literal ao versículo “O homem não vive somente de pão, mas da palavra de D’us” (Devarim 8;3). Ele explicou que não é o alimento em si que dá a vida, mas sim a centelha de Divindade – a “palavra de D’us” – que está presente no alimento. Toda matéria tem dentro de si algum aspecto das “Centelhas de Divindade” que dão vida e existência ao mundo. Quando comemos, o sistema digestivo extrai os nutrientes, enquanto a neshamá extrai a centelha de Divindade encontrada na natureza.

A energia Divina no alimento é, portanto, a verdadeira fonte de sua capacidade de sustentar e nutrir o corpo. Comida casher tem uma poderosa energia que dá força espiritual, intelectual e emocional à neshamá judaica, ao passo que alimentos não-casher fazem o oposto.

A dieta casher é uma dieta saudável para a alma, contendo a nutrição espiritual necessária para a sobrevivência judaica e para estabelecer o verdadeiro equilíbrio entre o corpo e a alma. Uma dieta prescrita pelo Dr. do Mundo.

Na outorga da Torah, D’us nos deu 613 preceitos, entre os quais as leis concernentes à Cashrut. Cada uma das mitsvot, por fazer bem à alma, faz bem ao corpo.

Cada vez que alguém se alimenta, a comida é absorvida pelo corpo e transformada em energia. Quando uma pessoa utiliza a energia produzida por este alimento para cumprir um preceito, ela eleva este alimento para o campo espiritual.

Sabemos que os alimentos têm um amplo efeito sobre nós. Ao tornar-se parte da carne e sangue do corpo, que é ligado à alma, o alimento que a pessoa ingere tem efeito direto sobre seu caráter, seu refinamento pessoal e seu desenvolvimento em todos os estágios da vida. A Torah, através da cashrut, nos ensina como comer para que o corpo seja um receptáculo apropriado para a alma, e não meramente um instrumento para satisfazer as necessidades físicas, como os animais. Nós comemos não como os animai, simplesmente para satisfazermos nossas necessidades; comemos para nutrir nossa alma através da obediência da “dieta” prescrita pelo Eterno para que tenhamos uma vida saudável em todos os sentidos, principalmente o espiritual.

Na Torah, cuidar da saúde e cuidar da Cashrut são mitsvot distintas. Quando a Torah nos diz se o alimento é permitido ou não, está nos informando a respeito de sua faceta espiritual e sobre nossa capacidade de aproveitá-lo positivamente. Assim como no aspecto material, o nosso organismo físico não está preparado para digerir e retirar os nutrientes de qualquer tipo de substância, também no campo espiritual, a alma pode e deve utilizar a matéria, revelando a espiritualidade que está por trás dela. Então, podemos afirmar que cada alimento consumido tem um aspecto espiritual que deve ser considerado como “útil” ou não para ambos: alma e o corpo físico.

Cada vez que alguém se alimenta, a comida é absorvida pelo corpo e transformada em energia. Assim quando a pessoa utiliza a energia produzida por este alimento para cumprir uma Mitsvá, ela eleva este alimento.

O conceito de Cashrut está ligado ao conceito de saúde da alma. Segundo o rei Salomão (Provérbios 20:27), “a alma humana é a vela Divina”. Para que cada um possa revelar a chama Divina que está em nossos corpos é preciso cuidar para que não se impurifiquem com comidas não permitidas pelo Criador.

A cashrut foi instituída por D’us por razões que só Ele conhece. As leis da cashrut, com certeza, ajudam à saúde física da pessoa, mas não é este seu principal objetivo. Elas ajudam a tornar possível a ligação entre alma e corpo, alma e D’us. D’us é o Engenheiro do mundo que ligou os fios certos para que saiam da fonte de energia até a lâmpada, iluminando nossas vidas com mais vida.

Qual é então o maior motivo para comer de acordo com a Palavra do Eterno? Amor! Quem ama declara isso ao ser amado e uma forma de fazê-lo é obedecendo-o em tudo aquilo que Ele determinou para nós a fim de que possamos, também através da comida, nos aproximarmos cada vez mais d´Ele adquirindo santidade advinda da obediência.

Adaptação: Mário Moreno.