Mário Moreno/ dezembro 5, 2017/ Artigos

Tetragrama e o tempo

Um dos momentos mais importantes na história do Judaísmo ocorreu no encontro entre Moshe e o Eterno na sarça ardente. Moshe pergunta ao Eterno qual nome deveria usar quando as pessoas lhe perguntassem quem Ele é. O Eterno responde enigmaticamente, numa expressão que não ocorre em nenhum outro lugar no Tanach: Ehyeh asher Ehyeh. O verso diz assim: “E disse Elohim a Moshe: Eu serei o que serei. Disse mais: Assim dirás aos filhos de Israel: eu serei me enviou a vós” Ex 3.14.

Traduções não judaicas dizem que isso significa “Eu sou aquele (ou quem, ou aquilo) que sou.” Alguns traduzem como “Eu sou: é isso quem Eu sou”, ou “Eu sou Aquele que é”.

Estas são traduções equivocadas profundamente significativas. A expressão significa, literalmente, “Eu serei aquilo que Eu serei,” ou mais fundamentalmente, o nome do Eterno pertence ao tempo futuro. Seu chamado é para aquilo que ainda não é. Se não entendermos isto, perderemos o próprio ponto que torna o Judaísmo único.

O nome Hashem – IHVH – representa o Eterno como a fonte derradeira de toda a existência, muito acima do universo e de suas leis.

Interpretamos o Seu Nome como indicando que o Eterno “foi, é e será”. Ele fala Dele como existindo completamente além do campo de ação do espaço e do tempo. Passado e futuro são exatamente o mesmo que o presente para o Eterno e, de fato, Ele vê toda a extensão do tempo com uma simples olhada. Assim, quando fazemos uso do nome IHVH, na realidade estamos dizendo que o Eterno “foi, é e será”, tudo junto. Passado e futuro são exatamente o mesmo presente para Ele.

Este nome também está associado ao “recomeço”, pois a guematria do tetragrama dá 26 (10+5+6+5 = IHVH em letras hebraicas), que reduzido chega ao resultado de 8 e este número está ligado ao recomeço nas Escrituras.

O nome IHVH também está associado ao atributo da piedade do Eterno. Isto, no entanto, está intimamente relacionado ao conceito de Sua existência fora do tempo.

Quando o Eterno se apresenta a Moshe Ele está na realidade dizendo ao seu servo que Ele mesmo operará a libertação e a redenção do povo de Israel do Egito. Isso ocorreria para Israel, pois para Ele a libertação e a redenção já haviam ocorrido, pois Ele está além do tempo e já havia visto o que ocorreria não somente aos israelitas como também a Faraó e aos egípcios!

O Eterno agiria com piedade e misericórdia até um determinado limite. No verso citado acima temos a combinação de dois nomes: Elohim e IHVH. O nome Elohim está ligado a aplicação da justiça em seu relacionamento com o homem; já o IHVH se relaciona com a piedade que Ele terá com este mesmo ser humano.

Então podemos concluir que há uma atitude de aplicação da justiça para com alguns, enquanto que a piedade – misericórdia – será dispensada a outros. Isso ficou claro na aplicação das dez pragas, onde o Eterno puniu severamente aos egípcios porém teve profunda misericórdia de Israel!

Os três tempos

Quando nos referimos ao tempo, do que estamos falando?

A Enciclopédia define assim o tempo: “Tempo, é aquilo que não existe ou seja o espaço que medeia entre o inicio e o fim de uma ação. O tempo é a única invariável fixa das existências e uma das mais importantes invariáveis da economia e da justiça, porque sem tempo útil perde-se o bem em causa. O tempo é por assim dizer a plataforma onde as coisas de desenrolam” (https://pt.wikipedia.org/wiki/Tempo).

As Escrituras trazem basicamente três palavras que definem o “tempo”. Vamos a elas:

(´et) “tempo, período de tempo, tempo determinado, tempo devido”.

Descreve:

– Períodos de tempo

– Acontecimentos usuais

– Tempo apropriado de acontecimentos que não se repetem

– Momento ou período fixo determinado

Esta palavra tem uma injunção muito peculiar, pois quando acrescentamos a letra “Dalet” cujo significado é “porta” à palavra “´et” temos a palavra “da´at” que significa “conhecimento”. Então podemos inferir que há uma porta para conhecermos o “tempo determinado” de todas as coisas!

(´et) + (dalet) = (da´at)

“Quem guardar o mandamento não conhecerá palavra má; e o tempo e a justiça conhecerão o coração sábio” Ec 8:5.

(mô´ed) “sinal combinado, tempo determinado, estação determinada, local de assembleia, festa designada”.

Descreve:

– Tempos festivos

– Ciclos

– Tempos “combinados”

“Estas são as solenidades do IHVH, as santas convocações, que convocareis no seu tempo determinado” Lv 23.4.

(z´man) “prazo, tempo determinado”.

Descreve:

Na raiz temos o termo “zamar” que significa “cantar, cantar música, fazer música”.

“E todo tempo determinado tem o seu tempo, para todo o prazer debaixo dos céus” Ec 3.1.

As três definições são muito intensas e tem algo em comum: os “tempo” citados tem algo a ver com “determinar” pois em última instância apontam para um “marco” na história do homem que é “medido” pela passagem do tempo! Devemos relembrar que o Eterno não está sujeito a este “tempo”, mas Ele de fato se “encaixa” em nosso contexto de tempo, nos proporcionando uma visitação completa nas três áreas da existência humana: espírito, alma e corpo.

O tempo do espírito

Verificamos que (´et) está ligado ao Espírito, pois é o “tempo” que envolve consigo o conhecimento e conhecimento envolve relacionamento! Este conhecimento precisa passar pelo intelecto para então atingir o espírito humano e o único conhecimento que é capaz de produzir a união entre o Eterno e o ser humano está contido nas Escrituras. Ieshua declara isso e usa inclusive a mesma palavra citada aqui – da´at – dizendo: “e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” Jo 8.32.

A verdade só pode ser “conhecida” quando se tem a informação do que ela é e finalmente temos um relacionamento com esta verdade! A informação gera a relação que traz consigo a libertação!

O espírito do homem é liberto dentro do contexto do “tempo” determinado quando este mesmo homem busca um “conhecimento” com a verdade. A fonte em que esta “verdade” é recebida faz toda a diferença, pois quando buscamos na fonte errada os resultados não trazem a libertação e sim a morte.

O tempo está ligado às oportunidades que de certa forma não voltam mais pois estão inseridas neste contexto: aquele tempo. Isso nos mostra que o Eterno nos dá diversas oportunidades para caminharmos dentro da verdade no contexto do tempo; aproveitar tais oportunidades já é uma tarefa do homem! Então podemos inferir que há uma porta para conhecermos o “tempo determinado” de todas as coisas!

O tempo da alma

O (mô´ed) é um tempo que está ligado definitivamente às Festas Bíblicas e isso aponta para algo fascinante: os anseios e desejos do homem são “realizados” no contexto das Festas que tem a finalidade de “lembrar” o homem dos feitos do Eterno no passado e reafirmar que a cada geração o D-us que realizou aqueles grandes milagres para o povo de Israel é capaz de fazer o mesmo em nossos dias.

A alma está ligada aos sentimentos e emoções e isso está ligado à cada Festa Bíblica que tem a finalidade de produzir na alma do homem as mais diferentes emoções em diferentes épocas. Tomemos como exemplo a Festa de Purim que nos fala sobre a libertação do povo do Eterno enquanto ainda estavam no cativeiro. A alegria é intensa nesta Festa e por vezes leva as pessoas a cometerem certos exageros. Esta Festa contrasta totalmente com Iom Kipur, que é um dia de contrição, arrependimento, choro, perdão. Elas são as Festas Bíblicas porém cada uma produzindo em sua época – tempo determinado – uma gama diferente de emoções nas pessoas que delas participam.

Este “tempo” está associado ainda com um local determinado, o que nos mostra que houve um “agendamento prévio” entre o Eterno e seu povo para que pudessem encontrar-se e isso viesse a produzir um efeito duradouro na vida das pessoas. As Festas agem então no contexto do tempo com a finalidade de trazerem benefícios à alma daqueles que obedecem celebrando-as em suas respectivas datas – novamente temos aqui o “tempo” certo em que as coisas ocorrem.

O tempo do corpo

O tempo do corpo é (z´man) e ele está ligado a atividades que envolvem o corpo como a música. O verso que está ligado a esta palavra pode nos esclarecer: “E todo tempo determinado tem o seu tempo, para todo o prazer debaixo dos céus” Ec 3.1.

O prazer via de regra é um “apelo” do corpo, que quando tem uma de suas necessidades necessitando de satisfação apela para que isso ocorra gerando então o “prazer”.

Este tempo está ligado ao corpo e a música pois uma das coisas que a música produz é o desejo de expressar-se através de danças. A dança é uma atividade muito comum entre os judeus e traz consigo esta carga de “satisfação” que vem através dela. A música traz ainda uma conexão com o Eterno e consequentemente nos cura.

A cura física é um dos benefícios que obtemos através do louvor ao Eterno. O chavão que diz: “O louvor liberta” deveria trazer consigo também outro que é “O louvor cura!”

Entendemos que “louvor” é um conjunto de coisas e não somente o ato de cantar; é uma postura de vida que faz com que o nome do Eterno seja exaltado por onde quer que estejamos! Isso faz com que os céus se movimentem em nossa direção e uma das coisas que ocorrem em consequência disso é que somos curados das enfermidades que muitas vezes nos atingem.

Percebemos então que o uso do Nome do Eterno – IHVH – que está ligado ao tempo e a piedade faz com que tenhamos como resultante uma vivência com muito mais qualidade em todos os sentidos. O conhecimento das Escrituras me apresenta o Eterno em suas facetas e me faz ter temor a esta Pessoa que tanto tem feito por nós além de me capacitar a viver uma vida que possa superar todos os obstáculos que se apresentarão graças ao conhecimento e ao relacionamento que passo a ter com o Eterno por conhecer quem Ele é e o que Ele já fez por mim no contexto do tempo.

Lembrando que o futuro não existe para o Eterno; Ele já viu a consumação de todas as coisas e portanto já Sabe o que ocorrerá com quem está vivo ou que ainda nascerá no planeta terra. É por isso que Ele pode então dar oportunidades a cada ser humano para se arrepender de seus pecados e também para receber a salvação através de Ieshua! A esta conduta chamamos de “justiça”, pois no dia em que a humanidade for julgada ninguém poderá dizer: “Eu não tive uma chance e por isso me perdi!”

O arrependimento também está profundamente ligado ao nome do Eterno – IHVH – pois como Ele é passado, presente e futuro pode perdoar o homem através do sangue de Ieshua indo ao passado do homem – no momento em que pecou – trazendo este “momento” do pecado até o presente para perdoá-lo a fim de garantir que seu futuro seja melhor. O perdão desconecta o homem das trevas e o reconecta com a Luz da eternidade que é Ieshua (or há olam).

É justamente por isso que o perdão tem esta dimensão tão imensa e ainda maior quando consideramos as palavras de Ieshua: “E perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores” Mt 6.12. Esta dimensão que nos foi ensinada por Ieshua vincula o nosso perdão pelo Eterno às pessoas que devemos perdoar. Ou seja, se eu não perdoar aqueles que me fizeram mal, não poderei alcançar perdão por parte dos céus e estarei condenado eternamente!

O nome – IHVH – por esta e por outras coisas é de uma importância extraordinária pois nos mostra a importância de nossas atitudes mas nos mostra principalmente a importância de conhecermos quem é o nosso D-us!

Somente sabendo quem Ele é poderemos entender o papel exercido por Ele em nossas vidas e na nossa redenção final!

Que o Eterno se torne para cada um de nós aquilo que necessitamos no tempo determinado por sua sabedoria!

Baruch há Shem!

Mário Moreno.