Mário Moreno/ abril 24, 2018/ Shavuot

Uma visão mais profunda sobre a entrega da Torah

O versículo imediatamente seguinte ao relato da entrega dos Dez Mandamentos ao Povo de Israel por D’us no Monte Sinai, que resume a experiência daquele que foi o maior de todos os dias, diz: “E todo o povo viu as vozes e as tochas e o toque do shofar e a montanha fumegante…” (Shemot 20:15).

Se lemos bem as palavras que estão escritas, percebemos que o texto nos fala sobre “ver as vozes”, o que parece improvável, pois uma voz não é vista, mas sim ouvida. A lógica é essa. Neste caso, porém, a lógica foi contrariada e as vozes foram vistas pelo povo, como que numa imensa tela em três dimensões, as letras e palavras em hebraico iam aparecendo, à medida que eram ditas pelo Eterno!

Esta foi sem dúvida uma experiência única na vida do povo de Israel, algo que nunca mais se repetiu na história de nosso povo. Veja a explicação para o acontecido:

Na Cabalá nos é ensinado que os quatro níveis de experiência do povo:

  1. ver as vozes
  2. as tochas
  3. o toque do shofar
  4. a montanha fumegante

Estas quatro manifestações correspondem à experiência completa dos quatro componentes/letras do Nome de D’us:

Chochmá sabedoria vozes yud
Biná compreensão tochas hei
midot emoções Toque do shofar vav
malchut expressão montanha fumegante hei

O verbo inicial do versículo, “e todo o povo viu” (literalmente, “visão”, no tempo presente), se refere, no geral, aos quatro níveis do versículo, mas, em particular, refere-se ao primeiro dos quatro: “vendo as vozes” (e se refere às palavras faladas por D’us, como comentado por Rashi).

Nossos Sábios interpretam isto dizendo que quando a Torah foi dada a Israel, a experiência da Divindade da absoluta Unicidade de D’us foi tão intensa que ela unificou e sintetizou os sentidos humanos da visão e da audição: “vendo o que era para ser ouvido e ouvindo o que era para ser visto”. Isto reflete o nível da sabedoria Divina na alma – chochmá, o yud do nome de D’us, que é o único poder da alma que percebe diretamente a unidade Divina.

“As tochas” representam a chama interna da alma, seu desejo de retornar e ser absorvido pela Luz Infinita de D’us. Esta é a experiência da profundidade de entendimento e meditação, biná, o hei maior do Nome de D’us.

A Chassidut nos ensina que o toque do shofar representa o poder Divino de “trazer para baixo” e gravar as palavras de D’us no coração do homem. O toque do shofar faz o coração primeiro tremer de temor, e, depois, desejar com toda a força de suas emoções, viver pela palavra de D’us e andar em Seu caminho. A raiz da palavra shofar significa “melhorar” – a fonte da motivação no coração que melhora e progride no cumprimento da Torah. Este nível de experiência Divina corresponde às midot, as emoções do coração, o vav do Nome de D’us.

Os primeiros três níveis da experiência Divina no Sinai são todas revelações vindas de cima. O nível final e completo da experiência é “o despertar de baixo” – a “montanha fumegante”. A palavra “fumegante” (ashein) é explicada na Cabala como sendo um acrônimo para as três dimensões abrangentes da realidade (física): “mundo” (“olam” = espaço), “ano” (“shaná” = tempo) e “alma” (“nefesh” = corpo humano vivo). A montanha simboliza o mais baixo dos elementos físicos da criação, terra, elevando a si mesma em direção aos céus.

Ver a montanha “fumegando” é experimentar a centelha Divina inata em todas as dimensões da realidade física, despertando a si mesmo no desejo de retornar a D’us, o Criador. Isto corresponde a malchut, o hei final do Nome de D’us (referido, na Cabala e na Chassidut, como “a teshuvá [retorno] inferior”, em contraste à “teshuvá elevada” do primeiro hei do Nome de D’us descrita acima).

Quando permanecemos acordados na noite de Shavuot, somos todos capazes, todos e cada um de nós, em seu próprio nível, de experimentar novamente a entrega da Torah no Sinai. O mistério do Nome Inefável de D’us se torna gravado na essência de nossas almas. Em todas as facetas de nossas vidas, nos tornamos capazes de experimentar Sua Unidade Absoluta, o “retorno” de nossa consciência finita de Sua Luz Infinita, a caminhada em (isto é, emulando) Seus caminhos, e a elevação de toda a criação para reconhecer seu Criador.

Com esta consciência purificada, nos tornaremos verdadeiros recipientes, com os olhos abertos, para contemplar a revelação do Mashiach e a verdadeira e completa redenção de toda a realidade.

Que possamos merecer isto, este ano!

Chag Sameach Shavuot!

Adaptação: Mário Moreno.