Anti-semitismo cristão
ANTI-SEMITISMO CRISTÃO
Na perspectiva da história dos últimos 2.000 anos, se pode afirmar com segurança que as organizações e os indivíduos cristãos que exprimiram solidariedade cristã com o povo judeu e que educaram a igreja sobre as raízes judaicas da fé cristã são uma raridade histórica. Deixe-me colocar em perspectiva: se um encontro para ensinar cristãos sobre os judeus, judaísmo, as raízes judaicas do cristianismo, ou para celebrar as Festas Bíblicas tivesse acontecido durante aproximadamente 1.800 anos dos quase 2.000 anos de história da igreja, a coisa mais leve que poderia ter acontecido aos cristãos seria a excomunhão, e em muitos casos a morte. E qualquer membro da comunidade judia participando do programa ou apenas ouvindo seria considerado judaizante e penalizado com morte certa pelas autoridades eclesiásticas. Um artigo deste tipo não seria autorizado, com certeza. Mesmo que a história seja algo complexo e que houveram períodos históricos de liberdade de religião, a observação acima pode ser considerada como uma generalização correta. Felizmente, hoje estamos livres para nos reunir e aprender um do outro.
OS TRÊS PRIMEIROS SÉCULOS DESDE CRISTO
No primeiro século D.C. a igreja estava bem ligada com suas raízes judaicas, e Ieshua não tinha nenhuma outra intenção. No final, Ieshua é judeu e a base de Seus ensinamentos é consistente com as Escrituras Hebraicas. Em Mates 5:17,18 ele diz:
“Não penseis que vim revogar a Torah ou os profetas: não vim para revogar, vim para cumprir. Porque em verdade vos digo: até que os céus e a terra passem, nem um jota ou um til jamais passará da Torah, até que tudo se cumpra”.
Também sabe-se que os escribas do Novo Testamento eram judeus, e os apóstolos e primeiros discípulos eram judeus. Eles adoravam o Shabat, celebravam as festas e iam à sinagoga. Mesmo os membros da iniciante Igreja em Jerusalém e nas vizinhanças da Judéia, Samária e Galiléia, eram predominantemente judeus, pois sabemos que não haviam nomes não-judaicos entre as lideranças da igreja de Jerusalém até depois de 135 D.C., quando um grego aparece. Veremos o por quê disto em um momento.
As congregações em outras partes do Império Romano também tinham raízes judaicas ou hebraicas relativamente profundas, por se alinharem com as diretrizes da Escola de Pensamento de Jerusalém, como ilustrado pelos nomes das várias epístolas do Novo Testamento.. as cartas para os Coríntios, Romanos, Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses e Tessalonicenses. Também os escritores das outras Epístolas estavam ligados à congregação judia.
Mas o que aconteceu para causar tão grande cisma entre as comunidades judias e cristãs? Inicialmente, ele começou como resultado de diferenças religiosas e sociais.
Antes da Primeira Revolta Judaica em 66 D.C., o cristianismo era basicamente uma seita do judaísmo, como o eram os fariseus, os saduceus e os essênios. Os cristãos eram também conhecidos como os nazarenos. Antes da destruição do Templo e de Jerusalém Ter sido arrasada pelos romanos em 70 D.C., havia espaço para debate dentro do judaísmo na crescente cidade cosmopolita de Jerusalém. Entretanto, de acordo com David Rausch em seu novo livro “A Legacy of Hatred” (uma Herança de Ódio), a intrusão romana na Judéia e a larga aceitação do Cristianismo pelos gentios complicavam a história do cristianismo judaico. As guerras romanas contra os judeus não apenas destruíram o Templo e Jerusalém, mas também resultaram em forçar Jerusalém a abandonar sua posição como o centro da fé cristã no mundo romano. Além disso, a rápida aceitação do cristianismo entre os gentios levou a um conflito entre a igreja e a sinagoga. Os gentios cristãos interpretavam a destruição do Templo e de Jerusalém como um sinal que Deus tinha abandonado o judaísmo, e que Ele tinha provido os gentios com liberdade para desenvolver sua própria teologia cristã num contexto livre de influências de Jerusalém.
Os sábios judeus que conseguiram sobreviver a revolta se congregaram em Jabneh (Yavné), uma cidade na Planície de Sharon, perto de Joppa, e decidiram que a Escola de Hillel, mais chegada a seita farisaica do judaísmo, seria adotada e praticada como halachá ou Lei. (Os ensinamentos farisaicos estavam mais interessados no relacionamento entre cada indivíduo e Deus e encorajavam as massas para santidade baseada numa estrita observância da Torah). Mesmo que o judaísmo farisaico tenha demonstrado tolerância com os judeus messiânicos ou nazarenos antes da destruição, a assembleia de Jabneh completou uma separação entre o cristianismo e o judaísmo. Infelizmente, os judeus messiânicos tinham de dissociado da guerra contra os romanos e da tragédia que tinha caído sobre a nação. Acreditando que a sufocação da revolta pelos romanos era um sinal do final, eles fugiram para Pella, a leste do rio Jordão, deixando seus companheiros judeus a se debater sozinhos.
Mais tarde, em 132 D.C. quando Bar Cochba orquestrou a Segunda Revolta Judia contra Roma, os judeus messiânicos tinham outra razão para não participar. Bar Cochba foi nomeado Messias pelo Rabbi Akiva. Como os cristãos viam Ieshua como o Messias, participar da revolta sob o comando de Bar Cochba significaria trair suas crenças. Quando a revolta foi esmagada pelo Imperador Hadriano em 135 D.C… Hadriano expulsou todos os judeus de Jerusalém, permitindo que retornassem apenas um dia por ano, em Tisha Be’av, para o luto pela destruição do Templo. E daí portanto, o registro do primeiro nome grego na liderança da igreja de Jerusalém, como resultado da proibição romana da entrada de judeus na cidade. Hadriano também reconstruiu Jerusalém como uma cidade romana e mudou seu nome para Aelia Capitolina e o nome da Judéia para Síria Palestina. Isto foi feito para apagar qualquer ligação judaica com a cidade de Jerusalém e com a terra de Israel.
Por esta época, a Igreja tinha efetivamente se separado do judaísmo. O poder teológico e político se transferiu dos líderes judeus messiânicos para centros de liderança cristã de gentios como Alexandria, Roma e Antioquia. É importante entender esta mudança, porque ela provocou os primeiros Patriarcas da Igreja a fazer declarações anti-judaicas.
Com a expansão da igreja dentro do Império Romano e com o crescimento das congregações de não-judeus, o pensamento grego e romano começou a entrar e completamente mudar a orientação da interpretação bíblica através da psique grega e não de uma psique judia ou hebraica. Isto depois resultaria em muitas heresias, algumas das quais ainda praticadas pela igreja.
Com o judaísmo e o cristianismo seguindo caminhos distintos, o vácuo foi se tornando maior. Os judeus tinham sido suprimidos com eficiência pelos romanos, e a cristandade estava se espalhando com vigor. Isto preocupava Roma e a pressão política decorrente se tornou o terceiro fator no crescente cisma entre cristãos e judeus. Sob a lei romana, o judaísmo era considerada religião lícita, uma religião legal, pois ela predatava Roma. Para unificar o Império Romano, todos deveriam adorar os deuses romanos e se sacrificar ao Imperador como um deus. Obviamente, os cristãos não podiam se sujeitar à esta adoração pagã e, portanto, se recusaram. Foi durante este período que encontramos cristãos sendo usados para esporte nos coliseus e circos romanos, como gladiadores, ou lançados aos leões. O imperador Nero os usava mesmo como tochas, para iluminar seus jardins de noite, pondo-os em fogo depois de os submergir em alcatrão. O símbolo do peixe, e não a cruz, e cruzar os dedos eram usados pelos cristãos entre eles mesmos, como sinais de identificação durante este período.
Para aliviar esta perseguição, os apologistas cristãos tentavam em vão convencer Roma que o cristianismo era uma extensão do judaísmo. Mas Roma não se convencia. As perseguições e as frustrações resultantes alimentaram uma animosidade para com a comunidade judia, que estava livre para adorar sem perseguições.
Esta animosidade foi refletida nos escritos dos Patriarcas da Igreja. Por exemplo, Eusébio escreveu que as promessas das Escrituras Hebraicas eram para os cristãos e não os judeus, e que as maldições eram para os judeus. Ele dizia que a Igreja era a continuação do Velho Testamento e, portanto, sobrepujava o judaísmo. A jovem igreja se declarou ser o verdadeiro Israel, ou seja, o Israel espiritual, herdeira das divinas promessas, e achava essencial desacreditar a Israel de acordo com a carne para provar que Deus tinha se despojado de Seu povo e transferido Seu amor para os cristãos.
Nisto encontramos os inícios da Teologia da Substituição, que colocava a igreja triunfante sobre um judaísmo e Israel vencidos. Esta teoria da substituição se tornou em uma das fundações básicas sobre as quais se baseia o anti-semitismo cristão, mesmo em nossos dias. Incidentalmente, a Brit HAdasha fala de uma igreja saída dos filhos adotados de Abraão e de Israel, NÃO de usurpadores da aliança e o substituto de uma Israel Física.
No começo do século IV, um evento monumental ocorreu para a igreja. Em 306 D.C., Constantino se tornou o primeiro Imperador Romano cristão. No começo ele concedeu aos judeus os mesmos direitos religiosos que aos cristãos. Entretanto, em cerca de 312 D.C., ele declarou ser o cristianismo a religião oficial do Império. Isto assinalou o fim da perseguição de cristãos, mas o início da perseguição do povo judeu.
Em 313 D.C., o Édito de Milão colocava fora da lei as sinagogas, e em 315 outro édito permitia queimar judeus, se condenados por quebrar a lei.
- Os privilégios antigos dados aos judeus foram cancelados;
- A jurisdição rabínica foi abolida ou severamente diminuída;
- O proselitismo ficava proibido e punido com a morte;
- Os judeus foram excluídos de altos postos ou da carreira militar.
Em 321, Constantino decretou que todos os negócios deveriam fechar no dia em honra ao sol, escolhendo assim outro dia para as preces, avançando ainda mais o cisma.
Da noite para o dia, o Cristianismo recebeu o poder do Estado. Invés da igreja usar a oportunidade para espalhar a mensagem de amor do Evangelho, ela na verdade se tornou a igreja triunfante, pronta para vencer seus inimigos. A partir de 312, os escritos dos Patriarcas da Igreja tiveram outro caráter. Não mais defensivos e apologéticos, mas agressivos, e dirigindo seu veneno contra todos fora do rebanho, em especial o povo judeu.
A IDADE MÉDIA
Examinaremos agora os próximos 700 anos de história, desde os tempos de Constantino até a Primeira Cruzada em 1096 D.C.
Este período é conhecido como a Idade Média, ou Idade das Travas. O Santo Império Romano procurava expandir a nova fé nas tribos pagãs da Europa ocidental: entre os ostrogodos no norte e no leste, os visigodos no oeste, e no Império Franco que se estendia do Mar Mediterrâneo e do Oceano Atlântico até o rio Elba, uma região maior do que a atual França.
No início deste período, encontramos exemplos de tendências anti-judias na literatura da Igreja. No final do século IV, o Bispo de Antíoco, Crisistom, um grande orador, escreveu uma série de oito sermões contra os judeus. Ele tinha visto judeus messiânicos falando com judeus, fazendo juramentos em frente da Arca, e alguns observavam as festas judaicas. Ele queria colocar um fim nisto, num esforço para trazer seu povo de volta ao que chamava de a fé verdadeira, e os judeus se tornaram o alvo de sua série de sermões. Em suas palavras: “A sinagoga não é apenas um local de meretrício e um teatro, é também um covil de ladrões e de bestas selvagens. Nenhum judeu adora a D-us”.
Pode-se facilmente ver que um judeu cristão que queria manter sua herança, ou um cristão gentio que queria aprender mais sobre o ancestral do cristianismo teria muitas dificuldades sob esta pressão. Além disso, Crisistom procurava separar completamente o cristianismo do judaísmo. Ele assim escreveu no seu Quarto Discurso: Eu já disse bastante sobre aqueles que se dizem estar do nosso lado, mas estão ansiosos por seguir os ritos judaicos… é contra os judeus que eu desejo fazer batalha”.
Outra infeliz contribuição que Crisistom fez ao anti-semitismo cristão foi em declarar todo o povo judeu culpado pela morte do Messias. A etiqueta “assassinos do Messias”, aplicada ao povo judeu foi reafirmada por anti-semitas no desenrolar dos próximos 16 séculos.
Vejamos este assunto por um momento e acabemos com ele de uma vez por todas. Para justificar o libelo de assassinos de Cristo, foi citado Mateus 27:25. Nesta passagem, o povo judeu é mostrado como admitindo responsabilidade coletiva pela crucificação de Messias: “E o povo todo respondeu: caia sobre nós o seu sangue e sobre nossos filhos”.
A responsabilidade coletiva de todo um povo por todas as gerações não pode ser validada pelas palavras de poucos. Eles estavam falando em nome deles mesmo, não por Israel.
Se eles foram mantidos como responsáveis pela morte de Ieshua pela sua participação, então os não-judeus são também responsáveis, porque foi um soldado romano gentio que concretamente crucificou e pregou os pregos (cf. Romanos 3:1). Bem, se não todos os gentios, ao menos podemos manter como responsáveis todos os italianos… Acho que você pode ver para onde nos leva este argumento.
Ieshua se entregou voluntariamente à cruz para morrer pelos pecados da humanidade e assim nosso pecado foi o que levou à cruz. Não uma multidão judia ou um exército romano.
Antes de morrer Ieshua disse: “Pai, perdoai-os pois não sabem o que fazem”. Se Ieshua perdoou tanto os protagonistas judeus como os romanos neste evento, quem somos nós para fazer menos do que isto?
Prosseguindo neste período da Idade Média, encontramos alguns líderes perplexos da igreja. Se os judeus e o judaísmo foram amaldiçoados por Deus, como foram ensinados por séculos. Como explicar sua existência?
Agostinho tratou do assunto, elaborando a doutrina que representa os judeus e a nação como testemunhos da verdade do cristianismo. Sua existência era mais ainda justificada pelo serviço que fizeram à verdade cristã, ao atestar pela sua humilhação o triunfo da igreja sobre a sinagoga. O povo-testemunha- escravos e servos que deveriam ser humilhados.
Os monarcas do Santo Império Romano viam assim os judeus como servos da câmara (servicamarae) e os utilizavam como bibliotecários escravos para manter os escritos hebraicos. Eles também utilizavam o serviço dos judeus em outra empresa – a usura ou empréstimo de dinheiro. O empréstimo de fundos era necessário para uma economia crescente. Entretanto, a usura era considerada como colocando em perigo a salvação eterna do cristão, e foi, portanto, proibida. Assim, a igreja aceitava a prática de empréstimos pelos judeus, pois de acordo com sua lógica, suas almas já estavam perdidas de qualquer forma. Muitos mais tarde, o povo judeu foi usado pelos países ocidentais como agentes de comércio e assim vemos como o povo judeu se encontrou nos campos de bancos e comércio.
Assim, até a Idade Média, o arsenal ideológico do anti-semitismo cristão estava já completamente estabelecido. Do ponto de vista social, a deterioração da posição judia na sociedade estava apenas iniciando. Durante este período inicial, a judeufobia virulenta estava primariamente limitada ao clero, que sempre tentava manter seus rebanhos longe dos judeus. Entretanto, depois, as crescentes fileiras da classe média seriam as fontes principais da atividade anti-semita.
AS CRUZADAS
Vamos agora examinar o ano de 1096 e a Primeira Cruzada. Este foi um período de lutas para a igreja. Haviam dois Papas, um sendo um anti-Papa. Quando um deles faleceu, o outro, Urbano II, necessitava de uma causa unificadora e lançou uma Cruzada ou Guerra Santa contra os muçulmanos na Terra Santa, que estavam perseguindo os cristãos e dessecando os lugares sagrados e Jerusalém.
No verão de 1096, uma multidão indisciplinada de 200.000 camponeses e artesãos se congregou na França. Como não haviam muçulmanos por perto, eles viraram sua atenção para os judeus, que, aos seus olhos, eram tão infiéis e inimigos do cristianismo como os muçulmanos. Eles descobriram que podiam iniciar a Cruzada lá mesmo. A crueldade, como a caridade, começada em casa. Ao marcharem através da Europa à caminho da Terra Santa, eles literalmente pilharam, saquearam e estupraram. Face aos gritos selvagens dos cruzados, os judeus crucificaram nosso Salvador e eles devem voltar a Ele ou morrer. Os judeus tinham a alternativa do batismo ou da morte. Milhares preferiram a morte de mártires.
Enquanto a Igreja não sancionava oficialmente estas atividades, elas no entanto prosseguira. Muitos padres e bispos locais protegeram os judeus e lhes deram refúgio das multidões. Infelizmente, outros participaram ativamente nas execuções.
Para partilharmos apenas um exemplo, em Mayance (= Meinz, na Alemanha), o Arcebispo convidou 1300 judeus para se refugiarem no seu palácio. Isto provou ser um convite para uma matança. Sob sua supervisão, pois eles foram todos mortos e mesmo ele partilhou dos espólios confiscados dos cadáveres. Incidentalmente, o Imperador Henrique IV ouviu falar deste massacre, confiscou a propriedade do Arcebispo e permitiu aos judeus que foram batizados à força de retornar ao judaísmo.
Quando os cruzados finalmente chegaram em Jerusalém, eles numeravam 600.000. Eles sitiaram a cidade e em 15 de julho de 1099 penetraram na muralha. Eles mataram os muçulmanos que estavam na cidade e levaram os judeus a uma sinagoga. Cruzados com escudos decorados com grandes cruzes colocaram vigas de madeira em redor da sinagoga e queimaram todos dentro, cantando “Cristo nós te adoramos!”
Há alguma surpresa que para o povo judeu a cruz é um símbolo de ódio e morte, e não de amor, reconciliação e salvação? A cruz foi literalmente tomada e usada como uma espada contra o povo judeu.
Ao todo, houveram nove Cruzadas e elas terminaram em 1291, quando os muçulmanos novamente recuperaram a posse da Terra Santa.
O QUARTO CONCÍLIO LATERANENSE
Em 1215, foi celebrado o Quarto Concílio Laterense. Durante este concílio se cristalizou a doutrina da Transubstanciação. Transubstanciação é a doutrina da carne e do sangue de Cristo tornados presentes na hóstia (= pão) consagrada e no vinho. Esta doutrina ainda é prevalecente na Igreja Católica. O resultado desta doutrina em síntese final se tornou numa nova fonte de anti-semitismo cristão.
Por séculos a seguir, circularam acusações de desacração de hóstias por judeus. O libelo da desecração de hóstia é que os judeus tentavam roubar uma hóstia consagrada e depois a esfaquear, atormentar e queimar numa tentativa de recrucificar Cristo. Muitas histórias ilustradas mostrando este fenômeno fabricado foram circuladas, especialmente na Alemanha, durante os séculos XIV e XV. Este ensinamento ainda não pereceu. Como um exemplo pessoal, no meio da década de 1970, as crianças de um amigo católico voltaram para casa da escola católica paroquial (em Boston, Massachusetts) com esta história, que deveria lhes ensinar respeito para com a hóstia da comunhão: “um rapaz católico e um rapaz judeu entraram numa igreja católica e o judeu convenceu o católico a roubar uma hóstia de comunhão. Eles a levaram para casa, entraram num armário e alfinetaram a hóstia. A hóstia começou a sangrar, encheu o armário de sangue e afogou os rapazes!” Esta é uma variação da antiga acusação do libelo de desecração da hóstia, especialmente porque o malfeitor na história é um judeu.
Um ramo do libelo da desecração da hóstia é o libelo de sangue. O libelo de sangue diz que judeus assassinam não-judeus, especialmente cristãos, para obter sangue para a Páscoa e outros rituais. Descrevia-se que os judeus precisavam beber sangue cristãos para que sua aparência continuasse sendo humana, o sangue cristão também ajudando a eliminar o distinto cheiro judaico (foetor judaicus), que era o inverso do odor de santidade possuído pelos cristãos. Qualquer um com um pouco de conhecimento das leis dietárias judias sabe que aos judeus está proibido comer sangue, mesmo se não fosse óbvio que estas acusações são completamente falsas. Infelizmente, ela demonstra completa ignorância do estilo de vida dos judeus, e a falta de relacionamento entre cristãos e judeus naquelas épocas.
Outro cânone promulgado pelo Quarto Concílio Lateranense requeria aos judeus usar uma marca distintiva. A forma desta marca variava de país a país, mas normalmente tinha a forma de um distintivo, ou um chapéu de três pontas ou pontudo. Desta maneira, você poderia Ter certeza de não entrar inadvertidamente em contato com judeus. Mesmo na arte medieval os judeus são mostrados com círculo em suas roupas ou com chapéus pontudos.
Durante este período, muitas autoridades leigas e eclesiásticas tentaram proteger a comunidade judia de perseguição. Grande parte do anti-semitismo era agora promovido por uma crescente classe média.
A INQUISIÇÃO
O próximo evento histórico a marchar a história mundial é a infamada Inquisição. De acordo com a Lei Canônica, a inquisição não estava autorizada a interferir nos assuntos internos dos judeus, mas a procurar cristãos heréticos que tinham regredido. Entretanto, esta lei foi rescindida baseado em que a presença de judeus causava o desenvolvimento de heresia nas comunidades cristãs.
Em meados do século XV, foi iniciada a Inquisição Espanhola. Na Espanha, dezenas de milhares de judeus foram forçados a se batizar. Em função disto, eles eram considerados cristãos e se esperava que se comportassem como cristãos. Estes judeus batizados eram conhecidos como Conversos ou Cristãos Novos. Se um camundongo é pego dentro de uma jarra com biscoitos, isto não o torna um biscoito. Da mesma maneira, forçar alguém a se batizar não o torna um cristão.
Estes conversos, portanto, ainda praticavam muitos dos costumes judeus, como acender as velas de Sexta-feira de noite, mudar a roupa branca no Sábado, se abster de comer porco e peixes sem escamas, observar os Dias de Festa, etc. Ser pego praticando qualquer um dos 37 costumes era base para ser levado perante um tribunal da Inquisição. Os cristãos deveriam procurar por estes sinais e relatar qualquer regressão. Uma vez trazido perante o tribunal, não havia forma de escapar da punição:
Se você confessar e não se arrepender, você será queimado vivo;
Se você confessar e se arrepender, você será humilhado em público. Qualquer passo em falso dado depois resultará em morte certa.
Se você não confessar, mesmo sendo inocente, você será torturado até confessar e depois queimado.
A igreja não podia executar as vítimas, e então os passava a um braço secular do tribunal da Inquisição. O sangue não deveria verter, e daí a fogueira. Isto era justificado por um texto em João 15:6 – “Se alguém não permanecer em mim, será lançado fora à semelhança do ramo, e secará; e o apanham, lançam no fogo e o queimam”.
Incidentalmente, todas as propriedades eram confiscadas, enriquecendo o tribunal da Inquisição.
Judeus praticantes (não Conversos) foram ultimamente trazidos perante os tribunais da Inquisição, como se acreditavam que eles eram judaizantes, exercendo má influência sobre os conversos. Eles também julgados e queimados.
A Inquisição na Espanha, durou de 1481 até 1820. Mais de 350.000 judeus sofreram punições.
A REFORMA
Finalmente, um sopro de ar limpo. Os reformistas reconheceram muitos erros inerentes na igreja e desafiaram a liderança, o Papa, os bispos, os padres – todo o corpo eclesiástico. A Reforma teve repercussões importantes e complexas e mesmo contraditórias na evolução do anti-semitismo.
Um ramo do protestantismo, os Calvinistas e suas ramificações, provaram ser menos judeofóbicos do que o catolicismo até o século XX.
O outro ramo, o Luteranismo, se tornou cada vez mais anti-semita.
Uma consequência imediata da Reforma foi o agravamento da posição dos judeus nas regiões que continuaram sendo católicas romanas. Os papas estavam determinados a restaurar a ordem através da estrita aplicação da Lei Canônica. Isto naturalmente afetava de forma negativa o povo judeu. Um resultado foi que a partir de meados do século XVI, os GUETOS foram introduzidos, primeiro na Itália e depois no Império Austríaco. O gueto era na verdade o nome de uma ilha em Veneza, que tinha uma fundição abandonada. Os judeus de Veneza foram reunidos e transferidos para este local, onde poderiam ser separados e controlados. Adolph Hitler reinstituiu o gueto no Terceiro Reich pela mesma razão. G.E. Roberti, um publicista católico do século XVIII, declarou: “O Gueto judeu prova melhor a verdade da religião de Ieshua o Ungido do que toda uma escola de teologia”.
Agora, vamos dar uma olhada no ramo Luterano da Igreja Protestante. Martin Lutero é o pai do luteranismo. Durante a primeira parte de seu ministério, de 1513 a 1523, Lutero seguidamente condenava a perseguição dos judeus e recomendava uma atitude mais tolerante com eles, baseado num espírito de verdadeira irmandade. Em 1523, ele escreveu um panfleto “Que Cristo nasceu judeu”, no qual ele argumentava que os judeus, que eram da mesma estirpe como o fundador do cristianismo, tinham razão ao rejeitar o “paganismo papal” apresentado a eles como cristianismo. Ele adicionou “Se eu tivesse sido um judeu e visto estes idiotas e tolos ensinando a fé cristã, eu teria preferido me tornar um porco do que me tornar cristão”.
Entretanto, quando eles não aceitaram a sua versão do cristianismo também, ele se tornou gradativamente hostil ao povo judeu. Em 1530 ele se referia ao povo judeu como “os judeus arrogantes, de coração de ferro e teimosos como o demônio”, nos seus sermões. E finalmente, ocorreu. Ele imprimiu dois panfletos: em 1542, “Sobre os Judeus e Suas Mentiras”, e em 1543, sobre o Shem Hamephoras (Sobre o Nome Inefável). Estes dois panfletos contêm algumas das frases mais viciadas e repugnantes jamais escritas contra o povo judeu.
Quinhentos anos depois Hitler encontrou algumas de suas idéias e justificativa o tratamento do povo judeu e o Holocausto nestes escritos. No final das contas, se o patriarca da Igreja Luterana declarou estas coisas, bem, portanto… (tenha certeza que vossos pecados vos descobrirão).
A IDADE DA LUZ
Ao nos movermos para a Idade da Luz nos séculos XVII e XVIII, encontramos o povo judeu ainda sofrendo de um legado de preconceitos. Durante o controle total do cristianismo na Europa, os judeus podiam existir apenas às margens da vida social europeia. O termo “O Judeu Errante” encontrou sua definição no fato do povo judeu ser forçado de país a país, de cidade em cidade… o bode expiatório dos males do mundo, sem propriedades, sem ocupações intelectuais, e nem riquezas.
Quando os europeus estavam morrendo da praga negra, a bubônica, os judeus foram acusados de envenenar os poços. Na sua falta de conhecimentos sobre germes e doenças, e vendo o povo judeus na sua maioria livre da infecção (fato devido às suas leis dietárias), sua conclusão foi de que os judeus eram a fonte do problema.
No final, os judeus eram ainda pintados com o mal, instigados pelo diabo para fazer coisas más. Ou eram caricaturados com rabos longos, cornos e feições demoníacas.
Aos nos movermos para a era da emancipação, uma nova versão do século XIX de anti-semitismo surgiu num solo bem cultivado por muitos séculos na Europa por teologias cristãs, e mais importante, por mitos populares sobre o povo judeu. Por séculos cristãos perseguiram por razões teológicas, mas estes “ensinamentos de aversão” selaram o mais antigo dos temas anti-semitas, que os judeus eram um elemento estranho singular dentro da sociedade humana.
OS POGROMS
De 1881 até 1921 houve uma série de pogroms na Rússia. Os pogroms eram uma série de ataques acompanhados de destruição, o saque de propriedade, mortes e estupros perpetrados pelas populações cristãs russas contra os judeus. As autoridades civis e militares russas apenas observavam. A igreja silenciava na melhor das hipóteses, e mesmo endossava alguns dos ataques. Foi durante este período que encontramos uma infame publicação, O PROTOCOLO DOS SÀBIOS DE SIÃO. Os protocolos foram primeiro impressos na Rússia em 1905 como uma suposta conversa entre líderes judeus sobre como dominar o mundo. A publicação original foi feita sob os auspícios da polícia secreta na imprensa de Czar Nicolau II da Rússia, que não fazia segredo de ser membro pessoal da organização anti-semita chamada de Os Cem Pretos. Mesmo que este panfleto tenha sido provado como falso em inúmeras ocasiões, ele ainda pode ser encontrado na imprensa, mesmo nos Estados Unidos de nossos dias.
É difícil avaliar o alcance dos pogroms durante os anos de guerra civil e o número de vítimas que eles ocasionaram. Existem dados parciais de 530 comunidades, nas quais ocorreram 887 grandes pogroms de 349 pogroms menores: houveram 60.000 mortes e várias vezes este número de feridos (Dubnow, História da Rússia).
HOLOCAUSTO
Isto nos traz ao Holocausto, o ápice de 1900 anos de maus ensinamentos na sociedade cristã. O Holocausto foi a Solução Final de Hitler para o povo judeu. A Alemanha era a sociedade mais iluminada, intelectual e aculturada naquela época. Mesmo assim, a chamada sociedade cristã apenas observava e alguns mesmo participaram.
Seis milhões de judeus, incluindo dois milhões de crianças, foram violentamente mortos por Hitler e pelos nazistas. Sua solução final era de livrar o mundo do “verme judeu”. Hitler chegou à conclusão de que havia um mal na sociedade e o denominador comum era os judeus, que podiam ser encontrados em todas as cidades, em cada país da Europa. Eles foram os assassinos de Cristo, eles precisavam ser controlados, postos a trabalhar, suas sinagogas queimadas junto com seus livros de preces, suas propriedades confiscadas, e no final mortos. Soa familiar, não?
Nem por um minuto eu acredito que Hitler e seus agentes de morte eram cristãos, mas eles perpetraram estes atos numa nação historicamente cristã e houve o silêncio.
O Padre Neimoller, escrevendo sobre este triste capítulo da história: “O Holocausto em toda sua severidade é algo singular ao povo judeu. Enquanto outros que foram mortos não eram judeus, eles foram mortos por razões políticas, ou razões sociais, como as prostitutas ou homossexuais. O povo judeu, mães, crianças, camponeses, médicos, músicos, rabinos, professores, foram todos exterminados APENAS PORQUE ERAM JUDEUS”. Felizmente, houveram alguns cristãos que agiram, como Corrie Ten Boom, mas seu número era diminuto para fazer alguma diferença.
Hitler desapareceu. A Alemanha nazista deixou de ser. A mação do olho de Deus, o povo Judeu está aqui e Israel é um fato.
Deste relato histórico, pode-se ver que o conceito de relações entre cristãos e judeus é algo muito recente. Pode-se ver, eu agora direi, que as genuínas relações cristã-judaicas têm ocorrido de forma séria apenas nos últimos 30 anos. Trinta anos de 2.000. Muito disto veio como resultado do Holocausto, mas mesmo assim está acontecendo. Vai durar? Somente se você se tornar parte delas. HÁ AINDA UMA BATALHA A LUTAR, O ANTI-SEMITISMO NÃO DESAPARECEU.
Enquanto que alguns acreditam que o mundo está se tornando melhor e que o anti-semitismo está desaparecendo, isto não é verdade. Desde 1980, atos anti-semitas nos Estados Unidos dobraram e redobraram cada ano. Eles existe em todo o mundo. Israel recebe muitas reportagens coloridas com uma perpétua tendência negativa. Israel se tornou num bastão de auto-determinação para o povo judeu, e o mundo não quer aceitar isto. Umas Israel fraca e sem defesas é aceitável. Mas uma Israel forte, igual aos povos do mundo, é intolerável.
Na minha estimativa, a opinião mundial sobre Israel está aprisionada no antigo barro do anti-semitismo. Depois da Segunda Grande Guerra, quando os fatos sobre o Holocausto vieram à tona, muitos grupos e indivíduos inteligentes começaram a defender o povo judeu, mesmo tarde demais para salvar os 6 milhões que pereceram. Enquanto não está mais “na moda” ser anti-semita, isto não fez o problema desaparecer, apenas o forçou a se esconder. Atualmente, ele se mostra na opinião mundial de Israel com os povos e os governos transferindo seus sentimentos anti-semitas a um nível nacional disfarçado de indignação virtuosa contra o “agressivo Estado sionista”. A nova tendência anti-Israel ou anti-sionista não é nada mais do que o antigo anti-semitismo com novas vestes.
Como podemos contrabalançar isto? Podemos tomar uma posição, saber nossos fatos e ser uma voz cristã coletiva de apoio e encorajamento… Isto é algo que não foi feito em toda a história da Igreja. Sim, houveram cristãos individuais que falaram, mas agora eu acredito que temos uma oportunidade de fazer uma diferença, porque podemos mostrar nossa solidariedade como um grupo.
Irmãos, qual é nossa resposta a isto?
Gostaria de refletir Romanos 11, onde Paulo nota que o povo judeu é “amado por causa dos patriarcas, e que pela nossa misericórdia, eles receberão misericórdia.”
Oh, como me entristeço em pensar que o maior instrumento de Satã contra o povo da aliança de Deus, a maçã de Seu olho, tem sido a igreja.
Dizer que estes homens da igreja não eram cristãos verdadeiros não é correto, pois seguramente muitos deles o foram.
Aprendamos uma lição de Martin Lutero. Alguns dos maiores anti-semitas começaram como grandes apoiadores do povo judeu. O anti-semitismo é um pecado e devemos estar constantemente em guarda contra sua presença em nossos corações e nossas vidas. Eu completamente acredito que o anti-semitismo é o epítome do mal, e a luta contra ele é uma batalha tanto espiritual como física.
Portanto, tomemos todos os escudos de Deus e nos aprontemos para a batalha. Foi dito pelo Dr. Edward Flannery no seu livro “The Anguish of the Jews” (A Angústia dos Judeus), que os únicos capítulos da história cristã conhecidos pelos judeus foram registrados em páginas que a Igreja rasgou dos livros de história e queimou.
Agora, também você ouviu, você é responsável por agir. Não por culpa, mas por um humilde espírito de amor. Chegou a hora da igreja crescer e aprender a respeitar o povo da aliança de Deus, nossos irmãos mais velhos, e o judaísmo, a fé patriarcal de nossa fé.
Fiquemos aqui e iniciemos a tarefa de enterra o ódio de gerações onde quer que o encontremos. Seja nas nossas comunidades, em nossas igrejas, em nossas famílias e, sim, se levantar em nossos corações. Você PODE FAZER UMA DIFERENÇA!!!
Retirado do Bridges for Peace – feito por Clarence Wagner, Jr. Diretor Internacional de Pontes para a paz.