Mário Moreno/ novembro 24, 2023/ Artigos

Lidando com os foras da lei

“Ia´aqov disse a Raquel que ele era irmão do pai dela…” (Gn 29:12)

A Torah relata que quando Ia´aqov conheceu Rachel, ele se identificou como “achi aviha” – “irmão de seu pai”. O Talmud questiona a resposta de Ia´aqov, pois Lavan era tio de Ia´aqov, não seu irmão, e então explica que Ia´aqov sabia, assim que a conheceu, que Rachel estava destinada a ser sua esposa. Rachel aceitou a proposta de Ia´aqov, mas expressou sua preocupação de que seu pai, um notório vigarista, manipulasse Ia´aqov para que se casasse com Leah, sua irmã mais velha. Ia´aqov assegurou-lhe que isso não aconteceria porque ele era irmão de seu pai, ou seja, igual a Lavan em subterfúgios (Meguilá 13b).

A Ohr HaChaim pergunta como um tsadic como Ia´aqov poderia sugerir que ele estaria disposto a descer ao nível de um vigarista. Embora o Talmud cite um versículo que afirma “com uma pessoa desonesta pode-se lidar de forma dissimulada”, validando assim a posição de Ia´aqov, a Ohr Hachaim, no entanto, opina que Ia´aqov não teria agido de maneira comprometedora. Em vez disso, ele teria usado seu tremendo intelecto para evitar sucumbir às maquinações de Lavan. (Gn 29:12)

O Targum Yonatan oferece uma interpretação ligeiramente diferente. Ele afirma que Ia´aqov disse a Rachel “ana ramai vchakim yatir minei” – “Eu sou um vigarista maior e mais sábio do que ele”. De acordo com o Targum, Ia´aqov então acrescentou a declaração “v’leis lei reshu l’avisha li” – “e ele não tem permissão para me causar dano”. (Ibid.) Ia´aqov estava se referindo à garantia que Hashem lhe deu em Beis El, ao deixar Eretz Israel, de que ele estaria protegido de todo o mal. (Gn 28:20) Se Ia´aqov recebeu esta garantia de Hashem, por que ele precisou prefaciar seus comentários com a afirmação de que ele era um vigarista maior e mais sábio que Lavan?

A Torah registra que Ia´aqov não enviou Binyamin com seus irmãos quando eles viajaram para comprar provisões “shema yikra lo ason” – “para que o desastre não lhe aconteça”. (Gn 42:4) O Midrash observa que se for a vontade de Hashem que uma pessoa morra, isso pode ocorrer tanto em casa quanto na estrada. Do que então Ia´aqov estava com medo? O Midrash responde que embora uma pessoa possa merecer a proteção de Hashem contra o mal, se ela se colocar em circunstâncias perigosas “HaSatan mekatreg besha’as hasakana” – “Satanás processa em um momento de perigo”. (Bereshit Rabá 91:9) Uma pessoa que compromete a sua segurança perde a sua proteção Divina.

Envolver-se com um homem como Lavan era flertar com o perigo e, portanto, não se podia presumir automaticamente que Ia´aqov seria divinamente protegido. Foi somente porque Ia´aqov tinha a capacidade natural de enfrentar Lavan, o que mitigou o perigo envolvido, que ele poderia esperar a proteção divina. O Targum está nos ensinando que Ia´aqov, o “Ish Emet” – “Homem da Verdade” não se colocou em uma situação que pudesse minar sua integridade; antes, para garantir a proteção divina, ele precisava ter o potencial para se salvar.

Tradução: Mário Moreno.