Mário Moreno/ novembro 2, 2017/ Artigos

O filho pródigo

E disse: Um certo homem tinha dois filhos; e o mais moço deles disse ao pai: Pai, dá-me a parte dos bens que me pertence. E ele repartiu por eles a fazenda. E, poucos dias depois, o filho mais novo, ajuntando tudo, partiu para uma terra longínqua, e ali desperdiçou os seus bens, vivendo dissolutamente. E, havendo ele gastado tudo, houve naquela terra uma grande fome, e começou a padecer necessidades. E foi, e chegou-se a um dos cidadãos daquela terra, o qual o mandou para os seus campos, a apascentar porcos. E desejava encher o seu estômago com as bolotas que os porcos comiam, e ninguém lhe dava nada. E, tornando em si, disse: Quantos jornaleiros de meu pai têm abundância de pão, e eu aqui pereço de fome! Levantar-me-ei, e irei ter com meu pai, e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra os céus e perante ti; já não sou digno de ser chamado teu filho; faze-me como um dos teus jornaleiros. E, levantando-se, foi para seu pai; e, quando ainda estava longe, viu-o seu pai, e se moveu de íntima compaixão e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou. E o filho lhe disse: Pai, pequei contra os céus e perante ti, e já não sou digno de ser chamado teu filho. Mas o pai disse aos seus servos: Trazei depressa a melhor roupa; e vesti-lho, e ponde-lhe um anel na mão, e alparcas nos pés; e trazei o bezerro cevado, e matai-o; e comamos, e alegremo-nos; porque este meu filho estava morto, e reviveu, tinha-se perdido, e foi achado. E começaram a alegrar-se. E o seu filho mais velho estava no campo; e quando veio, e chegou perto de casa, ouviu a música e as danças. E, chamando um dos servos, perguntou-lhe que era aquilo. E ele lhe disse: Veio teu irmão; e teu pai matou o bezerro cevado, porque o recebeu são e salvo. Mas ele se indignou, e não queria entrar. E saindo o pai, instava com ele. Mas, respondendo ele, disse ao pai: Eis que te sirvo há tantos anos, sem nunca transgredir o teu mandamento, e nunca me deste um cabrito para alegrar-me com os meus amigos; vindo, porém, este teu filho, que desperdiçou os teus bens com as meretrizes, mataste-lhe o bezerro cevado. E ele lhe disse: Filho, tu sempre estás comigo, e todas as minhas coisas são tuas; mas era justo alegrarmo-nos e folgarmos, porque este teu irmão estava morto, e reviveu; e tinha-se perdido, e achou-se” (Lc 15:11-32).

Este texto é largamente utilizado para falar-se a respeito de pessoas que se desviam da presença do Senhor. Para alguns pregadores, o “filho pródigo” é aquela pessoa que num determinado momento de sua vida “confessou” Ieshua como seu Senhor e Salvador e depois – por qualquer razão – deixa o convívio com a igreja e os crentes. Esta pessoa é chamada de “desviado”.

Mas, raciocinemos um pouco mais sobre o texto:

  1. O texto nos fala sobre dois filhos: ambos pertencem à mesma família e foram gerados pelo mesmo Pai. “E disse: Um certo homem tinha dois filhos” (Lc 15:11). Novamente percebemos que estes rapazes são judeus (não devemos nos esquecer que todo o relato está sendo feito por um judeu e para judeus), certamente foram educados nos princípios da Torah. Eles devem ter aprendido sobre o temor ao Senhor e também sobre os mandamentos.

Como nasceu o povo que conhecemos como “igreja?” Se repassarmos a história, veremos que os primeiros crentes no Messias eram todos judeus! Foi somente com Sha´ul (Paulo) que as boas novas sobre o Messias judeu foram anunciadas fora das fronteiras de Israel – aos dispersos [judeus residentes fora de Israel] e aos gentios. Daí formaram-se grupos que posteriormente vieram a ser chamados de “qahal” (congregação). Foi deste termo que derivou-se a palavra “igreja”.

  1. O mais novo pede sua parte da herança. Ora, nós sabemos que isso só pode ser alcançado após a morte do testador (Pai). “E o mais moço deles disse ao pai: Pai, dá-me a parte dos bens que me pertence. E ele repartiu por eles a fazenda” (Lc 15:12).

Devemos notar – também através da história – que os “novos crentes” estavam incorporando à congregação – igreja – práticas (usos e costumes) que não condiziam com as Escrituras. Estas práticas aos poucos foram sendo “aceitas” por alguns “ministros” que as incorporaram às tradições e ao culto de suas congregações. Este foi o início do “desvio” que a igreja tomou até chegar aos dias de hoje. Eles literalmente tomaram sua parte da “herança” – o legado que receberam de seu Pai – e fez dela aquilo que julgava correto.

  1. Este filho mais novo desperdiça toda a sua herança no mundo. “E, poucos dias depois, o filho mais novo, ajuntando tudo, partiu para uma terra longínqua, e ali desperdiçou os seus bens, vivendo dissolutamente. E, havendo ele gastado tudo, houve naquela terra uma grande fome, e começou a padecer necessidades” (Lc 15:13-14). O filho mais novo parte para lugares desconhecidos julgando encontrar ali aventura e pessoas que lhe ajudariam a administrar sua recém-adquirida “riqueza”. Este rapaz gasta tudo de forma irresponsável e passa então por necessidades… Se tomarmos a história da Igreja, veremos que foi justamente isso que ela fez… Ela toma sua herança judaica e a desperdiça toda no mundo! Hoje pouco ou quase nada resta desta herança em seu meio. O resultado disso? Há em toda a igreja uma generalizada “fome” e muitas necessidades! A igreja deixou de comer sobre a mesa – já não participa do banquete – para comer as migalhas que caem dela juntamente com os “cachorrinhos!” A vida da igreja está expressa nesta palavra “dissoluta”. É realmente uma “vida de prazeres”, onde existe uma busca incessante por bens e satisfação material. Poucos – quase ninguém – se importa com o “Reino”; pelo contrário, os crentes tem uma grande atração por aquilo que lhes dê status e segurança material. São muitas as “estratégias” utilizadas pela igreja a fim de se alcançar tais objetivos…
  2. A humilhação. “E foi, e chegou-se a um dos cidadãos daquela terra, o qual o mandou para os seus campos, a apascentar porcos. E desejava encher o seu estômago com as bolotas que os porcos comiam, e ninguém lhe dava nada” (Lc 15:15-16). Agora vem o período de humilhação! Mas, por que humilhação? Para um judeu – ou para quem conserva sua herança bíblica e judaica – é isso que representa “apascentar porcos”. O que significa isso? Os porcos eram tidos como um dos animais proibidos – impuros – pela Torah. Certamente os habitantes daquela terra sabiam que aquele homem era judeu, e quando lhe dão esta atribuição estão fazendo isso com a intenção de humilhá-lo e rebaixá-lo de tal forma que possam dizer: “Agora o judeu está fazendo aquilo que é proibido pela Torah porque desobedeceu ao seu D-us! Ele que fique ali e cuide bem de meus porcos”. Que tipo de rebanho nós temos “pastoreado” hoje? Será que estão sob nossos cuidados somente ovelhas, ou existem muitos “porcos” infiltrados entre elas a fim de manchar, contaminar o restante do rebanho? E nós, o que temos comido? Estamos nos alimentando com “comida” genuína ou estamos nos sujeitando a comer as “bolotas” que os porcos comiam?
  3. Tomando consciência… “E, tornando em si, disse: Quantos jornaleiros de meu pai têm abundância de pão, e eu aqui pereço de fome! Levantar-me-ei, e irei ter com meu pai, e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o céu e perante ti; já não sou digno de ser chamado teu filho; faze-me como um dos teus jornaleiros” (Lc 15:17-19). Mesmo o mais duro homem um dia é tocado pelas lembranças de seu passado glorioso como filho do Rei… Mesmo o mais “cego”, num determinado momento de sua vida, chega à esta conclusão: “E, tornando em si, disse: Quantos jornaleiros de meu pai têm abundância de pão, e eu aqui pereço de fome”. E, quando isso acontece é chegado o momento da restauração! É necessário que admitamos nossa pobreza e consequentemente nossa necessidade em retornarmos aos padrões de outrora… Aquele rapaz caiu em si e ele desejou ser como um dos funcionários de seu Pai; ele então percebeu quão grave havia sido a atitude que tomara contra aquele que tudo lhe dera… Assim como aquele rapaz, hoje temos muitos líderes que estão chegando à mesma conclusão: chega de miséria! Quero retornar à casa de meu Pai celestial para voltar a desfrutar daquilo que é original, puro e que me trará de volta a satisfação que nunca experimentei: a de estar completamente na casa de meu Pai! Mas, ainda resta um sentimento de vergonha pelos atos passados. Alguns também pensam como aquele rapaz: “já não sou digno de ser chamado teu filho; faze-me como um dos teus jornaleiros”. Eu vou voltar, mas serei apenas como um “funcionário” de meu Pai; isso já será para mim suficiente!
  4. O retorno à casa do Pai. “E, levantando-se, foi para seu pai; e, quando ainda estava longe, viu-o seu pai, e se moveu de íntima compaixão e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou. E o filho lhe disse: Pai, pequei contra o céu e perante ti, e já não sou digno de ser chamado teu filho. Mas o pai disse aos seus servos: Trazei depressa a melhor roupa; e vesti-o, e ponde-lhe um anel na mão, e alparcas nos pés; e trazei o bezerro cevado, e matai-o; e comamos, e alegremo-nos; porque este meu filho estava morto, e reviveu, tinha-se perdido, e foi achado. E começaram a alegrar-se” (Lc 15:20-24). Agora temos o retorno definitivo! O filho mais moço volta à casa do Pai com a esperança de ser recebido, pelo menos como um serviçal. Mas seu Pai, enquanto ele ainda estava ao longe, vê aquele que seu coração tanto ansiava: seu filho! Sua reação é imediata: ele corre para abraçá-lo e recebê-lo de volta em sua casa! Agora o filho tenta argumentar pedindo perdão ao Pai, mas nada disso importa, pois ele está vivo! O Pai o recebe como Seu filho e devolve-lhe o lugar que nunca fora preenchido por outro: o de Seu filho mais novo! A recepção causa espanto ao filho, mas o Pai já esperava há muito por este momento! Houve então muita alegria naquele lar! Quando Ieshua contou esta parábola Ele certamente tinha em mente isso: o retorno dos dispersos à casa do Pai! Tento imaginar a alegria que é manifesta na Eternidade quando um líder traz de volta seu rebanho e é restaurado! O Pai, Ieshua e Ruach há Codesh (Espírito o Santo) o recebem de braços abertos e devolvem-lhe todas as prerrogativas perdidas enquanto estavam fora! As vestes são trocadas, o anel – que indicava a qual família ele pertencia – é colocado novamente e seus pés são calçados com sandálias (sapatos que diferenciavam o homem quanto à sua classe social e sua condição de homem livre). Agora, após estar pronto, ele entra então na casa do Pai e tem início a festa do Retorno! A felicidade é geral, com apenas uma exceção: o filho mais velho!
  5. O ciúme do mais velho. “E o seu filho mais velho estava no campo; e quando veio, e chegou perto de casa, ouviu a música e as danças. E, chamando um dos servos, perguntou-lhe que era aquilo. E ele lhe disse: Veio teu irmão; e teu pai matou o bezerro cevado, porque o recebeu são e salvo. Mas ele se indignou, e não queria entrar. E saindo o pai, instava com ele. Mas, respondendo ele, disse ao pai: Eis que te sirvo há tantos anos, sem nunca transgredir o teu mandamento, e nunca me deste um cabrito para alegrar-me com os meus amigos; vindo, porém, este teu filho, que desperdiçou os teus bens com as meretrizes, mataste-lhe o bezerro cevado. E ele lhe disse: Filho, tu sempre estás comigo, e todas as minhas coisas são tuas; mas era justo alegrarmo-nos e folgarmos, porque este teu irmão estava morto, e reviveu; e tinha-se perdido, e achou-se” (Lc 15:25-32). Agora, surge o irmão mais velho! Quando ele descobre o motivo da festa, brota uma indignação em seu coração e lhe vem à memória todos os anos de devoção e lealdade ao Pai! Seus argumentos estão plenamente corretos em sua essência, porém o que importa aqui é somente uma coisa: o membro da família que faltava retornou! E isso em si só já é motivo de grande alegria! Raciocine comigo: enquanto a igreja retorna para suas raízes, a nação de Israel (leia-se “os judeus”) vêem isso com muita cautela e desconfiança! Muitos dizem: “Eles (referindo-se à igreja) são “falsos judeus” e tem a intenção de apenas nos converterem ao cristianismo. Outros já olham e dizem: “o que há por trás disso?” O irmão mais velho está percebendo que o irmão mais novo está “retornando” à casa do Pai! De alguma forma tem se cumprido a profecia de Sha´ul: “Para ver se de alguma maneira posso incitar à emulação os da minha carne e salvar alguns deles” (Rm 11:14). A palavra “emulação” significa ciúmes! Os judeus natos já sentem-se enciumados por verem os crentes retornando à Torah, celebrando as festas bíblicas e buscando sua verdadeira identidade! Não há o que dizer: o Eterno está fazendo cumprir-se a Palavra que saiu da boca de seus profetas e Ele está novamente “ajuntando o povo de Israel”. Agora os dispersos estão tentando incorporar-se novamente à nação para serem um só povo!

Queiramos nós ou não, Tudo o que o Eterno tem feito tem uma finalidade: a de fazer cumprir Sua Palavra!

Que possamos ser contados entre aqueles que realmente desejam retornar à casa do Pai!

Mário Moreno.