O leproso
O leproso
O leproso – antes e depois
A história de um leproso passa por várias etapas diferentes e estas etapas estão associadas intimamente com a fala e com aquilo que se fala!
As escrituras nos falam sobre isso e nos informam a gravidade da situação desta pessoa que passa do convívio normal na sociedade ao ostracismo forçado por sua postura para com seu próximo – mais exatamente por suas palavras contra seu próximo. A Torah nos declara assim sobre o leproso:
“Falou mais o IHVH a Moshe e a Aharon, dizendo: quando um homem tiver na pele da sua carne, inchação, ou pústula, ou descoloração, na pele de sua carne como praga da lepra, então será levado a Aharon, o sacerdote, ou a um de seus filhos, os sacerdotes. E o sacerdote examinará a praga na pele da carne; se o pêlo na praga se tornou branco, e a praga parecer mais profunda do que a pele da sua carne, é praga de lepra; o sacerdote o examinará, e o declarará por imundo. Mas, se a mancha na pele de sua carne for branca, e não parecer mais profunda do que a pele, e o pêlo não se tornou branco, então o sacerdote encerrará o que tem a praga por sete dias” (Lv 13:1-4). Neste texto percebemos que existe um sinal visível – físico – que define a praga de lepra! O texto nos fala sobre uma “pústula” na carne. Esta palavra vem do termo hebraico “se´et” e significa “pústula branca”. Este é um sinal da lepra, que é especificamente descrito como sendo branco. De acordo com muitas fontes a palavra “se´et” vem da raiz nassa significando “elevado” por que ela apresenta estar mais alta que a pele, embora ela não seja fisicamente mais alta que a pele. Uma outra palavra que acompanha o texto, “descoloração” vem do termo hebraico “sapachat” e de acordo com o Talmude este é um tipo secundário de marca, de um branco levemente mais desbotado que o se´et.
Já a palavra “praga” em hebraico é nega´ e significa “golpe, praga, doença”. Esta palavra no hebraico refere-se a um golpe físico ou a um castigo que um suserano aplica a um vassalo. Geralmente é D-us quem desfere a punição ou a enfermidade.
Entendemos o seguinte: a lepra – via de regra – era um modo visível de externar aquilo que havia acontecido entre uma pessoa e seu semelhante e também entre uma pessoa e seu Criador! A lepra é um símbolo da força do pecado que é manifesta fisicamente na pessoa, tornando-a inacessível e também indesejável por parte de seus semelhantes! Esta pessoa deveria ficar fora do arraial dos israelitas justamente por causa do golpe que ela sofrera em relação à enfermidade da lepra! Esta separação já funcionaria como um tipo de “castigo”; além disso havia a própria discriminação sofrida pelo leproso e ainda o sentimento de “inferioridade” que certamente permeava a alma de tal pessoa!
Há ainda o caso de rebelião, que trazia sobre o rebelde a consequência da lepra! Temos o caso de Mirian e Uzias que em tempos diferentes e ocasiões diferentes manifestaram a mesma atitude e receberam a mesma punição!
A lepra não poderá ser diagnosticada senão pelo sacerdote. “E o sacerdote o examinará, e eis que, se a pústula na pele se tem estendido, o sacerdote o declarará por imundo; é lepra” (Lv 13:8). A palavra “lepra” em hebraico é tsará e significa “sofrer doença de pele, ficar leproso”. Esta palavra originou outro termo que é tsara´at que por seu turno significa “doença maligna de pele, lepra”. Nós percebemos que a lepra é uma doença superficial porém visível e repugnante! O próprio termo em hebraico designa uma doença de pele, ou seja, algo que atinge – a princípio – somente a pele da pessoa e depois aprofunda-se trazendo graves consequências ao seu portador! O interessante é que a própria palavra demonstra que a doença é de origem maligna! É um sintoma físico de um defeito espiritual, ocorrendo principalmente em indivíduos de alto nível espiritual, cujas funções corporais ficam sujeitas a seu estado espiritual. Isso nos mostra que a rebelião oferece uma “porta” de entrada para a atuação maligna na vida das pessoas! Este fato nos mostra por que somente o sacerdote – e não o médico – poderia dar o “diagnóstico” desta doença!
As feridas aparentes na carne demonstram que ainda há algo de “errado” com esta pessoa. “E o sacerdote o examinará, e eis que, se há inchação branca na pele, a qual tornou o pêlo em branco, e houver carne viva na inchação, lepra inveterada é na pele da sua carne; portanto, o sacerdote o declarará por imundo; não o encerrará, porque imundo é” (Lv 13:11). Esta situação certamente caracteriza algo ainda muito sério: existem, no interior desta pessoa, grandes feridas abertas que estão sendo manifestas através da lepra como “carne viva” na pele do doente!
Língua má
Segundo a tradição judaica a causa da lepra está na língua! “E o sacerdote, examinando a chaga, e eis que, se ela parece mais funda do que a pele, e pêlo amarelo fino há nela, o sacerdote o declarará por imundo; é marca calva, é maldição leprosa da cabeça ou da barba” (Lv 13:30). A palavra “marca calva” em hebraico é neteq e significa “infecção cutânea”. Na realidade a lepra possui uma variação que causa infecções na pele e que a tornam como caracteristicamente uma doença da superfície da pele! Sobre este verso a Torah comenta: “O Midrash escreve que a pessoa é atacada pela lepra por causa do pecado da calúnia e da maledicência. Faz esta dedução transformando a palavra “metzorá” (leproso) por “motzirá” (faz sair o mal da boca). O leproso devia morar fora do acampamento, tal como o caluniador que deve ser isolado por causa de sua má língua!
O caluniador é mais culpado que o assassino, pois este mata só uma pessoa, e o caluniador mata três (ele mesmo, quem dá ouvidos e o caluniado). Mesmo quando não se dá fé ao caluniador pelo que disse, alguma coisa fica na memória contra a vítima. A má língua foi comparada a uma flecha e não a uma espada, pois ela mata mesmo de longe; o caluniador está em Roma e mata na Síria; está na Síria e mata em Roma. Quatro categorias de pessoas não gozarão do esplendor divino: os caçoístas, os hipócritas, os mentirosos e os que falam mal do próximo”.
Isso nos demonstra o quanto está relacionado o interior do ser humano com suas atitudes exteriores! Na atualidade ninguém é punido pelas chamadas “autoridades eclesiásticas” por falar mal de outrem, pois este tipo de pecado não é “aparente”. Porém existem grandes e graves punições para aqueles que cometem os chamados “grandes pecados” como adultério, assassinato e roubo!
Entendemos que a “lepra” é então um sinal visível do pecado invisível e na grande maioria das vezes fica oculta sob outros sintomas físicos que atingem a vida de uma pessoa. Perceba que a maioria dos atingidos é de pessoas “crentes” que “temem ao Eterno” e que tem algum conhecimento de sua Palavra! Aos incrédulos as “punições” são muito mais intensas e menos sutis do que aos crentes!
Certamente entendemos que a manifestação da lepra – ou dos sintomas que a acompanham – deveriam gerar nas pessoas uma condição de reflexão sobre aquilo que fez – e o que disse também – para depois chegar a fazer teshuva – arrependimento – e finalmente fazer a reparação pedindo perdão para o próximo e também para o Eterno.
Podemos reparar que o caminho da “volta” é bem mais longo do que a “ida”, período este no qual externamos nossas “opiniões singelas e inocentes” acerca da vida de nosso próximo gerando então esta doença espiritual que tem manifestações físicas que fazem com que esta pessoa fique com sua pele marcada – e consequentemente visível à todos – e também com sua alma dilacerada pela culpa daquilo que disse e do mal que causou ao atingido pela lashon hara – maledicência. O retorno requer muito mais do que um simples pedido de “desculpas”; este processo começa com o isolamento de sete dias do culpado fora do acampamento! Isso significa que o Eterno deseja levar tal pessoa a uma reflexão de seus atos chegando assim à plenitude do arrependimento e podendo então dar início à sua cura e consequentemente à sua “volta” ao convívio social! Isso tudo é necessário por que o leproso não pode conviver com outras pessoas, pois ele poderá contaminar estas pessoas com a lepra que saiu de sua boca! Podemos chamar esta pessoa de “fofoqueiro” e tal postura certamente “contamina” aqueles que estão ao redor deste indivíduo! A fofoca além de contaminar, mata.
É interessante que neste caso a punição não vem de qualquer autoridade terrena; o próprio Eterno se encarrega de mostrar aquilo que está oculto, ou seja, Ele mesmo revela que o estado físico daquela pessoa aponta para algum problema espiritual que precisa ser resolvido! E, caso não haja teshuvá, esta pessoa poderá ter um agravamento desta doença que poderá lhe trazer ainda muitos outros males e consequências inimagináveis!
Mas, quando o corre a teshuvá, então após os sete dias é hora do início do processo de restauração!
O processo de restauração e retorno
“Depois falou o IHVH a Moshe, dizendo: esta será a lei do leproso no dia da sua purificação: será levado ao sacerdote, e o sacerdote sairá fora do acampamento, e o examinará, e eis que, se a praga da lepra do leproso for sarada, então o sacerdote ordenará que por aquele que se houver de purificar se tomem duas aves vivas e puras, e pau de cedro, e carmesim, e hissopo” (Lv 14:1-4).
Ser purificado – para o leproso – significava começar a vida de novo, e isto é uma figura do novo nascimento em Ieshua. Tal ato era precedido de sua apresentação ao sacerdote que o examinava e o declarava limpo e portanto apto para poder entrar novamente na presença do Eterno!
O leproso não se podia curar a si mesmo, nem se pronunciar limpo; nem tinha condições de ir procurar o ministro de D-us: o sacerdote é que tinha que ir ao seu encontro, fora do arraial. Quando acontecia a cerimônia de purificação era morto um pássaro e outro seria solto ainda vivo! O pássaro morto representava a necessidade de uma vida para recuperá-lo – alguém inocente deveria morrer para que o leproso pudesse ser sarado; já o pássaro vivo que se soltava representava sua própria vida – a do leproso – que se renovara no ato da purificação, mas não se “soltava” antes de ter sido molhado com o sangue do pássaro sacrificado. O cabelo cortado e raspado sugere o desembaraço das coisas antigas, para agora passar a uma vida nova, de liberdade. A unção simbolizava que a vida do leproso passara a estar aos cuidados do grande Médico.
As duas aves puras representam a aliança de D-us feita com o homem e confirmada em Ieshua! Estas aves deveriam ser “casher” não de espécies proibidas, pois as lepras veem como resultado de maledicência, que é um ato de falar demasiadamente mal, por isso foi necessário trazer a sua purificação os pássaros, que tagarelam continuamente através de seus pios.
Após isso feito, ao oitavo dia, seriam oferecidos três cordeiros ao Senhor juntamente com três medidas de flor de farinha com azeite! Os animais simbolizam as três áreas do homem que seriam restauradas: corpo, alma e espírito. Também as três medidas de flor de farinha nos falam sobre o melhor de nossas vidas – também nas três áreas citadas – que seriam oferecidas ao Eterno juntamente com azeite – que é símbolo da unção do Espírito! A vida sem “unção” não é recebida pelo Senhor!
No verso 11 temos outros detalhes importantes: “E o sacerdote que faz a purificação apresentará o homem que houver de purificar-se, com aquelas coisas, perante o IHVH, à porta da tenda da congregação” (Lv 14:11). O que merece destaque é que há uma necessidade de se apresentarem com tudo perante o Eterno (IHVH). Isso significa que o Eterno se tornaria para aquele homem justamente o que ele estaria precisando: purificação! Este encontro ocorreria à porta da tenda da congregação. A palavra “tenda” em hebraico é ohel e significa “tenda, habitação”. Já a palavra “congregação” em hebraico é mo´ed e significa “local determinado, tempo determinado, local de assembleia, festa designada”. Outra vez percebemos que o Eterno – Aquele que se torna aquilo que precisamos – marca com o homem um encontro em sua habitação que é o local determinado, no tempo determinado, a fim de ali realizar com ele – o pecador – uma festa, que é feita por causa da reconciliação entre D-us e o homem!
Após ter sido feito o sacrifício então novamente o sangue será posto sobre três lugares no corpo do ex-leproso. “E o sacerdote tomará do sangue da expiação da culpa, e o porá sobre a ponta da orelha direita daquele que tem de purificar-se e sobre o dedo polegar da sua mão direita, e no dedo polegar do seu pé direito” (Lv 14:14). As três áreas citadas representam:
- Sangue na orelha direita – aquilo que ele ouve seria purificado;
- Sangue no polegar da mão direita – aquilo que ele toca seria purificado;
- Sangue no dedão do pé direito – os lugares por onde ele anda seriam purificados.
A direita dá uma ideia de poder sendo transmitido (pela mão direita). Isso significa que o ex-leproso recebeu sobre todas as áreas de sua vida poder restaurador (redentor, dando a ele uma nova vida) que o capacita a retornar à vida de forma plena!
Vamos tentar imaginar a cena: o ex-leproso agora na porta a tenda da congregação diante de todos os israelitas, já teve todos os pelos e cabelos de seu corpo raspados – o que significa que esta pessoa torna-se como um recém-nascido – e agora recebe uma unção extraordinária: a mesma unção para a consagração do sacerdote! Isso nos mostra que esta pessoa que pecou e saiu para fora do arraial agora está sendo reintegrada e recebida dentro da comunidade com honras semelhantes àquelas dadas ao sacerdote no dia de sua unção e consagração! Agora, o ex-leproso é visto novamente como uma criatura restaurada, como alguém que após um período e sete dias arrependeu-se e agora pode voltar ao convívio de sues irmãos e familiares sem qualquer reserva. Ele agora é novamente um membro ativo da congregação de Israel. A Torah e a tradição nada dizem sobre isso, mas eu creio que esta pessoa era recebida com festa e havia muita alegria entre o povo, pois o irmão se se “perdera” por causa de suas palavras agora retorna com uma consciência restaurada e com uma postura que certamente evitará que ele cometa aquele pecado novamente!
Que o Eterno nos ajude a fazermos teshuva e novamente sermos reintegrados ao seu povo com festa e regozijo!
Mário Moreno.