O Mashiach e o Novo

Mário Moreno/ agosto 3, 2018/ Artigos

O Mashiach e o Novo

Refexão da Sedra No. 1

I – Introdução

No relato da criação, dois verbos chamam atenção no hebraico: assá e bará.

O primeiro verbo se refere ao ato de criar literalmente. Este é o verbo usado quando algo não existe, e passa a existir. Pode-se observar que este é o verbo usado bem no princípio da criação, para dizer que Elohim foi o criador dos céus e da terra:

“No princípio [bereshit] criou [bará] Elohim os céus e a terra” (Bereshit/Gênesis 1:1).

O segundo verbo que aparece também neste relato é o verbo “assá”, que é usado para se referir ao “ato de dar forma, moldar”. Este verbo se refere a algo que já existe, mas que ainda não tem forma (ou talvez tenha outra forma), e que portanto toma forma.

Esse é o verbo que é usado, por exemplo, quando Elohim formou uma separação entre as águas e a terra. As águas e a terra já existiam, mas Elohim lhes deu uma forma:

“E fez [vaya’as] Elohim a expansão, e fez separação entre as águas que estavam debaixo da expansão e as águas que estavam sobre a expansão; e assim foi” (Bereshit/Gênesis 1:7).

Há muitas coisas interessantes que se pode observar da diferença entre assá e bará. Por exemplo, muitos supõe que a Bíblia diga que as duas grandes meorot (luminárias) celestiais, sol e lua, tenham sido criadas após a terra. Na realidade, o relato diz que Elohim os “formou” como governantes do dia e da noite no quarto dia, o que pressupõe que eles já haviam sido criados. Enfim, há inúmeros ensinamentos a aprender sobre essa diferença entre assá e bará. Mas, uma delas, se revela a mais fundamental de todas.

II – A Revelação de Iochanan

Iochanan, emissário de Ieshua, ao narrar o princípio das boas novas, escolhe fazer uma espécie de midrash com o relato da criação. Ele começa o seu relato da seguinte forma:

“No princípio era a Palavra, e a própria Palavra estava com Elohim. E o próprio Elohim era a Palavra” (Iochanan/João 1:1)

Nem é preciso demonstrar que “bereshit” (no hebraico) repete-se aqui – como em Gn 1.1 – significando exatamente a mesma coisa.

Porém, a revelação de Iochanan surge justamente a partir daí. Iochanan menciona o princípio (“bereshit”) e menciona a Elohim. A diferença está no fato de que onde se esperava ter “bará”, temos o relato sobre a “ha Davar”, a Palavra de Elohim.

Palavra essa que Iochanan identifica como sendo o próprio Elohim – e o hebraico não deixa dúvidas nesse sentido – e que posteriormente se fez carne, sendo conhecida entre os homens na pessoa do Ungido Ieshua.

Iochanan associa o Ungido Ieshua com a própria manifestação de Elohim enquanto aquele que faz o que nenhum outro é capaz de fazer. Muitas forças existem no universo – tanto físicas quanto espirituais – capazes de “assá”, isto é, de dar forma, de mudar algo em outra coisa. Porém, só Elohim é capaz de “bará”, de criar algo que é completamente inexistente. E Ieshua é exatamente Elohim manifestando-se nessa condição.

III – David, e a Prática da Destruição

Isso é muito interessante do ponto de vista teológico, mas que sentido prático pode ser dado a essa afirmação? A resposta pode fazer uma grande diferença em nossa vida espiritual, e também no nosso dia-a-dia.

Em dado momento, David clamou ao Eterno na forma de uma tehilá (salmo), dizendo:

“Um coração puro cria [berá] em mim, ó Elohim…” (Tehilim/Salmos 51:10)

A própria introdução da tehilá (salmo) diz que esse foi composto quando Natan haNavi (o profeta Natan) veio a ele falar acerca de seu pecado com Bat-Sheva.

Entenda o clamor de David. De repente, ele se percebe um homicida e um adúltero. Lembre-se que o coração, nas Escrituras, não era o centro das emoções, e sim dos pensamentos e das intenções.

Como consertar os pensamentos e intenções de um adúltero homicida? De um homem que tinha tudo, mas que matou a sangue frio, para ficar com a esposa de outro homem. Se um governante fizesse isso nos dias de hoje, seria chamado – e com toda razão – de monstro. Ninguém em sã consciência suporia que tal pessoa seria capaz de ser regenerado.

E era exatamente isso que David afirmava. Não era possível reformar seu coração. Por isso, David usa o verbo “bará”. O seu coração estava contaminado até a essência e  precisava ser recriado. Ele clamava por um coração novo. Ele queria literalmente que Elohim o fizesse novamente, pois não havia esperança de mudança ou de reforma para ele.

Perceber a magnitude da oração de David, que era compatível certamente com o que ele fez, pode-se perceber também a magnitude do que o Ungido Ieshua veio fazer. Ieshua não veio reformar nossos corações. Ieshua é a resposta à oração de David, e de todo pecador degenerado: Ieshua veio nos dar, literalmente, corações novos, criados por Ele.

IV – Quando tudo se quebrou

Mas é importante ainda irmos mais fundo na prática, para entender a dimensão que isso pode tomar.

Quantas vezes olhamos para uma situação em nossas vidas e não vemos conserto, ou saída?

Olhamos para o que fizemos com nossas vidas, e dizemos: Não há mais o que fazer, pois destruída está de tal forma, que é impossível reformar, restaurar. Não dá mais para voltar atrás. Hábitos se cristalizaram de forma que nem a melhor das ciências seria capaz de nos mudar. Consequências se acumularam de forma que seria preciso dezenas, em alguns casos centenas de anos para sequer haver a chance de uma restauração ou mudança.

Gostaria, hoje, portanto, de te dizer que você tem total razão. Você não vai mudar. A sua vida não vai ser restaurada. Restaurar é impossível, e eu concordo plenamente que provavelmente você se vê diante de situações sem saída.

E é por isso que Elohim veio como um Criador daquilo que não existe, na figura do Ungido Ieshua. Ele não irá reformar a sua vida, e sim literalmente criar uma nova vida para você.

Ele não irá modificar o seu coração, como não modificou o coração de David. Ele trocou o coração de David por um novo coração, que Ele criou especialmente para substituir aquele que David havia destruído.

E é isso que Ieshua deseja fazer conosco: substituir aquilo que está destruído. Criar novas alternativas em nossas vidas. Alternativas que não enxergamos, justamente porque não são alternativas previamente existentes. São alternativas inesperadas, que Ele próprio criou (“bará”) para nós.

Será que estamos conscientes de sua missão? Pois a missão de Ieshua não é de restauração. Se fosse de restauração, poderíamos dizer: É mais fácil ou mais difícil recuperar esta vida, este coração, ou aquela situação. Mas ele não veio para restaurar, e sim para criar novamente. E o novo criar não é mais ou menos difícil de acordo com o grau de trevas que existe em nossas vidas, porque não há nenhuma ligação entre aquilo que está destruído, e aquilo que será novo em nossas vidas.

V – Conclusão

E, ao compreendermos essa maravilhosa missão de Ieshua, fica uma dúvida que tornaria toda esta reflexão vã e vazia se não fosse respondida: Como ter acesso a isto? A resposta é bem mais simples do que parece.

Ieshua nos diz: “Credes vós que eu possa fazer isto?” (Matitiyahu/Mateus 9:28)

Muitos tentam encontrar o poder de Ieshua, e até mesmo manipular esse poder. Não à toa, os movimentos carismáticos são tão populares. Porém, na maioria das vezes, são vãos e vazios para transformar a vida do homem. As Escrituras não nos mandam tentarmos manipular esse poder. A nós, compete buscá-Lo e andar em confiança nEle, e Ele fará o restante.

É preciso deixar de ver a Bíblia como um livro de histórias meramente inspiradoras, ou como uma fonte para aprender encantamentos e manipular o sobrenatural, e passe a enxergar na Bíblia uma instrução de como viver, e confie que Ele te conduzirá por um caminho desconhecido, porém maravilhoso: Um caminho que Ele criou (“bará”) especialmente para nos conduzir ao que Elohim tem para nós.

Adaptação: Mário Moreno.

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