Mário Moreno/ novembro 6, 2017/ Parasha da semana

Chaie Sarah

A vida de Sarah

(Gn 23.1 – 25.18 / I Rs 1:1-31 / Mt 1:1-17)

        Na Parasha desta semana estaremos falando sobre a morte de Sarah e consequentemente a nova etapa que Avraham tem de passar a fim de continuar sua caminhada com o Eterno.

Esta seção tem início com um triste relato: a morte de Sarah! “E foi a vida de Sarah cento e vinte e sete anos; estes foram os anos da vida de Sarah. E morreu Sarah em Quiriate-Arba, que é Hebrom, na terra de Canaã; e veio Avraham lamentar Sarah e chorar por ela” (Gn 23:1-2). A vida de Sarah agora havia chegado ao fim! Após cento e vinte e sete anos de caminhada com o Eterno e com seu marido Avraham, agora Sarah chega ao fim de sua existência. Este fato que nos é narrado nos fala da vida de uma mulher que foi totalmente transformada pelo Eterno! A mulher que havia sido concebida como “minha princesa” – significado do nome Sarai – havia sido transformada numa “princesa” – significado do nome Sarah – e isso fez muita diferença, não somente em sua vida, mas também na vida de Avraham e de todos aqueles que os conheciam. Quando o Eterno muda o nome de uma pessoa, Ele também realiza uma profunda mudança interior, de caráter, de personalidade, de atitudes, de posturas. Nós nos lembramos também que Sarai era uma mulher estéril, e isso era considerado no oriente como uma maldição – mas já com Sarah as coisas mudam! O Eterno muda a vida desta mulher de tal forma que ela é transformada interiormente – em seu corpo físico – a ponto de conceber uma criança aos noventa anos de idade! A restauração feita pelo Senhor foi tão grande e tão perfeita que todos os órgãos interiores de Sarah devem ter sido renovados, pois ela necessitava disso a fim de suportar uma gestação segura e tranquila!

É neste contexto que o livro de Gênesis relata a morte desta mulher que mudou a história do povo de Israel, pois foi justamente dela – outrora uma mulher estéril – que milagrosamente o Eterno fez conceber e dar à luz ao filho da promessa: Isaque! Por isso o relato nos informa que Sarah morreu em Quiriate-Arba que é Hebrom – que em hebraico significa União. É aqui que ela se une ao seu D-us e Senhor na consumação de sua vida terrena! Nada mais há para acrescentar à sua vida. A reação de Avraham e dos seus é previsível e compreensível: “e veio Avraham lamentar Sarah e chorar por ela”. Não havia outra coisa a ser feita, pois para Avraham a sua “princesa” partira e ele fora deixado só, sem a companhia daquela que ele tanto amara e por quem tanto lutara! Só resta o pranto daqueles que a amavam e que agora externavam todo o seu amor e carinho por Sarah lamentando e chorando por aquela mulher exemplar e mãe da nação de Israel.

Avraham procura os residentes da região onde se encontrava a fim de comprar-lhes um local para sepultar Sarah. “Depois se levantou Avraham de diante de sua morta, e falou aos filhos de Hete, dizendo: Estrangeiro e peregrino sou entre vós; dai-me possessão de sepultura convosco, para que eu sepulte a minha morta de diante da minha face” (Gn 23:3-4). Em sua palavra aos heteus, Avraham lhes diz duas coisas muito importantes: ele se auto-denomina “estrangeiro”, em hebraico ger e esta palavra significa “peregrino”. A palavra refere-se a alguém que não desfrutava dos direitos que geralmente o residente possuía. Mas ele também diz ser “peregrino”, em hebraico tôshab, significando “peregrino”. Esta palavra refere-se ao assalariado temporário e sem terra. Em seu relato Avraham diz a eles que não possui os direitos legais nesta terra porque sua passagem por ali é temporária! É justamente por isso que ele precisou comprar um local a fim de enterrar ali Sarah.

Versículo 23:4

Peregrino e morador sou eu entre vós.

O VIAJANTE

Dentre os seguidores de Rabi Israel Báal Shem Tov, fundador do movimento chassídico, havia um judeu que cuidava da terra num pequeno vilarejo rural perto de Mezeritch. O fundador do chassidismo tinha uma empatia especial por estes simples judeus do campo, a quem tinha em alta conta pela sua integridade, honestidade e inequívoca fé em D’us. Assim, sempre que o aldeão mencionado ia passar um Shabat com seu Rebe, tinha uma recepção calorosa e cheia de afeição.

Ao final de uma destas visitas, o Báal Shem Tov pediu-lhe: “Por favor, ao voltar para casa, pare em Mezeritch. Gostaria que levasse minhas recomendações a um de meus mais queridos e notáveis seguidores, o erudito e piedoso Rabi Dovber.”

O aldeão ficou encantado em poder ser útil a seu querido Rebe. Assim que chegou a Mezeritch começou a procurar o grande Rabi Dovber, mas ninguém parecia saber de “o grande Rabi Dovber” entre os eruditos e místicos da cidade. Finalmente, alguém sugeriu que tentasse um certo Reb Ber, um professor empobrecido que vivia nos arredores da cidade.

O aldeão foi levado à uma rua sem saída na parte mais pobre do lugar. Ao longo de ambos os lados da rua esburacada e cheia de lama, havia fileira após fileira de casebres, encostados um no outro para apoio. Lá encontrou a casa do professor, um velho e desmantelado barraco com painéis quebrados ocupando a maior parte de suas minúsculas janelas.

Lá dentro, uma cena de pobreza de cortar o coração feriu seus olhos: um homem de meia-idade sentava-se sobre blocos de madeira, a uma ‘mesa’ que consistia de um prancha grosseira colocada sobre outros blocos de madeira. À sua frente, sentavam-se fileiras de crianças do Chêder em ‘bancos escolares’ – também uma montagem engenhosa de blocos e pranchas. Mas a majestosa face do professor não deixou dúvida na mente do aldeão que de fato encontrara o homem que estava procurando.

Rabi Dovber saudou seu visitante calorosamente e pediu-lhe perdão – talvez quisesse voltar mais tarde, quando tivesse terminado de ensinar os alunos?

Quando o aldeão voltou naquela noite, a ‘mobília’ do barracão transformado em sala de aula havia desaparecido: as pranchas e blocos tinham sido rearrumados como ‘camas’ para o professor. Rabi Dovber sentava-se sobre o único bloco remanescente, imerso em um livro que segurava nas mãos. Rabi Dovber agradeceu ao hóspede por trazer-lhe notícias do Rebe e convidou-o a sentar-se, apontando para uma mesa transformada em cama ali perto.

Nesta altura, o aldeão não pôde mais se conter; ultrajado pela pobreza esmagadora, explodiu: “Rabi Dovber, que posso dizer? Como consegue viver desta forma? Estou longe de ser rico, mas pelo menos em minha casa existem, graças a D’us, as necessidades básicas: algumas cadeiras, uma mesa, camas para as crianças…”

“Verdade?”, disse Rabi Dovber, “Mas por que não estou vendo sua mobília?

Como consegue ficar sem ela?”

“O que quer dizer? Acha que ando por aí arrastando meus móveis comigo para onde vou? Ouça, enquanto viajo, arranjo-me com aquilo que está à mão. Mas em casa – no lar de uma pessoa, é inteiramente diferente!”

“Mas não somos todos viajantes neste mundo?” disse Rabi Dovber gentilmente.

“Em casa? Ah, sim… em casa, é um problema totalmente diferente…”

O fato em si não parece ser muito importante, pois Avraham está apenas comprando uma sepultura para sua mulher, mas não é assim que o Eterno vê as coisas! Avraham estava através deste ato tomando posse da terra pela qual ele caminhara anteriormente, terra esta que havia sido prometida a ele pelo Senhor como sua possessão! Agora o Senhor estava estabelecendo um marco legal naquela terra, pois Avraham compra a terra que D-us lhe prometera e sela a promessa do Eterno para si e para sua família! Avraham faz algo que chamamos de “ato profético”, pois o que ele fez naquele momento mostrava algo ainda maior que aconteceria no futuro!

         Os filhos de hete falam assim a Avraham: “E responderam os filhos de Hete a Avraham, dizendo-lhe: Ouve-nos, meu senhor; príncipe de Elohim és no meio de nós; enterra a tua morta na mais escolhida de nossas sepulturas; nenhum de nós te vedará a sua sepultura, para enterrar a tua morta” (Gn 23:5-6). O que eles declaram aqui? Eles chamam a Avraham de “príncipe de Elohim”, em hebraico “nasik Elohim” e isso significa que eles reconhecem que Avraham é um príncipe do D-us Criador dos céus e da terra. Aqueles homens sabiam quem era o D-us de Avraham, pois certamente viram aquilo que estava sendo feito pelo Eterno na vida de Avraham e de sua família! Por isso os heteus reconheciam publicamente a posição de Avraham, que pouco antes havia declarado sobre si mesmo ser um estrangeiro sem direitos numa terra estranha! Estes homens não vêem Avraham desta forma! Eles realmente reconhecem quem ele é e a quem ele serve!

Avraham tem uma atitude natural de quem está em meio a um povo estranho como peregrino. “Então Avraham se inclinou diante da face do povo da terra” (Gn 23:12). Apesar do reconhecimento dos filhos de hete quanto à condição de Avraham, ele inclina-se em sinal de humildade e diz os heteus aquele lugar que lhe agrada a fim de sepultar Sarah.

A sepultura comprada por Avraham foi a de Efrom e que lhe custou quatrocentos siclos de prata. Esse valor eqüivaleria ao peso de 46,5 Kg em prata! “Meu senhor, ouve-me, a terra é de quatrocentos siclos de prata; que é isto entre mim e ti? Sepulta a tua morta” (Gn 23:15).

A definição deu-se com o pesar do dinheiro e o pagamento da quantia solicitada pelos naturais da terra. Então Avraham pode enterrar ali sua morta, conforme está escrito: “E depois sepultou Avraham a Sarah sua mulher na cova do campo de Macpela, em frente de Manre, que é Hebrom, na terra de Canaã” (Gn 23:19).

Certa vez perguntei a um rabino em nossa yeshivá local se ele fizera quaisquer planos para a aposentadoria. Respondeu-me sucintamente: “Pretendo me aposentar quando D’us me aposentar. Até lá, não tenho planos de aposentadoria.”

Pensei sobre aquela conversa ao estudar a Porção Semanal da Torah. A Torah nos diz que Avraham era velho, avançado em anos (Bereshit 24:1).

Literalmente, a Torah usa o termo que Avraham era “entrado em dias.”

Os comentaristas interpretam isso como significando que Avraham era capaz de fazer cada dia de sua vida ter um significado, mesmo em idade avançada. Além disso, ele podia se lembrar daquilo que conseguiu em cada um dos dias de sua vida, pois cada um deles foi um dia de conquistas; e mesmo quando envelheceu, sua paixão pelas boas ações não arrefeceu. Ainda conseguia encontrar energia e sabedoria para trazer um significado à sua existência cotidiana.

As consistentes conquistas de Avraham durante sua longa vida, apesar das vicissitudes do tempo e da adversidade que teve de enfrentar, fornece um modelo a cada um de nós.

Ao envelhecermos, não precisamos nos tornar menos produtivos, ou ficar mais lentos intelectual ou espiritualmente, nem temos de nos acostumar a dias inúteis e atividades improdutivas. Tendo Avraham como fonte de inspiração, podemos tornar estes últimos, os dias de ouro de nossa vida.

Agora a preocupação de Avraham será outra: ele já está em idade avançada e quer ver seu filho Isaque casar-se com uma mulher que lhe seja dada pelo D-us Eterno! “E era Avraham já velho e adiantado em idade, e o IHVH havia abençoado a Avraham em tudo” (Gn 24:1). O que a Escritura nos diz aqui? Ela nos informa que Avraham era velho. A palavra em hebraico é zaquen e significa velho, ancião, idoso. Mas também somos informados de que o Eterno – IHVH – havia abençoado, em hebraico barak, que significa, dar poder para alguém ser próspero, bem-sucedido e fecundo. Avraham em sua idade avançada poderia olhar para seu passado e também para seu presente e dizer que Aquele que se torna aquilo que ele precisa o havia feito ser próspero, bem sucedido e fecundo em todas as áreas de sua vida. Isso demonstra-nos que por causa da profunda relação de amor e amizade entre Avraham e o Eterno, Ele o havia abençoado! Mas não nos esqueçamos de que a base para receber-se qualquer coisa do Senhor é a obediência! Foi justamente neste aspecto que Avraham foi provado e aprovado pelo Senhor e foi justamente por isso que o Senhor fez a Avraham aquilo que fez.

Agora ele quer ver com seus próprios olhos outra bênção do Senhor para sua vida: a felicidade de Isaque. Por isso ele chama seu servo – seu homem de confiança – e lhe dá instruções de como agir neste caso: “E disse Avraham ao seu servo, o mais velho da casa, que tinha o governo sobre tudo o que possuía: Põe agora a tua mão debaixo da minha coxa, para que eu te faça jurar pelo Senhor D-us dos céus e D-us da terra, que não tomarás para meu filho mulher das filhas dos cananeus, no meio dos quais eu habito. Mas que irás à minha terra e à minha parentela, e dali tomarás mulher para meu filho Isaque” (Gn 24:2-4). Este homem tinha um alto grau de relacionamento com Avraham e também uma alta estima por seu senhor, por isso ele o ouve atentamente em suas recomendações. Quando Avraham lhe diz: “Põe agora a tua mão debaixo da minha coxa” a palavra traduzida por “debaixo” é tahat e significa “debaixo de, abaixo”. Mas a palavra traduzida por “coxa” é yarek e significa “coxa, lombo”. Ela significa o local onde o homem gera a sua descendência, ou seja, o seu órgão genital! Ela é usada de forma figurada a fim de indicar o órgão genital masculino. Mas o que Avraham estava fazendo na realidade? Que estranho pedido era esse que ele fazia ao seu servo? Devemos entender isso de acordo com a mentalidade oriental para não nos “escandalizarmos” com o que Avraham pediu ao seu servo. O órgão genital masculino era usado a fim de gerar a vida numa relação conjugal. Quando o Senhor ordena que seja feita a circuncisão no órgão genital masculino, seu objetivo é o de fazer uma aliança com a vida! E é justamente isso o que Avraham está pedindo ao seu servo: que ele faça uma aliança com ele (Avraham) – através da vida que ele gerara – de que ele não buscaria uma esposa para Isaque dentre os filhos dos cananeus, que eram um povo estranho e trariam aos hebreus uma mistura em sua raça. Isso certamente atrapalharia os planos do eterno de suscitar o Messias da descendência de Avraham! Por isso ele tem todo este cuidado quanto ao casamento de Isaque.

A continuidade da conversa entre Avraham e seu servo nos diz o quanto ele estava preocupado com este fato: “Para que eu te faça jurar pelo IHVH Elohim dos céus e Elohim da terra, que não tomarás para meu filho mulher das filhas dos cananeus, no meio dos quais eu habito” (Gn 24:3). O ato descrito acima é seguido de um juramento. A palavra jurar é shaba e significa “jurar, conjurar, comprometer-se por juramento“. E Avraham interpõe entre ele e seu servo o Senhor D-us. Aqui temos noção da importância do que ele diz quando vemos que usou as palavras IHVH Elohim. Você poderia perguntar: mas o que isso significa? Significa que Avraham colocou Aquele que se tornara o que ele precisou que é também o Criador do Universo como a testemunha de que seu servo haveria de cumprir o que prometera a Avraham em relação à esposa para seu filho Isaque. Com isso, Avraham tencionava resguardar-se de que nada haveria de acontecer a fim de impedir que os propósitos de D-us se cumprissem na vida de seus descendentes. A esposa de Isaque deveria ser de sua parentela, ou seja, deveria ser descendente física de Avraham!

Avraham e seu servo agora falam sobre o que poderia acontecer nesta jornada: “E disse-lhe o servo: Se porventura não quiser seguir-me a mulher a esta terra, farei, pois, tornar o teu filho à terra donde saíste? E Avraham lhe disse: Guarda-te, que não faças lá tornar o meu filho. O IHVH Elohim dos céus, que me tomou da casa de meu pai e da terra da minha parentela, e que me falou, e que me jurou, dizendo: À tua descendência darei esta terra; ele enviará o seu anjo adiante da tua face, para que tomes mulher de lá para meu filho. Se a mulher, porém, não quiser seguir-te, serás livre deste meu juramento; somente não faças lá tornar a meu filho” (Gn 24:5-8). O servo de Avraham argumenta logicamente, pois sabe que sua jornada poderá ser infrutífera. Porém a resposta de Avraham é categórica e externa (declara) aquilo que ele crê que acontecerá: “O IHVH Elohim dos céus, que me tomou da casa de meu pai e da terra da minha parentela, e que me falou, e que me jurou, dizendo: À tua descendência darei esta terra; ele enviará o seu anjo adiante da tua face, para que tomes mulher de lá para meu filho”. Avraham crê que o Eterno já estava providenciando tudo para seu servo e a sua visita à parentela de Avraham fora precedida por um anjo que haveria de preparar a circunstância de tal forma que tudo seria encaminhado conforme Avraham crera e declarara!

Após dadas as instruções e esclarecidas as dúvidas sobre a viagem a ser realizada, então cumpre-se o ritual de “por-se a mão debaixo da coxa” conforme explicado anteriormente.

Agora o servo de Avraham sai em sua jornada em busca da esposa para Isaque. “E o servo tomou dez camelos, dos camelos do seu senhor, e partiu, pois que todos os bens de seu senhor estavam em sua mão, e levantou-se e partiu para Mesopotâmia, para a cidade de Naor. E fez ajoelhar os camelos fora da cidade, junto a um poço de água, pela tarde, ao tempo que as moças saíam a tirar água. E disse: Ó IHVH, Elohim de meu senhor Avraham, dá-me hoje bom encontro, e faze beneficência ao meu senhor Avraham! Eis que eu estou em pé junto à fonte de água e as filhas dos homens desta cidade saem para tirar água; seja, pois, que a donzela, a quem eu disser: Abaixa agora o teu cântaro para que eu beba; e ela disser: Bebe, e também darei de beber aos teus camelos; esta seja a quem designaste ao teu servo Isaque, e que eu conheça nisso que usaste de benevolência com meu senhor” (Gn 24:10-14). Neste texto percebemos o que realmente aconteceu: aquele homem que há tanto tempo caminhara com Avraham havia também recebido de seu senhor uma outra influência: a fé no Eterno! Ele reconhece quem é o Senhor e solicita que venha d’Ele a revelação e a resolução de um problema que nenhum homem poderá em tempo algum fazer de forma completa: escolher para si uma esposa que lhe seja idônea e que o faça feliz! Somente Um conhece o coração do homem a fim de determinar quem é melhor para quem! Este homem ao orar declara sua inteira dependência do Eterno em sua jornada e em sua escolha e ainda mais: ele pede que o Eterno faça “beneficência” para com seu senhor Avraham. A palavra “beneficência” em hebraico é hesed e significa “bondade, bondade amorosa, misericórdia”. Nós percebemos que o que aquele homem pediu para seu senhor foi algo plausível de ser atendido pelo eterno, pois este homem conhecia o nível de relacionamento entre o Eterno e Avraham e agora pede que o eterno tenha para com Avraham bondade amorosa! Ele sabia o quanto era importante para Avraham que Isaque se casasse com a mulher certa e que fosse plenamente feliz!

Além disso, aquele homem pede ao Eterno que uma determinada situação sirva como um “sinal” de que ele estaria diante da pessoa certa para Isaque. Ele fica então num local estratégico – o poço onde as moças iam retirar água para suas casas – e ali espera por uma resposta do D-us de Avraham!

Certamente aquele homem não esperava que o Eterno agisse tão rapidamente em resposta à sua oração, mas foi assim que sucedeu! “E sucedeu que, antes que ele acabasse de falar, eis que Rivca, que havia nascido a Betuel, filho de Milca, mulher de Naor, irmão de Avraham, saía com o seu cântaro sobre o seu ombro. E a donzela era mui formosa à vista, virgem, a quem homem não havia conhecido; e desceu à fonte, e encheu o seu cântaro e subiu. Então o servo correu-lhe ao encontro, e disse: Peço-te, deixa-me beber um pouco de água do teu cântaro. E ela disse: Bebe, meu senhor. E apressou-se e abaixou o seu cântaro sobre a sua mão e deu-lhe de beber. E, acabando ela de lhe dar de beber, disse: Tirarei também água para os teus camelos, até que acabem de beber. E apressou-se, e despejou o seu cântaro no bebedouro, e correu outra vez ao poço para tirar água, e tirou para todos os seus camelos. E o homem estava admirado de vê-la, calando-se, para saber se o IHVH havia prosperado a sua jornada ou não” (Gn 24:15-21). Parece impressionante, mas foi isso justamente o que o Senhor fez, pois aparece em cena Rivca , que em hebraico significa corda com laço. Essa moça tinha algumas características que a faziam destacar-se: era muito bonita e virgem. A palavra “virgem” em hebraico é betûlâ, e significa “virgem, jovem, moça”. Isso nos dá idéia de que Rivca era muito bela porém ainda uma jovem. Para efeito de comparação poderíamos dizer que Rivca era uma jovem que nesta época deveria ter entre dezoito e vinte e poucos anos! Quando o servo de Avraham a vê e pede a ela água, ele fica realmente muito espantado com a resposta dela: ela fala e faz justamente aquilo que ele havia pedido como um sinal de que aquela seria a esposa para Isaque! Ele aguarda até que tudo esteja plenamente consumado e espera “E o homem estava admirado de vê-la, calando-se, para saber se o IHVH havia prosperado a sua jornada ou não”. A palavra aqui que define o Eterno é o tetragrama. E isso significa que Aquele que se tornara aquilo que necessitamos estava agora se tornando para o servo de Avraham a solução de seu problema e pondo fim à sua busca!

Agora vem o momento da revelação, quando aquele homem aproxima-se de Rivca a fim de dizer-lhe o que ele fazia ali: “E aconteceu que, acabando os camelos de beber, tomou o homem um pendente de ouro de meio siclo de peso, e duas pulseiras para as suas mãos, do peso de dez siclos de ouro; e disse: De quem és filha? Faze-mo saber, peço-te. Há também em casa de teu pai lugar para nós pousarmos? E ela lhe disse: Eu sou a filha de Betuel, filho de Milca, o qual ela deu a Naor. Disse-lhe mais: Também temos palha e muito pasto, e lugar para passar a noite. Então inclinou-se aquele homem e adorou ao Senhor, e disse: Bendito seja o IHVH Elohim de meu senhor Avraham, que não retirou a sua benevolência e a sua verdade de meu senhor; quanto a mim, o Senhor me guiou no caminho à casa dos irmãos de meu senhor” (Gn 24:22-27). Quando ele revela a Rivca o propósito de sua ida àquele lugar e lhe pergunta sobre sua parentela e também sobre a possibilidade de passar a noite juntamente com seus animais na casa de seus pais, ela rapidamente fala que isso é possível. Então ele reage assim: “Então inclinou-se aquele homem e adorou ao IHVH”. A palavra “inclinar-se” é shahal e significa “inclinar-se, ajoelhar-se”, e a palavra que define o Eterno é o tetragrama! Novamente o servo de Avraham reconhece que Aquele que se tornara a solução de sua busca merecia todo o crédito e a adoração pelo que havia acontecido até então! Sua busca terminara com sucesso, graças à interferência do Eterno D-us de Israel!

Então acontece agora que Rivca volta à sua casa e diz aos seus o que lhe sucedera, e sua família fica surpresa e quer conhecer aquele homem e saber mais sobre o acontecido. Então o servo de Avraham vai à casa de Naor, conta-lhes a história que motivou sua ida até ali e então a família reconhece que este fato veio do Senhor para ajuntar as famílias e abençoa-los mutuamente através do casamento de Isaque e Rivca.

Agora chega a hora de consultar a Rivca quanto à tudo o que acontecera: “E chamaram a Rivca, e disseram-lhe: Irás tu com este homem? Ela respondeu: Irei. Então despediram a Rivca, sua irmã, e sua ama, e o servo de Avraham, e seus homens. E abençoaram a Rivca, e disseram-lhe: Ó nossa irmã, sê tu a mãe de milhares de milhares, e que a tua descendência possua a porta de seus aborrecedores! (Gn 24:58-60). Agora Rivca fala de seu desejo de ir com o servo de Avraham a fim de conhecer seu marido e seus familiares enviam-na à seu novo lar debaixo de bênçãos e palavras proféticas que também determinariam o futuro de seus filhos! Quando eles abençoam-na, aqui eles utilizaram a palavra barak, que significa “dar poder para alguém ser próspero, bem sucedido e fecundo”! A palavra com a qual eles abençoaram-na fala que a descendência de Rivca – a sua zerá – ‘descendência física”, haveria de possuir a porta de seus inimigos. Isso significa que os seus descendentes poderiam reivindicar a possessão ou herança daqueles que os aborrecessem. A palavra “aborrecer” em hebraico é sane e quer dizer “odiar, ser odioso”. Exprime uma atitude emocional diante de pessoas ou coisas que são combatidas, detestadas, desprezadas e com os quais não se deseja ter nenhum contato ou relacionamento. Isso nos mostra que a palavra profética que foi liberada para Rivca era extremamente positiva e realmente traria no futuro sobre a vida dela inúmeras bênçãos, inclusive o milagre da cura da esterilidade!

Finalmente a partida de Rivca com suas moças e o tão esperado momento do encontro com Isaque aproximam-se! “E Rivca se levantou com as suas moças, e subiram sobre os camelos, e seguiram o homem; e tomou aquele servo a Rivca, e partiu. Ora, Isaque vinha de onde se vem do poço de Beer-Laai-Rói; porque habitava na terra do sul. E Isaque saíra a orar no campo, à tarde; e levantou os seus olhos, e olhou, e eis que os camelos vinham” (Gn 24:61-63). Enquanto o servo de Avraham juntamente com Rivca e suas moças iam a caminho de casa, Isaque estava no campo, orando, buscando comunhão com o Eterno, e ele certamente pedia ao Senhor que Ele pudesse estar dirigindo toda a situação a fim de que sua esposa pudesse estar já a caminho de seus braços! Foi num destes momentos que Isaque levanta os olhos e vê a proximidade do servo de Avraham juntamente com suas acompanhantes e vai ao seu encontro a fim de recebê-los. “Rivca também levantou seus olhos, e viu a Isaque, e desceu do camelo. E disse ao servo: Quem é aquele homem que vem pelo campo ao nosso encontro? E o servo disse: Este é meu senhor. Então tomou ela o véu e cobriu-se. E o servo contou a Isaque todas as coisas que fizera. E Isaque trouxe-a para a tenda de sua mãe Sarah, e tomou a Rivca, e foi-lhe por mulher, e amou-a. Assim Isaque foi consolado depois da morte de sua mãe” (Gn 24:64-67).

Há agora o tão esperado encontro, e quando Isaque se aproxima, Rivca cobre-se com seu véu e finalmente vê seu marido e é vista por ele. Então, após um breve relato da viagem, Isaque e Rivca vão para a tenda de sua mãe Sarah e ali casam-se. A casamento foi a consumação da união física entre os dois. Não houveram as “formalidades” legais ou certidões, mas somente a união entre dois corpos que realmente caracterizou o matrimônio de Isaque e Rivca! Para Isaque, seu casamento com Rivca foi um verdadeiro bálsamo, pois através de sua esposa sua alma fora curada pela perda de sua mãe Sarah. Isso nos mostra que além da união entre duas pessoas, o casamento é muito mais, pois o projeto do Eterno é que haja uma inteira e total integração entre o casal que, havendo necessidades em ambos de cura, essa será efetuada pela atuação do Senhor na vida do cônjuge através de seu par.

Após a consumação do casamento de Isaque, a Escritura nos informa novamente sobre Avraham: “E Avraham tomou outra mulher; e o seu nome era Quetura; e deu-lhe à luz Zinrã, Jocsã, Medã, Midiã, Jisbaque e Suá. E Jocsã gerou Seba e Dedã; e os filhos de Dedã foram Assurim, Letusim e Leumim. E os filhos de Midiã foram Efá, Efer, Enoque, Abida e Elda. Estes todos foram filhos de Quetura. Porém Avraham deu tudo o que tinha a Isaque; mas aos filhos das concubinas que Avraham tinha, deu Avraham presentes e, vivendo ele ainda, despediu-os do seu filho Isaque, enviando-os ao oriente, para a terra oriental. Estes, pois, são os dias dos anos da vida de Avraham, que viveu cento e setenta e cinco anos” (Gn 25:1-7). Isto nos parece de certa forma até exagerado, mas Avraham mesmo em sua velhice e após a morte de Sarah toma para si outra mulher, a qual lhe dá outros filhos, e entre eles temos Midiã, que os estudiosos creem ser o pai dos midianitas que aparecerão mais tarde nas Escrituras e serão ferrenhos inimigos de Israel! Não nos parece estranho que um dos filhos de Avraham venha a tornar-se inimigo mortal da própria descendência de Avraham?

Nós às vezes nos questionamos o porque dessas coisas acontecerem. Vemos na atitude de Avraham uma aberta preferência por Isaque – a quem ele dá todas as suas posses – em detrimento dos outros filhos que recebem apenas presentes e são enviados para o oriente com sua mãe. Ao final desta narrativa vemos que Avraham viveu um total de cento e setenta e cinco anos! Espantoso que alguém tenha tido uma vida tão longa e tão produtiva diante do Eterno a ponto de cumprir realmente os propósitos do Senhor e poder morrer em paz.

Agora a Escritura nos declara que Avraham morre. Aqui acontece algo espantoso: “E Avraham expirou, morrendo em boa velhice, velho e farto de dias; e foi congregado ao seu povo; e Isaque e Ismael, seus filhos, sepultaram-no na cova de Macpela, no campo de Efrom, filho de Zoar, heteu, que estava em frente de Manre, o campo que Avraham comprara aos filhos de Hete. Ali está sepultado Avraham e Sarah, sua mulher. E aconteceu depois da morte de Avraham, que D-us abençoou a Isaque seu filho; e habitava Isaque junto ao poço Beer-Laai-Rói” (Gn 25:8-11). Neste relato encontramos novamente juntos Ismael e Isaque! Após Ismael ter sido enviado com sua mãe para o deserto, nada mais é dito sobre ele. Agora, repentinamente, Ismael reaparece junto de Isaque no funeral de Avraham! Isso significa que, mesmo distante do pai, Ismael mantinha algum tipo de contato e recebia informações sobre Avraham de forma que, quando lhe fora dito que Avraham morrera, ele imediatamente viera para o funeral!

A Escritura nos fala que “E aconteceu depois da morte de Avraham, que Elohim abençoou a Isaque seu filho”. A palavra que define o Eterno é Elohim, o D’us Criador e a palavra “abençoar” é barak! Isso significa que o Criador deu poder a Isaque para ser próspero, bem-sucedido e fecundo! A mesma unção que estava sobre Avraham agora repousa sobre seu filho Isaque!

Terminamos com o relato sobre a descendência de Ismael: “Estas, porém, são as gerações de Ismael filho de Avraham, que a serva de Sarah, Agar, egípcia, deu a Avraham. E estes são os nomes dos filhos de Ismael, pelos seus nomes, segundo as suas gerações: O primogênito de Ismael era Nebaiote, depois Quedar, Adbeel e Mibsão, Misma, Dumá, Massá, Hadade, Tema, Jetur, Nafis e Quedemá. Estes são os filhos de Ismael, e estes são os seus nomes pelas suas vilas e pelos seus castelos; doze príncipes segundo as suas famílias. E estes são os anos da vida de Ismael, cento e trinta e sete anos, e ele expirou e, morrendo, foi congregado ao seu povo. E habitaram desde Havilá até Sur, que está em frente do Egito, como quem vai para a Assíria; e fez o seu assento diante da face de todos os seus irmãos” (Gn 25:12-18).

Ismael, que é o pai das nações árabes, morre com cento e trinta e sete anos e deixa atrás de si os descendentes que levariam à cabo uma saga de ódio e de lutas contra Isaque e seus descendentes!

Há ainda uma promessa de que os filhos de Israel “possuirão a porta de seus aborrecedores”. Que o Eterno leve à cabo de forma plena esta promessa feita a seus filhos de forma a aniquilar todo o poder que se levanta contra Israel!

Mário Moreno.