Mário Moreno/ outubro 30, 2017/ Parasha da semana

Vayera

Aparece-lhe

Gn 18.1 – 22.24 / II Rs 4:1-37 / Lc 1:26-38;24:36-53

A Torah, no início da porção desta semana, descreve com riqueza de detalhes como Avraham, quando visitado por três hóspedes, demonstrou enorme solicitude em servi-los e cuidar deles. Avraham “apressou-se a ir à tenda de Sarah,” para que ela pudesse preparar pão fresco, ele “correu até o rebanho” para preparar as melhores iguarias, e então “ficou de pé, perto deles, debaixo da árvore”, enquanto comiam na sombra, assegurando-se de que cada necessidade lhes fosse fornecida (Bereshit 18:6-8).

Rabeinu Bachya destaca que, embora Avraham fosse um homem idoso e estivesse fraco por causa da circuncisão que fizera apenas três dias antes, e apesar de ter muitos servos que poderiam ter atendido os hóspedes, em sinal de respeito Avraham fez tudo sozinho, com grande zelo e entusiasmo.

Ao final da porção da Torah há uma outra situação, na qual Avraham demonstra seu caráter zeloso. Na manhã em que Avraham levantou-se para realizar a akeidá, o sacrifício, a Torah relata que “ele se levantou cedo” para cumprir a mitsvá. Nesta difícil situação, quando Avraham recebeu ordem de levar o filho amado, pelo qual esperara ansiosamente por tantos anos, como uma oferenda, poder-se-ia pensar que a última coisa que a pessoa faria fosse acordar cedo para embarcar nesta missão! Mesmo assim, vemos que Avraham o fez. Como é possível?

Uma vez mais, temos um exemplo da personificação de Avraham da qualidade de ser zeloso, rápido e entusiasta em cumprir as mitsvot, preceitos, de D’us.

Avraham desenvolveu este traço a tal ponto que, mesmo nesta situação difícil e extremamente penosa, ainda foi capaz de superar o desejo natural de protelar, chegando mesmo a levantar-se cedo para fazer a vontade de D’us.

Isso nos ensina uma lição inacreditável, que justamente quando a situação é desconfortável, ainda temos a capacidade de cumprir uma mitsvá com zelo e entusiasmo, e especialmente quando a mitsvá não é tão difícil.

Há um conceito bem conhecido na dinâmica humana conhecido como inércia – tendência natural da pessoa de tentar permanecer tão inativa quanto possível. Esta tendência intensifica-se quando se trata de cumprir mitsvot, porque há um freio natural, a má inclinação, que fará todo o possível para impedir que a pessoa faça uma ação que lhe possibilitará uma recompensa no Mundo Vindouro. Com isto em mente, temos uma pergunta: Como a pessoa adquire a característica de Avraham? Como subrepuja sua indolência natural para atingir a grandeza?

Há duas maneiras de fazer isso: Rabi Moshê Chaim Luzzatto explica que podemos fazê-lo, concentrando-nos em todas as coisas que D’us realiza para nós, pois se pudermos reconhecer todo o bem que Ele nos concede, e as enormes maravilhas que realiza desde o dia em que nascemos até nossos últimos, sem dúvida nos apressaremos em fazer o possível para retribuir, com toda nossa capacidade, cumprindo a Torah e exaltando Seu nome.

A segunda maneira, diz Chafetz Chaim, é reconhecer a importância de cada minuto. Sabemos que cada palavra da Torah que a pessoa estuda é uma mitsvá por si mesma. Se a pessoa fala à velocidade normal, seriam aproximadamente duzentas palavras por minuto, portanto, se a pessoa fala sobre a Torah por um minuto, realiza duzentas mitsvot de uma só vez. Agora pense: se a pessoa estuda por quinze minutos, cumpre três mil mitsvot! Se aprender por uma hora, faz doze mil mitsvot! E se a pessoa estuda o dia inteiro? Que tal alguns dias? Todas as mitsvot vão se somando, e quanto mais mitsvot cumpre, mais recompensa recebe. Dentro de pouco tempo, terá a capacidade de cumprir milhões!

É através deste reconhecimento que adquirimos o desejo de utilizar cada momento da maneira mais completa, seja estudando Torah, ajudando o próximo.

Porém, precisamos de uma presteza e zelo especiais para nos assegurar de que corremos para fazê-las, e ao mesmo tempo buscando a certeza de que são cumpridas adequadamente.

A ideia de valorizar cada momento foi explicada numa parábola por rabi Moshe Yitschac Hadarshan. Imagine se todos aqueles que estão no cemitério recebessem outra meia-hora de vida, para conseguir tanta recompensa celestial quanto lhes fosse possível. Veríamos pessoas correndo para lá e para cá, estudando Torah, visitando os doentes, rezando, consolando os enlutados e fazendo caridade, cada pessoa de acordo com sua habilidade. E se essas pessoas recebessem algumas horas de vida, ou mesmo alguns dias? Não tentariam utilizar o tempo para cumprir tantas mitsvot quanto lhes fosse possível? E quanto a nós – quem de nós sabe quanto tempo ainda lhe resta?

É bem como disse o Chafetz Chaim certa vez: “A vida é como um cartão postal. Quando iniciamos uma viagem, escrevemos em letras grandes e espalhadas. Mas quando vemos que o espaço para escrever no cartão está acabando e ainda há tanto a dizer, começamos a escrever em letras cada vez menores, espremendo as palavras onde quer que haja um cantinho.”

Ocorre o mesmo com nosso cumprimento de mitsvot; não somos tão cuidadosos sobre fazer todo o possível porque achamos que há muito tempo à disposição.

Mas com o passar da vida, percebemos como o tempo é escasso na verdade, e tentamos espremer tantas mitsvot quantas pudermos. Entretanto, se percebermos agora o valor do tempo, podemos utilizá-lo ao máximo de nossa capacidade.

Por isso, quando estivermos em casa, prazerosamente lendo um livro ou qualquer outra coisa que preferiríamos não interromper, devemos refletir novamente naqueles métodos de incrementar o cumprimento da mitsvá. Devemos nos lembrar como D’us é bom para nós, e o quanto devemos realizar para retribuir pelo menos uma fração disso. Devemos ter em mente a importância e valor de cada minuto e de cada mitsvá. Por fim, devemos considerar que não importa o desafio que seja o cumprimento de uma mitsvá, é um desafio maior que o foi para Avraham levar seu filho ao sacrifício?

Com este reconhecimento, que possamos merecer a realização de mais preceitos, elevando desta maneira nossa recompensa, tanto neste mundo como no Mundo Vindouro.

Nesta Porção da Torah estaremos falando sobre a destruição de Sodoma e Gomorra, além do nascimento de Itshaq, bem como das promessas feitas pelo Eterno a fim de confirmar seu desejo de tornar Abrão o pai da nação judaica. Veremos como o Eterno, através de milagres desencadeia um processo irreversível de enormes bênçãos sobre a vida de seu povo.

O Eterno começa manifestando-se a Avraham assim: “Depois apareceu-lhe o IHVH nos carvalhais de Manre, estando ele assentado à porta da tenda, no calor do dia” (Gn 18:1). Parece que nada há de importante nestas palavras, mas no hebraico a palavra que define o Eterno é o tetragrama – (IHVH)! Isso significa que o Eterno estava se manifestando a Avraham como aquele que “se torna aquilo que ele (Avraham) precisa”! Há um outro aspecto muito interessante aqui: o Senhor demonstra um cuidado e um carinho muito especiais por Avraham, pois via até a sua tenda (casa) a fim de visitá-lo! Isso seria, no mínimo uma grande honra, se não uma grande surpresa, pois o D-us de Israel materializou-se a fim de ir à casa de seu servo para dar-lhe pessoalmente uma palavra que mudaria por completo sua vida!

Às vezes pensamos que o Senhor está nos céus e não se importa conosco, e que estas coisas aconteciam somente nos tempos bíblicos com aqueles “grandes” homens de D-us! Mas quantas vezes somos literalmente visitados por anjos e pelo próprio Senhor e não o reconhecemos! Sem falar dos livramentos que recebemos dele sem termos a consciência de seu cuidado e carinho por nós ainda hoje!

Versículo 18:1

E Elohim revelou-Se a ele” (Avraham).

AS LÁGRIMAS DE UMA CRIANÇA

Quando Rabi Sholom Dovber de Lubavitch era uma criança de quatro ou cinco anos, entrou no quarto de seu avô, Rabi Menachem Mendel, e explodiu em lágrimas. Seu professor no Chêder havia ensinado o versículo “E D’us revelou-Se a Avraham…”.

“Por que,” soluçou o menino, “D’us não Se revela a mim?!”

Rabi Menachem Mendel replicou: “Quando um judeu, um tsadic, percebe, com a idade de 99 anos, que deve circuncidar a si mesmo, que deve aperfeiçoar-se, é merecedor de que D’us Se revele para ele.”

        Quando Avraham levanta seus olhos, ele vê três homens chegando à sua tenda. Ele imediatamente os reconhece, vai até eles, inclina-se e lhes diz: “E disse: Meu Senhor, se agora tenho achado graça aos teus olhos, rogo-te que não passes de teu servo” (Gn 18:3). Novamente aqui há uma inequívoca evidência de que Avraham sabia com quem estava falando, pois a palavra traduzida por “Senhor” aqui é Adonai, que significa “o Senhor de todas as coisas”. Avraham sabia que um daqueles homens em especial era o Senhor seu D-us! Além dos costumes orientais de receber-se bem aos visitantes, havia algo de muito especial naqueles homens que estavam visitando a Avraham! Por essa razão Avraham apressa-se em colocá-los à vontade e em servir-lhes água e comida, conforme o costume local.

No decorrer da conversa entre eles, Avraham recebe uma notícia maravilhosa da parte do Eterno: “E disseram-lhe: Onde está Sarah, tua mulher? E ele disse: Ei-la aí na tenda. E disse: Certamente tornarei a ti por este tempo da vida; e eis que Sarah tua mulher terá um filho. E Sarah escutava à porta da tenda, que estava atrás dele. E eram Avraham e Sarah já velhos, e adiantados em idade; já a Sarah havia cessado o costume das mulheres” (Gn 18:9-11). Parece que a palavra trazida pelo Senhor trouxe um impacto tão grande sobre eles, pois inclusive sua situação física em nada os ajudava. Como nos informa a Escritura, em Sarah já “havia cessado o costume das mulheres”. A palavra costume vem do hebraico orah e significa caminho, vereda. Tal palavra demonstra que há um caminho natural no desenvolvimento físico de uma mulher e nos informa que Sarah já o havia percorrido! Ou seja, agora o seu corpo físico entrara num estágio de degradação natural, um processo irreversível no qual, humanamente falando, a concepção já não era mais possível.

Versículo 18:19

Porque o conheci, e sei que ordenará a seus filhos e à sua casa depois dele, a fim de que guardem o caminho do Eterno, para fazer caridade e justiça”.

“Assim como é obrigatório a cada judeu, do mais notável erudito até o homem mais simples, colocar tefilin todos os dias, do mesmo modo há um dever inequívoco que paira sobre todo indivíduo: o de separar meia hora todos os dias para pensar sobre a educação de seus filhos.” (Rabi Sholom Dovber de Lubavitch)

EDUCAÇÃO

Rabi Yossef Yitschac de Lubavitch relatou certa vez:

“Em Rosh Hashaná de 5649, quando eu contava sete anos e vários meses, visitei minha avó e ela deu-me um melão. Saí até o quintal e sentei com meus amigos em um banco exatamente em frente à janela de meu pai, e dividi o melão com os meninos.

“Papai chamou-me e disse: ‘Percebi que você de fato compartilhou o melão com seus amigos, mas não o fez de todo o coração.’  Explicou-me então longamente a idéia de um ‘olho generoso’ e de um ‘olho maldoso’.

“Fui tão profundamente afetado pelas palavras de meu pai que fui incapaz de me recobrar por meia hora. Chorei amargamente e vomitei o melão que havia comido.

“‘O que deseja do menino?’, perguntou minha mãe.

“Papai replicou: ‘É bom assim. Agora esta qualidade ficará gravada em seu caráter.’ ”

Concluiu Rabi Yossef Yitschac: “Isto é educação.”

Imaginemos a situação daquela família: Avraham, um homem cujo coração e fé agradavam em muito ao Eterno juntamente com sua esposa Sarah já haviam recebido d’Ele uma promessa de que deles o Eterno geraria uma grande nação que mudaria o curso da história da humanidade. Mas algumas vezes as palavras nada significam, pois elas contrastam com a situação real de cada um de nós, gerando naqueles que a recebem um certo mal-estar, pois a realidade é diferente daquilo que está sendo ministrado, e isso traz um grande conflito àquele que ouve e recebe este tipo de palavra. Assim foi com Avraham e Sarah. E agora, Sarah ouve esta palavra e tem uma reação normal à isso: “Assim, pois, riu-se Sarah consigo, dizendo: Terei ainda deleite depois de haver envelhecido, sendo também o meu senhor já velho?” (Gn 18:12). Sarah ri daquilo que houve e em seu íntimo pergunta-se: “Terei ainda deleite depois de haver envelhecido, sendo também o meu senhor já velho?” A palavra aqui traduzida por “deleite” é ‘eden e significa roupas vistosas, jóias vistosas, coisas caras. Sarah está dizendo o seguinte: “teria eu ainda prazer no contato físico com meu marido como no passado já tive, pois isso me foi tão maravilhoso, caro e precioso e agora eu não tenho mais. Seria isso possível ainda para nós?”

O Senhor, conhecedor de todas as coisas ouve o íntimo do coração de Sarah e diz: “E disse o Senhor a Avraham: Por que se riu Sarah, dizendo: Na verdade darei eu à luz ainda, havendo já envelhecido? Haveria coisa alguma difícil ao IHVH? Ao tempo determinado tornarei a ti por este tempo da vida, e Sarah terá um filho” (Gn 18:13-14). Novamente o Eterno se apresenta à eles como “Eu me torno aquilo que me torno”, ou seja, o Único que é capaz de tornar-se a solução para o problema imediato que eles estão vivendo! Se eles precisavam de um filho, ali estava o Criador pronto à satisfazer sua necessidade, dando-lhes um filho! A pergunta do Senhor é incisiva: “Haveria coisa alguma difícil ao IHVH?” O Senhor confronta Avraham em sua fé dizendo-lhe: “Você me reconheceu e me honrou como o Senhor; como podem vocês agora duvidarem de meu poder em reverter qualquer tipo de situação em sua vida?” Não seria isso uma incoerência, visto que Avraham e sua família os receberam em sua casa, e sabiam que algo de extraordinário aconteceria?

Agora eles partem da casa de Avraham rumo à Sodoma e Gomorra. Segue-se então um diálogo, no mínimo interessante: “E disse o IHVH: Ocultarei eu a Avraham o que faço, visto que Avraham certamente virá a ser uma grande e poderosa nação, e nele serão benditas todas as nações da terra? Porque eu o tenho conhecido, e sei que ele há de ordenar a seus filhos e à sua casa depois dele, para que guardem o caminho do IHVH, para agir com justiça e juízo; para que o Senhor faça vir sobre Avraham o que acerca dele tem falado. Disse mais o IHVH: Porquanto o clamor de Sodoma e Gomorra se tem multiplicado, e porquanto o seu pecado se tem agravado muito, descerei agora, e verei se com efeito têm praticado segundo o seu clamor, que é vindo até mim; e se não, sabê-lo-ei” (Gn 18:17-21).

Primeiro, vem a pergunta: “Ocultarei eu a Avraham o que faço”. Isso indica o grau de intimidade e de confiança que havia entre eles uma intimidade e uma confiança muito grande, a tal ponto do Senhor fazer essa pergunta. E foi justamente essa intimidade – e certamente a retidão do coração de Avraham – que fizeram com que o Eterno dissesse sobre ele que ele (Avraham) seria “uma grande e poderosa nação”. Esta palavra em hebraico nos dá uma outra dimensão daquilo que o Eterno realmente disse: a palavra poderosa é atson e significa ser forte, ser poderoso, ser grande, ser numeroso. Em seguida temos a palavra nação que vem traduzida do termo goy e significa nação gentílica. O que significa isso então: o Senhor já estava apontando para um desdobramento de sua promessa que, além de beneficiar o povo de Israel, alcançaria também as nações chamadas gentílicas e de tal forma que se tornaria “uma grande e poderosa nação”.  Ora, a quem mais poderia se referir essa promessa a não ser à Noiva do Senhor? Se olharmos para os fatos de forma imparcial veremos o seguinte: Israel nunca foi uma grande nação – numericamente falando – e essa promessa nunca cumpriu-se, pelo menos até agora! Veremos também que no livro de Romanos, no capítulo 11, Sha´ul nos fala sobre uma obra de ajuntamento feita pelo Eterno entre Israel e os gentios: “…E se alguns dos ramos foram quebrados, e tu, sendo zambujeiro, foste enxertado em lugar deles, e feito participante da raiz e da seiva da oliveira, não te glories contra os ramos; e, se contra eles te gloriares, não és tu que sustentas a raiz, mas a raiz a ti. Dirás, pois: Os ramos foram quebrados, para que eu fosse enxertado” (Rm 11.17-19). É clara a relação estabelecida entre Israel e os gentios aqui! A partir de então os gentios e Israel tornam-se um e passam a formar um grande e poderoso povo que ama, louva, bendiz, busca e espera no D-us de Israel! Este povo nós o conhecemos como a “Noiva”.

Uma outra promessa que se cumpre aqui é que em Avraham “serão benditas todas as nações da terra”. Isso é maravilhoso, pois nos fala que por causa de Avraham – e de seus descendentes – as nações (goy) da terra seriam benditas. A palavra benditas em hebraico é barak, e significa dar poder a alguém para ser próspero, bem sucedido e fecundo! Então o que a Escritura está nos dizendo? Ela nos diz que, por causa dos descendentes de Avraham espalhados por toda a terra as nações gentílicas recebem poder para serem prósperas, bem sucedidas e fecundas, pois essa foi a promessa do Eterno à Avraham e nada pode anular ou cancelar aquilo que já foi dito por Ele!

Já havia da parte do Eterno um prévio conhecimento de que Avraham transmitiria aos seus descendentes tudo aquilo que havia aprendido com Ele, para assim, perpetuar sua fé e obediência aos mandamentos do Senhor. Está escrito assim: “Porque eu o tenho conhecido, e sei que ele há de ordenar a seus filhos e à sua casa depois dele, para que guardem o caminho do IHVH, para agir com justiça e juízo; para que o Senhor faça vir sobre Avraham o que acerca dele tem falado” (Gn 18:19). Novamente aqui há o destaque para a relação de interdependência entre o Senhor e Avraham! Isso parece incrível – que D-us dependa de um homem para qualquer coisa – mas foi isso o que aconteceu! O Senhor dependia da obediência de Avraham para levar adiante seu projeto com Israel e com o mundo.

Foi baseado nesta profunda relação de interdependência que o Senhor falou a Avraham o que aconteceria com Sodoma e Gomorra: “Disse mais o IHVH: Porquanto o clamor de Sodoma e Gomorra se tem multiplicado, e porquanto o seu pecado se tem agravado muito, descerei agora, e verei se com efeito têm praticado segundo o seu clamor, que é vindo até mim; e se não, sabê-lo-ei” (Gn 18:20-21). O que estava acontecendo de tão grave aqui? Devemos considerar que o Eterno aqui se apresenta com seu nome – IHVH – e isso nos fala que Ele se torna aquilo que é necessário para alguém. No caso de Sodoma e Gomorra, sua necessidade era o juízo, pois suas atitudes (pecados) já haviam excedido em número e grau de tal forma que o Senhor agora decide tomar providências contra estas cidades. Havia também um clamor feito contra ela. Essa palavra vem de zaak que significa clamor, grito. O sentido básico é “gritar por socorro em tempo de aflição”.

Apesar da iniquidade que imperava na cidade, havia um clamor de alguém que chegou até o Senhor por causa do peso do pecado, e isso desperta no Eterno um profundo interesse em verificar e julgar esta causa!

Quando isso é comunicado a Avraham, dá-se um diálogo deveras interessante entre o Senhor e Avraham: “E chegou-se Avraham, dizendo: Destruirás também o justo com o ímpio? Se porventura houver cinqüenta justos na cidade, destruirás também, e não pouparás o lugar por causa dos cinqüenta justos que estão dentro dela? Longe de ti que faças tal coisa, que mates o justo com o ímpio; que o justo seja como o ímpio, longe de ti. Não faria justiça o Juiz de toda a terra? Então disse o IHVH: Se eu em Sodoma achar cinqüenta justos dentro da cidade, pouparei a todo o lugar por amor deles. E respondeu Avraham dizendo: Eis que agora me atrevi a falar ao IHVH, ainda que sou pó e cinza. Se porventura de cinqüenta justos faltarem cinco, destruirás por aqueles cinco toda a cidade? E disse: Não a destruirei, se eu achar ali quarenta e cinco. E continuou ainda a falar-lhe, e disse: Se porventura se acharem ali quarenta? E disse: Não o farei por amor dos quarenta. Disse mais: Ora, não se ire o IHVH, se eu ainda falar: Se porventura se acharem ali trinta? E disse: Não o farei se achar ali trinta. E disse: Eis que agora me atrevi a falar ao IHVH: Se porventura se acharem ali vinte? E disse: Não a destruirei por amor dos vinte. Disse mais: Ora, não se ire o IHVH, que ainda só mais esta vez falo: Se porventura se acharem ali dez? E disse: Não a destruirei por amor dos dez. E retirou-se o IHVH, quando acabou de falar a Avraham; e Avraham tornou-se ao seu lugar” (Gn 18:23-33). Ao fim deste diálogo, fica estabelecido que se houverem, pelo menos, dez justos nestas cidades, a destruição não ocorreria. Mas nós sabemos que não haviam nem mesmo dez justos ali e por isso e juízo do Eterno foi inevitável contra eles!

O juízo contou com a misericórdia do Senhor, que enviou dois anjos a fim de retirarem Lot e sua família daquela cidade. “E vieram os dois anjos a Sodoma à tarde, e estava Lot assentado à porta de Sodoma; e vendo-os Lot, levantou-se ao seu encontro e inclinou-se com o rosto à terra; e disse: Eis agora, meus senhores, entrai, peço-vos, em casa de vosso servo, e passai nela a noite, e lavai os vossos pés; e de madrugada vos levantareis e ireis vosso caminho. E eles disseram: Não, antes na rua passaremos a noite. E porfiou com eles muito, e vieram com ele, e entraram em sua casa; e fez-lhes banquete, e cozeu bolos sem levedura, e comeram” (Gn 19:1-3). Lot, como era o costume local, estava assentado à porta da cidade, e quando viu estes dois homens chegando, certamente notou algo de diferente neles, pois ele adianta-se e convida-os para irem à sua casa! Certamente muitas pessoas iam e vinham aquelas cidades! Muitos passavam por suas portas a fim de negociarem, visitarem pessoas, procurarem por seus interesses, etc… mas Lot justamente olhou para aqueles dois homens e viu neles algo de diferente a fim de convidá-los para irem à sua casa. Estes “homens” eram na realidade anjos que haviam sido enviados justamente para livrar Lot e sua família da morte! Quando eles finalmente concordam em ir para lá são recebidos com toda a hospitalidade oriental e são tratados como pessoas importantes naquele lar. Então algo de diferente acontece: “E antes que se deitassem, cercaram a casa, os homens daquela cidade, os homens de Sodoma, desde o moço até ao velho; todo o povo de todos os bairros. E chamaram a Lot, e disseram-lhe: Onde estão os homens que a ti vieram nesta noite? Traze-os fora a nós, para que os conheçamos” (Gn 19:4-5).

O interessante é que vieram pessoas de toda a cidade e de todas as idades a fim de verem os estranhos que estavam hospedados na casa de Lot. Houve um frenesi tal que a notícia rapidamente se espalhou. Eles foram notados de tal forma que os homens os queriam para si! O texto diz: “Traze-os fora a nós, para que os conheçamos”. Aqui a palavra conhecer é yada e significa saber, conhecer. Pode designar também a relação sexual por parte tanto do homem quanto da mulher. Aqui é usada para descrever a perversão sexual conhecida como sodomia. Na realidade os que aqueles homens de toda a cidade queriam era realmente ter um contato físico – sexual – com os anjos que estavam na casa de Lot! Isso nos parece tão absurdo que beira à loucura! Notemos que os homens vieram de todos os lugares a fim de possuí-los! A notícia de que haviam chegado a casa de Lot homens diferentes se espalhou e gerou um interesse tão grande que todos os homens vieram a fim de participarem deste “evento”.

Esta atitude é também relatada por Sha´ul, quando ele nos informa: “Porque dos céus se manifesta a ira de Elohim sobre toda a impiedade e injustiça dos homens, que detêm a verdade em injustiça. Porquanto o que de Elohim se pode conhecer neles se manifesta, porque Elohim lho manifestou. Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se vêem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis; porquanto, tendo conhecido a Elohim, não o glorificaram como Elohim, nem lhe deram graças, antes em seus discursos se desvaneceram, e o seu coração insensato se obscureceu. Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos. E mudaram a glória do Elohim incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, e de aves, e de quadrúpedes, e de répteis. Por isso também Elohim os entregou às concupiscências de seus corações, à imundícia, para desonrarem seus corpos entre si; pois mudaram a verdade de Elohim em mentira, e honraram e serviram mais a criatura do que o Criador, que é bendito eternamente. Amém. Por isso D-us os abandonou às paixões infames. Porque até as suas mulheres mudaram o uso natural, no contrário à natureza. E, semelhantemente, também os homens, deixando o uso natural da mulher, se inflamaram em sua sensualidade uns para com os outros, homens com homens, cometendo torpeza e recebendo em si mesmos a recompensa que convinha ao seu erro. E, como eles não se importaram de ter conhecimento de Elohim, assim Elohim os entregou a um sentimento perverso, para fazerem coisas que não convêm; estando cheios de toda a iniquidade, prostituição, malícia, avareza, maldade; cheios de inveja, homicídio, contenda, engano, malignidade; sendo murmuradores, detratores, aborrecedores de D-us, injuriadores, soberbos, presunçosos, inventores de males, desobedientes aos pais e às mães; néscios, infiéis nos contratos, sem afeição natural, irreconciliáveis, sem misericórdia; os quais, conhecendo a justiça de Elohim (que são dignos de morte os que tais coisas praticam), não somente as fazem, mas também consentem aos que as fazem” (Rm 1:18-32). A descrição de Sha´ul neste texto nos fala exatamente aquilo que estava acontecendo naquela cidade com Lot e seus convidados! Houve uma tentativa da parte daqueles homens de possuírem e praticarem sexo com os anjos que eram os hóspedes de Lot! Literalmente, aquela cidade estava entregue à suas paixões e perversões, pois o Eterno através disso traria um terrível juízo sobre todos os seus habitantes!

O episódio termina então com uma discussão entre os habitantes da cidade e Lot, que tenta proteger seus hóspedes: “E disse: Meus irmãos, rogo-vos que não façais mal; eis aqui, duas filhas tenho, que ainda não conheceram homens; fora vo-las trarei, e fareis delas como bom for aos vossos olhos; somente nada façais a estes homens, porque por isso vieram à sombra do meu telhado. Eles, porém, disseram: Sai daí. Disseram mais: Como estrangeiro este indivíduo veio aqui habitar, e quereria ser juiz em tudo? Agora te faremos mais mal a ti do que a eles. E arremessaram-se sobre o homem, sobre Lot, e aproximaram-se para arrombar a porta.  Aqueles homens porém estenderam as suas mãos e fizeram entrar a Lot consigo na casa, e fecharam a porta” (Gn 19:7-10).

Como escapar desta terrível situação? É justamente aqui que entra em cena aquilo que nos está dito no livro de Salmos: “O anjo do IHVH acampa-se ao redor dos que o temem, e os livra” (Sl 34:7). Ali estava, de forma palpável, cumprindo-se a Palavra do Altíssimo a fim de proteger Lot e sua família, pois os anjos do Senhor agora entrariam em ação! E foi o que aconteceu. “E feriram de cegueira os homens que estavam à porta da casa, desde o menor até ao maior, de maneira que se cansaram para achar a porta” (Gn 19:11). A palavra traduzida por “feriram” é nakâ e significa golpear, ferir, bater, atingir. A palavra é usada no sentido de atingir  ou ferir algo ou alguém de forma não fatal. Aqueles anjos atingiram aos homens daquela cidade com cegueira física (pois a espiritual já era evidente), fazendo com que não conseguissem encontrar a porta da casa de Lot que estava diante deles!

Agora, aqueles homens dizem à Lot e aos seus o motivo de sua ida àquela cidade e alertam: “Porque nós vamos destruir este lugar, porque o seu clamor tem aumentado diante da face do IHVH, e o IHVH nos enviou a destruí-lo” (Gn 19:13). O que eles estão dizendo a Lot é que havia um clamor que chegara à presença do Eterno. A palavra clamor é tsa’aq e significa gritar, chamar por socorro, chamar. Essa raiz significa “clamar por ajuda” (por estar muito aflito). Agora certamente Lot entendeu que suas orações chegaram à presença do Eterno e aqueles homens eram a sua resposta! Certamente inúmeras vezes Lot clamou por socorro por causa da impiedade daquela cidade e de seus habitantes, e agora lá estavam dois anjos, enviados pelo Senhor a fim de destruírem a cidade por causa de seus pecados. A palavra traduzida por “Senhor” é o tetragrama! Isso significa que aqui o Senhor se tornaria em juízo para cidade, pois esta era a sua necessidade iminente!

Após a estupenda revelação feita a Lot e sua família, segue-se o conselho para que fujam dali, pois o tempo está acabando! “E ao amanhecer os anjos apertaram com Lot, dizendo: Levanta-te, toma tua mulher e tuas duas filhas que aqui estão, para que não pereças na injustiça desta cidade. Ele, porém, demorava-se, e aqueles homens lhe pegaram pela mão, e pela mão de sua mulher e de suas duas filhas, sendo-lhe o Senhor misericordioso, e tiraram-no, e puseram-no fora da cidade. E aconteceu que, tirando-os fora, disse: Escapa-te por tua vida; não olhes para trás de ti, e não pares em toda esta campina; escapa lá para o monte, para que não pereças. E Lot disse-lhe: Ora, não, meu Senhor!” (Gn 19:15-18). Novamente percebemos a misericórdia do Eterno para com os que o temem, assim como a urgência do tempo em que se encontravam, pois muito em breve viria a destruição total sobre a cidade e o Senhor os queria poupar disso!

        O conselho dos anjos ainda vale para nós hoje: “Escapa-te por tua vida; não olhes para trás de ti”. Lot não deveria olhara para trás nem pensar naquilo que ficou! Certamente ele já tinha uma vida estabelecida, negócios, amizades, etc… Mas o Senhor o chama – de forma urgente – a fim de abandonar tudo isso rapidamente a fim de não morrerem juntamente com aquela cidade. Nós também somos chamados pelo Senhor – de forma urgente – a fim de não perecermos juntamente com o mundo e abandonarmos tudo o que se refere ao nosso passado, pois certamente se obedecermos ao Senhor teremos toda a nossa vida reconstruída pelo próprio Senhor, mas agora de forma a exaltar Seu nome!

O próximo passo foi a destruição total das cidades: “Então o IHVH fez chover enxofre e fogo, do IHVH desde os céus, sobre Sodoma e Gomorra; e destruiu aquelas cidades e toda aquela campina, e todos os moradores daquelas cidades, e o que nascia da terra” (Gn 19:24-25). O que a Escritura nos diz aqui? A palavraque define o Eterno é o tetragrama: IHVH e significa que o Senhor se tornaria para aqueles homens aquilo que eles tanto necessitavam: o juízo! E foi justamente isso o que aconteceu! Do alto – isto é, dos céus – veio o juízo da parte do D-us Eterno a fim de punir aquelas pessoas que nada queriam saber sobre D-us!

Outro fato estarrecedor é aquilo que sobreveio à mulher de Lot: “E a mulher de Lot olhou para trás e ficou convertida numa estátua de sal” (Gn 19:26). Quando da visita dos anjos à casa de Lot, já havia sido dada uma ordem que estabelecia a forma como eles deveriam agir: não olhem para trás! O que causou tal punição sobre a mulher de Lot? Certamente foi a sua desobediência! Nós nem mesmo sabemos o nome desta mulher; sabemos apenas que ela, através de sua desobediência recebeu a paga e transformou-se numa estátua de sal! Todos os desobedientes recebem o pagamento por suas atitudes! Cedo ou tarde o que lhes é devido os alcança! Mas o seu pecado foi só o de olhar para trás? Não nos parece que foi somente isso! A palavra olhar em hebraico é nabat e significa olhar, contemplar. O que nos parece é que houve um momento em que ela parou, voltou-se e contemplou o que estava acontecendo àquelas cidades. Isso nos dá ideia de que houve tempo para pensar em tudo o que ela tinha ali, em seu passado, em seus bens, em suas amizades e todo este conjunto de coisas deve ter-lhe pesado no coração. Não parece que havia gratidão ao Eterno por lhe ter – até ali – poupado sua vida. O que deve ter dominado aquele coração devem ter sido outros sentimentos, e justamente por causa disso o Eterno trouxe sobre ela seu juízo!

Este foi mais um fato marcante na vida de Lot, que agora torna-se viúvo com duas filhas órfãs de mãe! Agora há apenas o que restou desta família! Suas filhas não poderão mais levar adiante a preservação do nome de seu pai, pois são os filhos homens que perpetuam o nome de qualquer família e Lot não pode mais ter filhos homens, pois lhe falta sua esposa. Então acontece um fato que nos choca: as filhas de Lot deitam-se com seu próprio pai a fim de “perpetuarem” o nome da família! “Vem, demos de beber vinho a nosso pai, e deitemo-nos com ele, para que em vida conservemos a descendência de nosso pai” (Gn 19:32). Aqui houve um plano deliberado para que tudo acontecesse! Quando uma das filhas propõe que se “deitem” com ele, ela utiliza-se da palavra shakab, deitar-se. Este verbo aparece na maioria das vezes com o sentido de “ter relações sexuais”. Vem da palavra shekobet que significa “cópula”. Ou seja: elas planejaram que manteriam relações sexuais com seu pai a fim de engravidarem dele e conservarem a descendência do pai. Este, como todo ato impensado e errôneo, causou – e ainda causa – muitos problemas para o povo de Israel. Desta união abominável nascem Moabe e Amom, dois dos grandes inimigos de Israel em toda a sua história! Essas moças quiseram “ajudar” ao Eterno valendo-se de padrões e métodos que aprenderam em Sodoma e Gomorra, e que resultaram em grandes problemas futuros ao povo de Israel.

Após estes fatos, vem o nascimento de Itshaq, que já havia sido prometido e que agora torna-se realidade! “E o IHVH visitou a Sarah, como tinha dito; e fez o Senhor a Sarah como tinha prometido” (Gn 21:1). A palavra traduzida por Senhor é o tetragrama! Aqui o Eterno torna-se para Sarah justamente aquilo que ela mais necessita: a bênção de ser mãe! A Escritura nos diz que IHVH visitou a Sarah.  A palavra visitar em hebraico é paqad e significa  computar, calcular, visitar. Isso significa que, quando chegou o tempo determinado – computado, calculado – pelo Senhor ele dá a Sarah justamente aquilo que lhe havia prometido: o Riso (Itshaq)! A comprovação disso está no verso 2: “E concebeu Sarah, e deu a Avraham um filho na sua velhice, ao tempo determinado, que D-us lhe tinha falado” (Gn 21:2).

Após o nascimento de Itshaq, vem então a obediência devida ao Eterno: “E Avraham circuncidou o seu filho Itshaq, quando era da idade de oito dias, como Elohim lhe tinha ordenado” (Gn 21:4). A circuncisão havia sido instituída como um sinal visível do pacto do Senhor com seu povo. Isso havia sido uma ordem que agora tinha seu pleno cumprimento através da atitude de Avraham. A palavra ordenar em hebraico é tsawâ e significa ordenar, incumbir. A raiz designa a instrução de um pai para um filho, de um fazendeiro a seus lavradores, de um rei a seus servos. Isso reflete uma sociedade firmemente estruturada em que as pessoas tinham de prestar contas à D-us pelo direito de mandar. Tudo aquilo que D-us havia dado a Avraham Ele agora cobra-lhe em forma de obediência! O fruto da obediência é sempre a bênção do Eterno! Agora, o Eterno dá a esta família o riso incontido por causa do resultado da bênção que é derramada sobre a família!

Após o grande momento de júbilo, novamente vem o equilíbrio da via cotidiana e novamente uma decisão a ser tomada: “E disse a Avraham: Ponha fora esta serva e o seu filho; porque o filho desta serva não herdará com Itshaq, meu filho. E pareceu esta palavra muito má aos olhos de Avraham, por causa de seu filho. Porém Elohim disse a Avraham: Não te pareça mal aos teus olhos acerca do moço e acerca da tua serva; em tudo o que Sarah te diz, ouve a sua voz; porque em Itshaq será chamada a tua descendência. Mas também do filho desta serva farei uma nação, porquanto é tua descendência. Então se levantou Avraham pela manhã de madrugada, e tomou pão e um odre de água e os deu a Agar, pondo-os sobre o seu ombro; também lhe deu o menino e despediu-a; e ela partiu, andando errante no deserto de Berseba” (Gn 21:10-14). Vejamos então o que aconteceu: Sarah reclama o direito de herança de seu filho para com as bênçãos prometidas a Avraham. A palavra herança (ou herdar) é yarash e significa tomar posse, desalojar, herdar. Trata-se da herança física a ser recebida por Itshaq. Sarah sabia que se Ismael não fosse afastado do convívio da família muitos males sobreviriam. Isso fez Avraham ser impactado por essa palavra, mas o próprio D-us lhe aconselha a agir assim e lhe promete: “Não te pareça mal aos teus olhos acerca do moço e acerca da tua serva; em tudo o que Sarah te diz, ouve a sua voz; porque em Itshaq será chamada a tua descendência”. O Senhor afirma a Avraham que irá chamar, convocar sua descendência física através de Itshaq! Não há o que discutir: Itshaq é o filho da promessa pois ele fora prometido pelos lábios do Criador à Avraham e Sarah! Outra coisa que o Senhor diz a Avraham é: “Mas também do filho desta serva farei uma nação, porquanto é tua descendência”. Quando o Senhor diz que fará de Ismael uma nação ele usa a palavra goy, que significa nação gentílica. Os descendentes de Ismael são até hoje os “primos” dos judeus e são também o maior problema que Israel enfrenta desde então até a atualidade.

O interessante é notarmos que Avraham despede Hagar e Ismael para o deserto. Deserto em hebraico é midbar e pode descrever três tipos de terreno em geral:

  • Pastagens
  • Terra não habitada
  • Áreas extensas em que oásis ou cidades e vilarejos existem aqui e ali.

O local para onde Hagar e Ismael foram enviados foi a Segunda opção. Eles foram para uma terra não habitada, lugar de ninguém. Parece irônico, mas a maioria dos povos árabes habita em desertos…

A diferença entre os judeus e os árabes aparece logo aqui: “E habitou no deserto de Parã; e sua mãe tomou-lhe mulher da terra do Egito” (Gn 21:21). A esposa de Ismael foi escolhida por sua mãe, sem consultar ao Senhor e consequentemente trazendo para si um padrão humano e mundano de vida, pois sua mulher foi uma egípcia! Os árabes preferem ter laços com os “mundanos” do que com aqueles que detêm a bênção do Eterno!

Agora Avraham passará pelo maior teste de sua vida, quando sua fé será duramente provada, mas ao final ele será aprovado pelo Eterno e tornar-se-á o símbolo máximo da fé bíblica em todos os tempos. O que aconteceu a Avraham foi assim: “E aconteceu depois destas coisas, que provou Elohim a Avraham, e disse-lhe: Avraham! E ele disse: Eis-me aqui. E disse: Toma agora o teu filho, o teu único filho, Itshaq, a quem amas, e vai-te à terra de Moriá, e oferece-o ali em holocausto sobre uma das montanhas, que eu te direi. Então se levantou Avraham pela manhã de madrugada, e albardou o seu jumento, e tomou consigo dois de seus moços e Itshaq seu filho; e cortou lenha para o holocausto, e levantou-se, e foi ao lugar que D-us lhe dissera. Ao terceiro dia levantou Avraham os seus olhos, e viu o lugar de longe” (Gn 22:1-4). Esta escritura tem início nos informando que Avraham foi “provado” por D-us. A palavra provado em hebraico é nasâ, testar, tentar, provar, examinar, pôr à prova. A palavra que define o Eterno é Elohim. Isso nos fala que o Criador agora vem a Avraham para colocá-lo sob um rígido teste! Esta palavra nos fala de algo tão forte que chega a ser comparado com uma “tentação”!

O Eterno ordena a Avraham que ofereça Itshaq em holocausto. A palavra holocausto em hebraico é olã, e significa holocausto, oferta queimada, sacrifício queimado. Na realidade o que o Senhor estava dizendo à Avraham era o seguinte: “Sobe a Moriá, prepara um altar, mata o moço e oferece-o à Mim como uma oferta queimada”! Avraham, mesmo sabendo da gravidade do que tinha sido dito pelo Eterno, toma seu filho e segue à risca as instruções que lhe foram dadas, e ao terceiro dia ele vê o lugar sobre o qual o Eterno lhe havia dito!

É claro que muitas perguntas passaram pela mente daquele homem temente ao Eterno, mas cremos que em todo o tempo ele estava orando e confiando que Aquele que lhe ordenara fazer o sacrifício era poderoso para reverter qualquer situação em sua vida, desde que houvesse de sua parte a obediência. Então, durante o caminho surge a pergunta: “Então falou Itshaq a Avraham seu pai, e disse: Meu pai! E ele disse: Eis-me aqui, meu filho! E ele disse: Eis aqui o fogo e a lenha, mas onde está o cordeiro para o holocausto? E disse Avraham: D-us proverá para si o cordeiro para o holocausto, meu filho. Assim caminharam ambos juntos” (Gn 22:7-8). O interessante é que a pergunta de Itshaq tem sentido! Ele viu todos os componentes para o holocausto, porém faltava o principal: o próprio cordeiro! A resposta de Avraham é ainda mais impressionante: “o Senhor ra’â”. A tradução literal é “O Eterno (IHVH) verá”. Mas, isso aparentemente é uma grande contradição com o que está traduzido em nossas Bíblias! Mas vamos seguir adiante a fim de entendermos o que acontecerá.

Avraham segue á risca o que lhe fora dito pelo Eterno e chega agora o momento crucial de sua jornada: “E estendeu Avraham a sua mão, e tomou o cutelo para imolar o seu filho; mas o anjo do IHVH lhe bradou desde os céus, e disse: Avraham, Avraham! E ele disse: Eis-me aqui. Então disse: Não estendas a tua mão sobre o moço, e não lhe faças nada; porquanto agora sei que temes a Elohim, e não me negaste o teu filho, o teu único filho. Então levantou Avraham os seus olhos e olhou; e eis um carneiro detrás dele, travado pelos seus chifres, num mato; e foi Avraham, e tomou o carneiro, e ofereceu-o em holocausto, em lugar de seu filho. E chamou Avraham o nome daquele lugar: O IHVH proverá; donde se diz até ao dia de hoje: No monte do IHVH se proverá” (Gn 22:10-14). A primeira coisa é que Avraham estendeu a sua mão para matar seu filho. A palavra matar é shahat e significa matar, abater; matar num sacrifício ritual. Avraham realmente estava decidido a sacrificar ritualmente o moço ao Senhor, como lhe fora pedido! E o que acontece é que o Senhor se torna sua resposta: a palavra aqui é o tetragrama, e isso significa aqui que o Eterno agora torna-se sua resposta e livramento no que tange à vida de Itshaq! E finalmente o Eterno lhe dá novas instruções a fim de Itshaq não seja sacrificado. E quando Avraham olha atrás de si ele vê um carneiro preso num mato e pronto à ser oferecido no lugar de Itshaq! Novamente o Eterno torna-se aquilo que Avraham mais necessitava: o sacrifício! Quando isso acontece, eles então cumprem o objetivo de sua viagem: oferecer ao Eterno um sacrifício em obediência à Sua Palavra. E o mais interessante é que Avraham chama aquele lugar de IHVH ra’ã! Ou seja, aquele que se torna o que ele precisa, veria sua necessidade e o atenderia! Isso nos mostra que o Eterno viu aquilo que aconteceria com Avraham no futuro e providenciou para ele que, no momento oportuno, houvesse um cordeiro preso junto à eles a fim de cumprirem seu propósito de sacrificar ao Senhor! Aquele que vê tudo e sabe tudo encaminha a história de tal forma que seus servos obedientes sejam abençoados em todos os seus caminhos!

O resultado final dessa atitude de Avraham foi: “E disse: Por mim mesmo jurei, diz o IHVH: Porquanto fizeste esta ação, e não me negaste o teu filho, o teu único filho, que deveras te abençoarei, e grandissimamente multiplicarei a tua descendência como as estrelas dos céus, e como a areia que está na praia do mar; e a tua descendência possuirá a porta dos seus inimigos; e em tua descendência serão benditas todas as nações da terra; porquanto obedeceste à minha voz” (Gn 22:16-18). Novamente o Eterno ratifica sua promessa a Avraham e lhe diz que ele o abençoará – barak, em hebraico – e isso significa que ele estava novamente recebendo poder para ser próspero, bem sucedido e fecundo. Além disso ele teria sua descendência, que é zerá e significa descendência física, multiplicada! Hoje isso nos mostra de que forma o Eterno conduziu a história a fim de que os judeus – inclusive aqueles que desconhecem que o são – se multiplicassem de tal forma que pudessem se tornar a maior nação da terra: A Noiva! O Todo-Poderoso não perdeu o controle de todas as coisas!

Ele ainda afirmou que os descendentes físicos de Avraham possuiriam as portas de seus inimigos. A palavra possuir é yarash e significa tomar posse, desalojar, herdar, ocupar, apoderar-se. A palavra porta aqui é sha’ar e significa a porta de uma cidade. A sha’ar era naturalmente o meio de acesso controlado a uma cidade murada. O Eterno diz a Avraham que ele e seus descendentes teriam autoridade para tomar posse, desalojar, herdar, ocupar, apoderar-se dos lugares que dão acesso – e logicamente são os principais – de qualquer cidade onde eles estivessem! Através da obediência de Avraham nós recebemos também autoridade para ordenarmos e desalojarmos todos aqueles que se nos opõem. Nosso propósito deve ser o de sempre levar adiante o Reino do Eterno D-us e o conhecimento de sua Palavra! E, quando for necessário, devemos fazer uso desta autoridade que nos foi conferida já em Avraham!

De tudo o que foi dito a suma seria: a obediência faz com que as mãos poderosas do D-us Eterno movam-se em nossa direção a fim de perpetuarem em nós os seus desejos, pois Ele como nosso Pai quer nos dar sempre aquilo que há de melhor!

Que o Senhor nos ajude a compreendermos que seus desejos são sempre os melhores para nós!

Mário Moreno.