Mário Moreno/ fevereiro 3, 2023/ Artigos

Mais do que superficial

“…este é o meu D’us e eu o exaltarei…” (Ex 15:2)

Quando os filhos de Israel emergiram do Mar Vermelho, eles cantaram “A Canção do Mar”. Contido nesta canção está o verso “zeh kayli ve’anvayhu” – “este é meu D’us e eu o exaltarei”. como um belo etrog, tefilin ou sucá. A raiz da palavra “ve’anvayhu” é “noi” – “beleza”; o verso deve ser interpretado como “Este é meu D’us e eu o servirei de uma maneira bonita.” (Shabat 133b) O Rabeinu Bechaya explica que embelezar os objetos das mitsvot é a maneira pela qual expressamos nosso amor por Hashem. (Kad Hakemach) Essa explicação parece contradizem a classificação do Mesilat Yesharim de “embelezar as mitsvot”. O Ramchal no Mesilat Yesharim divide o verdadeiro Serviço Divino em duas categorias, amor a Hashem e temor a Hashem. Sob a penumbra do “amor a Hashem” ele inclui alegria – servir a Hashem com felicidade, comunhão – unir-se a Hashem a ponto de não podermos mais nos separar Dele, e “kinah” – “zelo”, desprezando aqueles que desprezam Hashem. Sob a penumbra do “medo de Hashem”, ele inclui nos humilhar diante Dele, sentir vergonha ao sair para realizar o serviço Divino e honrar as mitsvot. Em sua explicação de como honrar as mitsvot, o Ramchal cita a interpretação talmúdica do verso “zeh kayli ve’anvayhu”, a exortação sobre embelezar as mitsvot. (Ch.17 Chelkei Hachasidut) O Ramchal vê claramente embelezar as mitsvot como uma função do “temor a Hashem”. A lógica não ditaria que embelezar as mitsvot é uma função do amor, ao invés do medo de Hashem? Por que a primeira reação dos filhos de Israel ao ser salvo é seu compromisso de embelezar as mitsvot? Não seria mais apropriado comprometer-se primeiro a simplesmente cumprir as mitsvot? O Talmud deriva outra interpretação para a palavra “anvayhu”. Esta palavra pode ser dividida nas palavras “ani vehu” – “Eu e Ele” que nos ensina o conceito de que para nos tornarmos semelhantes a D’us devemos imitar os caminhos de D’us. (Shabat 133b) Qual é a conexão entre este conceito e o embelezamento das mitsvot? No início de qualquer relacionamento existe uma distância entre as duas partes. Cada parte respeita a outra e, portanto, está disposta a se relacionar com a outra em seus termos (da segunda parte). Quando a distância se dissipa, o respeito pode diminuir e cada parte começa a exigir que a outra se ajuste ao seu comportamento. É esse conflito de necessidades que gera desprezo. Esse problema também pode ocorrer em nosso relacionamento com Hashem. O Talmud ensina que o relacionamento dos filhos de Israel com Hashem no Mar Vermelho era tão tangível que até mesmo bebês eram capazes de sentir a presença de Hashem. (Sotah 30b) A presença de Hashem transcendia de uma percepção intelectual para uma percepção tangível; a distância havia se dissipado. Foi nesse ponto que as sementes do desprezo puderam ser plantadas. A solução para esse problema foi assumir o compromisso de embelezar as mitsvot. Quando vemos algo belo, nosso instinto é considerá-lo inacessível. A beleza eleva um objeto e cria uma distância entre nós e ele. O relacionamento final com Hashem é de amor. Ao embelezar as mitsvot, inculcamos o respeito na relação que preserva esse amor. O Mesilat Yesharim está explicando que, uma vez que o propósito de embelezar as mitsvot é instilar respeito, isso é classificado como um elemento de temor a Hashem. Incutimos nas mitsvot uma dignidade que cria reverência aos olhos de quem vê. A base do amor genuíno em qualquer relacionamento é o respeito. O respeito garante que não haverá desrespeito. Desenvolver a Divindade dentro de nós mesmos, imitando os caminhos de Hashem, nos permite obter o respeito que preservará nossos relacionamentos. Portanto, o mesmo versículo que nos ensina como preservar nosso relacionamento com Hashem é também a fonte de como manter nossos próprios relacionamentos pessoais.

Tradução: Mário Moreno.