Mário Moreno/ fevereiro 5, 2020/ Artigos

O partir do pão

Qual é a regra para o partir do pão numa refeição? Quem deve fazer a primeira bênção sobre os alimentos e quem deve distribuir o pão partido para os demais?

Enquanto comiam, Ieshua tomou o pão, e, havendo dado graças, o partiu, e o deu aos discípulos, e disse: Tomai, comei, isto é o meu corpo” Mt 26.26.

O partir do pão é uma instituição judaica e isso só pode ser feito após ter-se pronunciado uma bênção. Mas qual é a bênção apropriada para isso? Vejamos o que nos diz a tradição judaica:

“Em relação a uma massa assada que foi sovada com suco de fruta, açúcar ou algo similar: se na mistura podemos sentir o gosto adocicado do suco de fruta, o Shulchan Aruch define que sua brachá é “bore minei mezonot”, e assim é o costume dos sefaradim.

Segundo os ashkenazim, que seguem a opinião do Remá, é necessário sovar a massa com mais suco de fruta (ou açúcar, azeite, etc.) que água para que a brachá seja “bore minei mezonot“. Caso a massa não seja sovada com uma quantidade maior de suco de fruta em relação à quantidade de água, a brachá será “hamotsi lechem min haaretz“.

O motivo de se fazer uma bênção sobre os alimentos é o da “elevação” que faz com que aquilo que é material assuma um caráter espiritual, transmitindo assim algo de cunho celestial para as vidas que participarão dele.

Um outro detalhe é que os alimentos estão cercados de uma importância espiritual muito grande, pois foi através de um alimento que o homem perdeu a eternidade e pecou; também foi através do alimento que a redenção veio para a raça humana quando Ieshua executa o Seder de Pessach e associa os elementos com a sua própria vida apontando para a futura redenção humana.

O Anfitrião Parte o Pão

Compartilhar as refeições sempre foi uma parte muito importante da vida judaica. No início da refeição, a bênção tradicional é dita quando o pão é partido. No Talmude Babilônico, lemos: “O anfitrião deve partir o pão” (Berachot 46). No entanto, este Estranho está tomando o lugar do anfitrião: ele está dizendo a bênção e partindo o pão! Provavelmente, esse comportamento chamou a atenção de todos na casa. De onde veio esta autoridade?

Há um precedente para isso na tradição judaica que nos diz assim: “A Gemara relata: o rabino Zeira ficou doente. O rabino Abbahu foi visitá-lo e resolveu: Se o homenzinho de pernas chamuscadas, apelido do rabino Zeira, for curado, farei um festival, um banquete para os Sábios. O rabino Zeira foi curado e o rabino Abbahu fez um banquete para todos os sábios. Quando chegou a hora de partir o pão, o rabino Abbahu disse ao rabino Zeira: Mestre, por favor, quebre o pão para nós. O rabino Zeira disse-lhe: O Mestre não se sustenta de acordo com a halakha do rabino Yoḥanan, que disse: O anfitrião parte o pão? O rabino Abbahu partiu o pão para eles.

Quando chegou a hora de recitar a bênção, o rabino Abbahu disse ao rabino Zeira: Mestre, recite a graça depois das refeições em nosso nome. O rabino Zeira disse-lhe: O Mestre não se sustenta de acordo com o halakha do rabino Huna da Babilônia, que disse: Quem quebra o pão recita a graça após as refeições?

A Gemara responde: O rabino Abbahu mantém de acordo com o halakha que o rabino Yoḥanan disse em nome do rabino Shimon ben Yoḥai: O anfitrião parte o pão e um convidado recita graças após as refeições. O anfitrião parte o pão para que ele o parta generosamente, enquanto um hóspede pode ter vergonha de partir um pedaço grande para si e para outros convidados; e o convidado recita graças após as refeições para que ele possa abençoar o anfitrião no decurso de recitar graças após as refeições, conforme a Gemara explica.

Qual é a fórmula da bênção com a qual o hóspede abençoa seu anfitrião?

Seja sua vontade que o dono da casa não sofra vergonha neste mundo, nem humilhação no mundo vindouro.

O rabino Yehuda HaNasi acrescentou elementos relativos ao sucesso material:

E que ele seja muito bem-sucedido com todas as suas posses, e que suas posses e as nossas posses sejam bem-sucedidas e próximas à cidade, e que Satanás não controle nem seus atos nem nossos atos, e que nenhum pensamento de pecado, iniquidade ou transgressão esteja diante dele ou antes de nós a partir de agora e para sempre”.

O que é mais importante aqui é demonstrar que o “anfitrião” é o Messias e que Ele mesmo nos ensinou que quando celebramos o kidush no shabat estamos de fato apontando para uma outra ocasião, quando um outro banquete acontecerá e ali o nosso Grande Anfitrião – Ieshua – irá oficiar esta jantar messiânico já no mundo vindouro quando participará conosco novamente do partir do pão e beber o vinho.

Um Sinal de Dignidade Messiânica

No documento de Qumran 1QSa (A Regra Messiânica) lemos: “Ninguém deve estender a mão” para abençoar o pão antes do Sacerdote e do Messias. Havia um entendimento, pelo menos entre os essênios, de que a autoridade para abençoar o pão primeiro pertencia claramente ao Messias. Quando, em nossa história, este Estranho agiu na casa como tendo autoridade (Marcos 1:22) – esse comportamento foi um sinal definitivo da sua dignidade messiânica.

É importante lembrarmos que quando estivermos fora de nossos lares ou congregações devemos esperar pelo anfitrião para que as bênçãos sejam feitas sobre os alimentos para então podermos participar dos mesmos. A cadeia de autoridade deve ser mantida e o sacerdote do lar ou da congregação deve então agir de forma a elevar os elementos e assim liberar aos demais para a participação.

Um exemplo disso está em I Co 11.23-26: “Porque eu recebi do Senhor o que também vos ensinei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão; e, tendo dado graças, o partiu e disse: Tomai, comei; isto é o meu corpo que é partido por vós; fazei isto em memória de mim. Semelhantemente também, depois de cear, tomou o copo, dizendo: Este copo é o novo testamento no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que beberdes, em memória de mim. Porque, todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este copo, anunciais a morte do Senhor, até que venha”. Estas palavras de Sha´ul demonstram que houve um ensino dado pelo Ungido que deve ser replicado até que Ele venha! Quando fazemos isso entendemos que estamos então elevando os elementos – pão e vinho – que passam a ter um novo status e carregam em si o poder de transmitir a bênção a todos os que deles participam.

Quais são os detalhes significativos

Em uma refeição judaica comunal, aquele que recita a bênção, o faz enquanto literalmente parte o pão – exatamente como nos é dito que Ieshua fez. Nesse sentido, Lucas 24:30 pode parecer, realmente, uma refeição judaica tradicional. No entanto, você deve conhecer a tradição judaica, a fim de entender quão surpreendente e inesperada foi realmente esta iniciativa de partir o pão. O texto nos diz: “E aconteceu que, estando com eles à mesa, tomando o pão, o abençoou e partiu-o e lho deu” Lc 24.30 e o que aconteceu logo depois foi surpreendente: “Abriram-se-lhes, então, os olhos, e o conheceram, e ele desapareceu-lhes” Lc 24.31. Quando aqueles homens participaram de uma refeição com Ieshua, após a bênção, seus olhos lhes foram abertos e puderam então ter o discernimento espiritual acerca do que estava ocorrendo ali. O próprio Ieshua estivera com eles e eles não perceberam; mas quando a bênção foi feita e o pão partido algo extraordinário acontece. Aquilo que era material agora os transporta ao Reino do Espírito e eles passam a ver o que não viam até aquele momento!

Conclusão:

Entendemos a importância de mantermos a cadeia de autoridade quando participamos de uma refeição, seja em nossas congregações, seja em nossas casas ou em qualquer lugar e entendemos que através de nossa obediência aquilo que é material – os elementos do kidush ou da refeição – terão seu status mudado e passaremos então a ter prazer em nossas almas e entenderemos que a comida é um veículo para recebermos diferentes tipos de bênçãos e estaremos nos preparando para o grande dia em que participaremos do grande banquete com o Rei Ieshua!

Baruch ha Shem!

Mário Moreno.